Por José Eustáquio Diniz Alves, compartilhado de Projeto Colabora –
Enquanto isso, Brasil segue com a sua curva vertical e sem perspectivas de melhoras no curto prazo
A pandemia avança pelo mundo, mas existem países ganhadores e países perdedores. O Brasil, até aqui, claramente, é um perdedor. A Turquia parecia que ia perder o controle, mas deu a volta por cima e conseguiu reduzir bastante o número de casos e de mortes. O Irã parecia que já tinha controlado o surto, mas está enfrentando uma grande segunda onda de casos e uma pequena segunda onda de óbitos. O mundo que parecia ter chegado ao pico dos casos, voltou a apresentar aumento do número de pessoas infectadas, embora continue com a tendência de redução no número de óbitos.
O gráfico abaixo mostra que o Brasil ultrapassou o Irã e a Turquia em número de casos acumulados e continua com uma curva mais vertical, o que indica que a pandemia avança em velocidade maior em território nacional. A Turquia e o Irã estavam horizontalizando a curva, mas o Irã passou a inclinar a curva e passar por uma segunda onda, como veremos melhor mais à frente. No dia 08 de junho, o Brasil registrou 707,4 mil casos, o Irã registrou 173,8 mil e a Turquia 171,1 mil casos. Portanto, o Brasil que estava atrás do Irã e da Turquia até o início de maio, em pouco mais de um mês apresenta valores 4 vezes maiores (o número de casos no Brasil cresceu 6 vezes no mês de maio).
O gráfico abaixo mostra que, também no número de óbitos, o Brasil ultrapassou o Irã e a Turquia e se distancia cada vez mais de ambos. No dia 08 de junho, o Brasil registrou 37,1 mil mortes, o Irã registrou 8,4 mil e a Turquia registrou 4,7 mil mortes. Portanto, o Brasil tem 4,5 vezes mais mortes do que o Irã e cerca de 8 vezes mais mortes do que a Turquia. Somente no mês de maio o número de óbitos aumentou 5 vezes no Brasil.
Mas além dos números acumulados é importante avaliar as variações do dia a dia. O jornal Financial Times apresenta uma série de informações dos países para o número de casos e de mortes, a partir da média móvel de sete dias (uma semana) dos novos casos e novas mortes, por número de dias desde que foram alcançadas, em média, três mortes pela primeira vez. Assim, os gráficos abaixo mostram que o Brasil já está em primeiro lugar no mundo (ultrapassou os EUA) nos casos e nas mortes ocorridas em 24 horas.
Nota-se que o Irã chegou a ficar abaixo da Turquia em número diário de casos (gráfico da esquerda), sendo que ambos os países do Oriente Médio apresentavam curvas declinantes. Porém, o Irã voltou a passar a Turquia em número de casos e reverteu a tendência da curva, devido à segunda onda. Em número de óbitos (gráfico da direita) o Irã se manteve sempre à frente da Turquia, mas enquanto os turcos continuam com uma curva declinante, os iranianos inverteram a tendência da curva e apresentam aumento do número de mortes (mas numa segunda onda de menor dimensão que em relação ao aumento das contaminações).
Os gráficos abaixo, também do Financial Times, apresentam os coeficientes de incidência e de mortalidade para os 3 países. O gráfico da esquerda apresenta o coeficiente de incidência e confirma que o Brasil, mesmo quando se controla pelo tamanho da população, assumiu a liderança do número diário de casos (ultrapassando os EUA). O Brasil, na média de 7 dias, tem um coeficiente de incidência diário acima de 100 casos por milhão de habitantes, a Turquia com menos de 20 por milhão e o Irã com cerca de 40 por milhão.
No coeficiente de mortalidade, o Brasil apresenta cerca de 5 óbitos diários por milhão de habitantes, a Turquia cerca de 0,2 por milhão e o Irã 1 óbito por milhão de habitantes, sendo que os iranianos apresentam tendência de alta devido à segunda onda.
Os gráficos abaixo mostram o número de casos e óbitos diários na Turquia, Irã, Brasil e o Mundo até o dia 08 de junho. Os três países possuem padrões diferentes. Na Turquia, o pico de casos ocorreu no dia 11/04 com 5,1 mil casos, mas este número veio caindo e chegou a 989 casos ontem (08/06) e o número de óbitos chegou ao pico de 127 mortes em 19/04 e caiu para apenas 19 mortes em 08/06.
No Irã, o pico de casos tinha acontecido no dia 11/04 com 5,1 mil pessoas infectadas em 24 horas, mas este número caiu até 802 casos no dia 02/05 e voltou a crescer até bater um novo pico de 3,6 mil casos em 04/06. Esta situação é preocupante, pois o segundo pico foi maior do que o primeiro. Felizmente, não houve um segundo pico tão forte no número de óbitos diários, mas, mesmo assim, o pico de mortes foi de 158 óbitos em 04/04, caiu para 34 óbitos em 25/05 e subiu para 70 óbitos em 08/06. Ou seja, ao contrário da Turquia, a curva de óbitos voltou a subir no Irã.
No Brasil, ainda não chegamos no pico nem de casos e nem de mortes. Os números, normalmente, caem nos fins de semana, mas sobem no meio da semana, especialmente de terça a sexta-feira. No mundo parecia que o pico tinha sido alcançado em 24/04 com 102 mil casos e caiu para menos de 70 mil casos em 27/04. Todavia, voltou a apresentar tendência de aumento e bateu o recorde de 131 mil casos no dia 05/06. Mas, felizmente, o número de mortes continuou caindo no mundo, pois o pico ocorreu no dia 17/04, com 8,4 mil óbitos e caiu para 3,2 mil óbitos em 08 de junho.
O que todos estes números mostram é que a pandemia no mundo segue padrões diferentes nos países. Enquanto a Turquia caminha para controlar a pandemia, o Brasil ainda nem chegou ao pico. Mas o que merece atenção é o caso do Irã que parecia estar caminhando para o fim da pandemia e voltou a apresentar uma segunda onda. Mesmo os casos globais também preocupam, pois o pico que parecia estar no final de abril foi deixado para trás e novos picos foram atingidos no mês de junho.
Evidentemente, há países que já eliminaram a pandemia, como o Vietnã e a Nova Zelândia, mas há casos de uma segunda onda que ocorre onde o processo de transmissão comunitária não foi de fato controlado. A Organização Mundial da Saúde (OMS) disse, em documento recente, que se de fato acompanhássemos todos os casos sintomáticos, isolássemos esses casos, rastreássemos os contatos e colocássemos esses contatos em quarentena, haveria uma drástica redução na transmissão: “Se pudéssemos nos focar nisso, iríamos nos sair muito bem em termos de suprimir a transmissão”.
Ou seja, seria preciso fazer um bom rastreamento e realizar testes em todas as pessoas com sintomas, garantindo um bom monitoramento e, no mínimo, um bom isolamento vertical. Neste caso, não seria necessário nem o lockdown e nem uma quarentena geral. Mas sem estas condições, uma abertura geral ou uma flexibilização ampla da quarentena, como várias cidades brasileiras estão fazendo, pode ser um desastre.
O Brasil não fez nada direito até agora. Não fez uma barreira sanitária para impedir a entrada do coronavírus, não testou suficientemente os casos suspeitos, não rastreou e monitorou os casos sintomáticos, organizou uma quarentena meia-boca e agora começa flexibilizar o isolamento social antes de reverter a curva epidêmica. A primeira onda no Brasil ainda nem chegou ao pico e se houver uma segunda onda, como no Irã, a situação será realmente dramática.