‘Corte de custos’ trava o crescimento do Brasil

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Por Andre Motta Araujo, compartilhado de Jornal GGN – 

A crença contaminou governos e administrações públicas fazendo hoje parte do ideário NEOLIBERAL como um evangelho dentro da visão de “economia de mercado”.

Uma das mais perniciosas doutrinas com reflexos econômicos nasceu nas escolas americanas de administração de empresas, as MBA, que se reproduziram pelo mundo afora espalhando um “credo” que se transformou numa SUB IDEOLOGIA que formou as mentes de milhões de alunos, depois executivos.

Essa crença, em vários graus, se transforma numa obsessão pelo corte de juros A QUALQUER CUSTO dentro das empresas, depois a crença contaminou governos e administrações públicas fazendo hoje parte do ideário NEOLIBERAL como um evangelho dentro da visão de “economia de mercado”.




DIFERENÇA ENTRE MICROECONOMIA E MACROECONOMIA

Se todas as empresas do mundo procurarem obsessivamente reduzir custos e cada vez empregar menos pessoas, ao fim não haverá, na MACROECONOMIA, compradores para os produtos dessas empresas, todas serão super eficientes dentro delas, mas a economia como um todo será disfuncional porque haverá muito mais produto do que comprador.

De outro lado, mais desempregados significam mais custos para o Estado em seguro desemprego, hospitais para saúde física e mental, o desempregado tende a se destruir emocionalmente, mais famílias desfeitas, mais crianças sem escola porque precisam sobreviver com bicos e mendicâncias.

O custo social pelo excesso de eficiência MICROECONOMICA será muito mais alto que a economia gerada dentro das empresas, a produtividade micro vai significar improdutividade na macro economia, eficiência micro será desastre social.

Keynes enxergou isso na sua receita para enfrentar a Grande Depressão de 1929 ao sugerir a Roosevelt  “empregar jovens para carregar pedras de um lado para outro das estradas”, querendo dizer que MESMO SEM UMA LÓGICA ECONÔMICA é melhor dar alguma renda a desempregados para que eles tenham algum poder de consumo e com isso fazer a roda da economia girar.

O papa do monetarismo, vertente do neoliberalismo ideológico, Milton Friedman também tinha essa percepção ao sugerir uma ideia de “bolsa família” e de “jogar dinheiro de helicóptero” para enfrentar crises de demanda.

CASOS DEMENCIAIS DE CORTE DE CUSTOS – BOEING E BRUMADINHO

Em artigo anterior mostrei como a obsessão de corte de custos gerou MEGA PREJUIZOS às próprias empresas que achavam estar sendo eficientes e, pior ainda, tragédias para a sociedade com efeito contrário na macroeconomia. O caso do avião MX-8 da BOEING e seu gigantesco fracasso como projeto se deve a uma série de erros cuja base motivacional foi a da redução de custos, mesmo com a evidencia de riscos nessa direção, da mesma forma que o descuido com o monitoramento e o reforço da proteção das represes de rejeitos de extração de minério de ferro da VALE, nasceu da ideia de reduzir custos por executivos treinados e submetidos à lavagem cerebral das escolas de MBA e sua base filosófica de “produtividade micro” mesmo a custo da macro.

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As escolas de MBA, nos seus vários níveis, deveriam ensinar mais História e Filosofia do que operar exclusivamente com fórmulas quantitativas, que parece ser o foco desses cursos áridos e fabricantes de “cabeças de planilhas” com visão de curtíssimo prazo.

A QUESTÃO DOS BÔNUS

Uma das piores inovações do neoliberalismo dos anos 70 foi a estipulação de BÔNUS absurdamente altos para executivos que atingem “metas” de CURTO PRAZO. É relativamente simples alcançar metas no trimestre sacrificando o futuro de longo prazo da empresa, uma das “jogadas” mais velhas e NÃO GASTAR DINHEIRO COM MANUTENÇÃO E NOVOS PROJETOS, com o que se aumentam os lucros no curto prazo e com isso se inflam os bônus dos executivos baseados no balanço anual, semestral ou trimestral. Outra forma é basear os bônus na cotação das ações, cujo valor é também influenciado pelo resultado de curto prazo. Com isso executivos ganham quantias fabulosas por resultados mais que duvidosos de curto prazo.

Os do banco Lehman Brothers ganharam bônus quatro dias antes do banco quebrar, bônus na VALE foram muito altos antes, durante e depois das tragédias de Mariana e Brumadinho, o mesmo ocorreu na BOEING antes do desastre do MX-8, que já causou prejuízos até agora de US$19 bilhões à BOEING e os prejuízos ainda irão muito além, após  a queda de 2 aviões, 400 mortos e o recolhimento de centenas de aeronaves entregues e a entregar.

Os BÔNUS de 50, 100 ou 200 milhões de dólares para um só executivo passaram a ser relativamente comuns, uma completa aberração, sem lógica econômica, os resultados NÃO SE DEVEM A UM SÓ EXECUTIVO em tempo algum, pior ainda se é um resultado fruto de manobras contábeis ou sacrifício do longo prazo, muitos resultados são produto de VENTO A FAVOR na economia ou no mercado da empresa que nada tem a ver com a genialidade do executivo.

Os BÔNUS não são pagos apenas pelos resultados operacionais, também há mega bônus quando a empresa é vendida, o CEO da empresa comprada ganha bônus porque  não se opôs à aquisição e o CEO da empresa compradora ganha bônus porque aumentou o tamanho da empresa, todos ganham e  ganham dos dois lados, os banqueiros que intermediaram a transação como “advisors” ou “brokers”, ou seja, todos ganham, O QUE EXPLICA MUITAS FUSÕES E AQUISIÇÕES ILÓGICAS.

Dois anos depois, mais da metade dessas transações não deram certo porque não tinham sinergia (alô BRF), mas nesse meio tempo alguns ganharam muito. Geralmente perdem os empregados demitidos pela empresa que compra, os consumidores, o Estado porque essas fusões geram créditos fiscais que significam menos impostos, perde o País porque se reduz a competição, é o CAPITALISMO PREDATÓRIO em seu apogeu.

UM CAPITALISMO ESGOTADO

O capitalismo americano teve uma época de ouro no imediato pós guerra até os anos do “organization man”, a era do HOMEM DE TERNO CINZENTO, de 1945 a 1968, quando as grandes corporações americanas tinham executivos de carreira, que entravam na empresa com 20 e poucos anos e lá ficavam por 35 ou 40 anos, leais à empresa, SEM BÔNUS DE RESULTADOS, com salários importantes mas não fabulosos, assim eram a FORD, GM, GE, AT & T, DU PONT.

A partir dos anos 80 nasceu a ERA DOS CONGLOMERADOS, a partir do modelo ITT, do executivo Harold Geneen, um dos grandes malfeitores da humanidade.

A ERA DOS CONGLOMERADOS criou empresas “feira livre” juntando ramos díspares e sem sinergia. A ITT comprou, em três anos, 400 empresas, de hotéis Sheraton a fábricas de bombas centrífugas (Gould Pumps). Geneen dizia que um executivo financeiro não precisava entender do produto ou setor, se conhecesse finanças poderia dirigir qualquer empresa, um pensamento absurdo e que está na base do capitalismo predatório de hoje.

Essa ERA gerou um tipo ET de executivo, o “genérico”, que não entende de setor algum, mas sabe agradar ao acionista, manipular balanços, cortar custos, ganhar prêmios de HOMEM DO ANO, PERSONALIDADE DO ANO, tudo pago com assessoria de imprensa à custa da própria empresa, tornando-se um queridinho da mídia econômica porque sempre acessível a entrevistas triunfalistas. É o tipo classificado nos EUA, por uma corrente mais crítica, como o ROGUE EXECUTIVE, o executivo pilantra que se vende como produto baseado em currículos fantasiosos e que engana bem por dois anos, aí é despedido e vai brilhar em outra empresa com os mesmos truques que ENGANAM PORQUE HÁ OS QUE QUEREM SER ENGANADOS.

Participei intensamente dessa era nos EUA e no Brasil, como executivo de um dos primeiros e ainda grande conglomerado, isso nos anos 70 e 80. De lá para agora só piorou, e muito, essa filosofia de capitalismo de truques, ilógico, irracional, anti-civilizatório cuja era está por findar via processo de revisão já em curso nos países centrais, mas que no Brasil parece estar ainda começando, uma característica do Brasil de pegar ideias que entram em descarte do primeiro mundo e aqui encontram mercado, como cantores decadentes em seus países e que aqui fazem sucesso.

As escolas de MBA, suas derivações e emanações em infinitos cursos de graduação e pós-graduação, com seus “papas”, como o de marketing, quem se lembra de Philip Kotler, incensado como um deus nos cursos da Escola da FGV em São Paulo, fiz um dos primeiros cursos, a escola associada a Michigan State University era o Olimpo da juventude dos anos 60 e 70, quanta besteira lá se ensinou, tudo com molho americano.

Se o catecismo era ruim há 50 anos, imagino hoje como será, essa religião causou estragos com jovens querendo imitar modismos americanos, copiando fórmulas sem lógica em ambientes muito diferentes, lá está o DNA do ultra neoliberalismo que hoje destrói o Brasil, com brasileiros lavados cerebralmente e se comportando como estrangeiros no Brasil, a turma dos “brasamericans” com o salário aqui e a alma em Miami.

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