A composição do Congresso Nacional é uma espécie de espelho invertido da realidade brasileira. Devido a inúmeros fatores, os quais dariam margem a diversos artigos, o Legislativo, como escreveu o Leonardo Sakamoto, no portal UOL, conta com uma representação bem maior dos opressores do que dos oprimidos, embora estes sejam maioria absoluta da população do nosso país.
Por Bepe Damasco, compartilhado de seu Blog
Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Cheguei a imaginar que a aprovação das novas regras fiscais pelos deputados, que contou com o apoio de Arthur Lira, pudesse contribuir para inaugurar uma nova era na relação entre o governo Lula e o Congresso. Ledo engano.
A avalanche reacionária que se seguiu à votação do arcabouço mostra que muitos esqueletos estavam guardados no armário prontos para sair e assombrar o campo progressista.
Mas como reagir?
Primeiro é essencial que saibamos onde estamos pisando. Entre os 513 deputados federais e 81 senadores, tem-se uma folgada maioria de direita, acrescida por um contingente nada desprezível de parlamentares de extrema-direita.
Conservadores e extremistas de direita somam cerca de 2/3 da Câmara dos Deputados, bancada suficiente para fazer avançar um processo golpista de impeachment, por exemplo. Sem alarmismo, mas esse é o mundo real.
E é com um modelo anômalo e esquizofrênico, que elege um presidente da República de esquerda e lhe entrega um parlamento, em grande medida, avesso às suas ideias e ao seu programa, que Lula está desafiado a governar e cumprir seus compromissos de campanha.
Hoje, senti calafrios ao ler uma mensagem em um dos grupos de política que participo, na qual um valoroso militante instava Lula a “peitar o Congresso.”
O pior dos mundos seria trincar de vez as relações com Lira e com o Centrão, o que pavimentaria o caminho para uma crise política e institucional de consequências imprevisíveis. Esse filme a gente conhece.
Mas, se é verdade que Lula não tem outra alternativa, a não ser negociar, negociar e negociar (e quem sou eu para duvidar da reconhecida genialidade e do talento político do presidente), a mobilização da sociedade democrática é que vai definir se ele sentará à mesa de negociação com mais ou menos força.
Sem a ação política dos sindicatos e suas centrais, dos movimentos sociais, das demais entidades da sociedade civil, dos ativistas das redes sociais e dos partidos políticos do segmento popular contra os retrocessos e as investidas da direita nas áreas ambiental e indígena, será muito difícil frear a ofensiva reacionária.
Todo presidente da República, ao longo da história do Brasil, teve assegurada a prerrogativa de organizar seu próprio governo. E a Lula não pode ser negado esse direito.
Em respeito à soberania popular, deputados e senadores não podem usurpar essa atribuição da Presidência da República.