Mais um capítulo da coluna “A César o que é de Cícero” do doutor em Literatura Cícero César Sotero Batista. Desta vez um inusitado conto de natal sobre um estranho ser que habita um sótão abandonado. Aliás, toda a imagem de sótão que nos vêm a cabeça, tem um ar de abandono e é neste abandono que moram seres como Oresich.
Por Cícero César
De todos os detritos que se acumulam nos sótãos ele pode ser feito: pilhas de roupas; brinquedos, em sua maioria quebrados; edições antigas de jornais que vão até o teto; retalhos; restos de louça; molduras encobertas por gordura e poeira.
Neste sítio em particular, além da umidade, própria do terreno, e das reservas artificiais de água potável destinadas ao consumo da família, há também o acre de venenos contra pragas que teriam aspecto leitoso se observados à luz do sol. As lâmpadas penduradas às paredes, de tão baças, mal servem para auxiliar a quem quer que se aventure a percorrer a região por sua própria conta.
Poucos se atentam para o olhar que os vigia. Este olhar é o de Oresich, ser que certo dia se recolheu a muito esforço em um enfeite de Natal em forma de estrela, cuja função talvez se assemelhe à da casca dos caramujos.
Um observador impaciente não poderia lograr sucesso ao acompanhar o movimento de fuga daquela espécie.
Oresich só se deixa entrever por aqueles que, aos berros de comandantes, se esgueiraram por labirintos subterrâneos, sufocados pelas máscaras apertadas aos pescoços ainda finos, encobertos de gás lacrimogêneo.
A porquês desta natureza não é fácil responder; a eles é indicado o caminho.
Sobre o autor
Radicado em Nilópolis, município do Rio de Janeiro, Cícero César Sotero Batista é doutor, mestre e especialista na área da literatura. É casado com Layla Warrak, com quem tem dois filhos, o Francisco e a Cecília, a quem se dedica em tempo integral e um pouco mais, se algum dos dois cair da/e cama.
Ou seja, Cícero César é professor, escritor e pai de dois, não exatamente nessa ordem. É autor do petisco Cartas para Francisco: uma cartografia dos afetos (Kazuá, 2019) e está preparando um livro sobre as letras e as crônicas que Aldir Blanc produziu na década de 1970.