Conhecimento: o estorvo dos adeptos do miliciano

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A direita, historicamente, tem esse fetiche pelo capital e pelo patrimônio, ao mesmo tempo em que despreza o trabalho e teme o conhecimento.

Por Walter Falceta, compartilhado de Construir Resistência




Inúmeras vezes, a liderança de direita considerou o conhecimento como um inimigo de seu interesse político.

Os nazistas, que são um tipo exacerbado de direita, têm horror especial ao verdadeiro conhecimento filosófico, histórico e científico.

Hanns Johst resumiu numa peça teatral o pensamento de Goebbels e de Göering, dois dos principais colaboradores de Adolf Hitler:

– Quando ouço alguém falar em cultura, já saco o meu revólver.

Freud talvez explique essa relação dialógica sinistra da direita com o conhecimento. Pois, ao mesmo tempo que o odeiam, sentem enorme e doentia inveja da inteligência culta alheia.

Quer açoitar um milicianista na rede? Basta argumentar com finesse, lógica e evidências irrefutáveis.

Ele logo perde o prumo e reage espumando pela boca, com os chavões do hábito: “coisa de comunista”, “coisa de viado”, “coisa de ateu”, “coisa de preto”, “coisa de cabeça chata”, “ouviu na Globo” e “luladrão”. Por vezes, durante o faniquito, descamba para o uso de termos chulos de desqualificação do oponente.

Esse tipo de erística da esculhambação ganhou corpo no Brasil pelas diatribes mal escritas do falecido apedeuta Olavo de Carvalho, cuja obstinação era ganhar um debate mesmo sem ter razão, a partir do texto-guia elaborado em tempo remoto por Schopenhauer.

Falácia, sofisma e, por fim, argumentos ad hominem. O ignorantão valente, tipo Silveira, precisa desesperadamente dessas armas para suprir sua formação rasa, seu entendimento limitado e sua impaciência com o processo dialético de aprendizado.

Porque o direitoso padrão intui que é preciso calar de pronto o oponente sabedor. Em um debate civilizado, pois, o milicianista exibiria seus flancos vulneráveis e logo seria humilhado pelo interlocutor.

Afinal, os menos abestalhados confundem, por exemplo, Karl Marx com Max Weber e acreditam que Groucho Marx seja um comunista debochado da mesma família. Elogiar um deles já agita os tocheiros piromaníacos ucranizados de Sara Winter.

O milicianista estúpido ou estupidificado tende também a considerar que qualquer fala relativa a políticas públicas, direitos universalizados, redução de danos e inclusão social esteja associada a uma coisa difusa, nebulosa e assustadora que ele resolveu chamar de “comunismo”.

O padre que distribui sopa de ervilhas é comunista. O professor que ministra aulas sobre a Evolução é comunista. O médico que fala sobre menstruação é comunista. O psicólogo que fala sobre masturbação é comunista. O engenheiro ambiental que fala em preservação é comunista. O agrônomo que fala em reforma agrária é comunista. Comunista, para o milicianista, é até o neoliberal FHC.

Conforme comprovamos nestes tempos de pandemia, os milicianistas nutrem ainda ódio especial pela ciência, pela academia, pela erudição, pela estatística, pelos laboratórios e por qualquer forma de pensamento organizado e complexo.

Isso porque o fascista, de forma geral, acredita que já sabe o suficiente e que já identificou os culpados por todas as mazelas deste mundo. Este culpado é o divergente-diferente.

Pode ser o judeu, o árabe, o chinês, o negro, a mulher, o LGBTQIA+, o cigano, o anarquista, o socialista, o comunista, o ateu, o umbandista, o imigrante, o acadêmico, o estrangeiro, o intelectual e o artista.

Para o fascista, todos esses aí estão mancomunados numa conspiração mundial para entrevar as mentes e tornar complicado o que julgam extremamente simples.

Para a extrema-direita, tudo se resolveria com disciplina militar, bordoadas, bombas, prisões, torturas, estupros “educativos” e eliminação em massa dos tais divergentes-diferentes.

A pior coisa para um milicianista é desconfiar de que problemas complexos exigem soluções complexas. Essa é sua perdição. Ao perceber o mais leve lume dessa realidade, ele perde o sono, o apetite e a fé em si mesmo.

Daí, a necessidade das sessões rituais de auto-engano, em que pastores em busca de quinhão, prometem o milhão, ludibriando de montão.

“Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que estão fazendo”: do púlpito,  pois, a ordem é garantir o interesse do fariseu e cristalizar essa ignorância.

Walter Falceta é jornalista e um dos fundadores do Coletivo Democracia Corinthiana (CDC)

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