De Benedito Costa, aula de etiqueta para uma jornalista

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Por Benedito Costa, jornalsita – 

Para Cecilia Flesch, jornalista da GloboNews que “corrigiu”, rindo, o “adevogado” pronunciado pelo presidente Lula ontem.

Prezada jornalista, Cecília Flesch




Trabalhei vinte anos para essa empresa em que você está agora. Centenas de jornalistas “passaram pelas minhas mãos”, expressão não muito feliz, mas verdadeira. Vai que você não a entende e faz leituras indevidas dela. Isso não é legal, viu?

A maioria deles, em estado de indigência com os entendimentos da realidade da língua materna. Assim como você. Isso é uma pena.

Um jornalista tem a língua como principal ferramenta — e entendê-la deve ser um dever, antes mesmo de um direito. Ou há um paralelo: direito e dever. Mas essas palavras confundem algumas cabecinhas, não é? Seus colegas andam confusos e perdidos em outras áreas também.

A questão não é o fato de os jornalistas saberem o que é uma epêntese, ou uma vogal epentética, pois isso foge ao escopo do curso de jornalismo. A questão é o jornalista, que tem a língua como principal ferramenta, como eu disse, não entender seu funcionamento.

Grande parte dos falantes do Sul usam a epêntese no caso de “advogado”, assim como em grande parte do país se fala “peneu”. Incluindo você. Aliás, você tem outros vícios de linguagem, que não são da minha preocupação.

Seus bandidos de estimação sulistas também usam epênteses, assim como vogais finais sem abrandamento, o que é inclusive uma piada local. Aliás, as pessoas não sulistas riem do nosso “pente” e não “pentchi” — e isso é uma piada do nível do tio do pavê, que nos faz revirar os olhos.

Afinal, tanta gente diz “treis” em vez de “três” porque isso é natural da língua. Grande parte dos seus colegas têm vergonha do “r” retroflexo e isso dá uma dor de cabeça danada para as fonoaudiólogas da sua empresa, que também não estão muito interessadas com a naturalidade da língua e sim com o preconceito mesmo. Preconceito vende mais que os produtos duvidosos que vocês colocam no ar, porque o preconceito é mais fácil de entender e é mais palatável.

Em paralelo, o preconceito é um tipo de arma dos fracos e despreparados, que não têm algo mais profundo a dizer.

São pessoas ignorantes mesmo. Pseudo intelectuais, pedantes, vazias. Creem que um corte Chanel ou um scarpin de bico fino sejam suficientes para se fazer um trabalho bem feito.

Até o dia em que a empresa os joga na sarjeta, como tem ocorrido repetidamente na Globo — e a sociedade, na lata de lixo da história, afinal a contribuição deles — e a sua — para o jornalismo, a ética, a “verdade” é nula, nada, nadica de nada.

Mas o mais grave para um jornalista, além de ser jagunço dos donos da empresa para a qual trabalha, é a vaidade e a ideia de superioridade, mesmo. Tratar as pessoas de cima para baixo.

Não sei se você tem doutorado na área. Creio que não. Quase nenhum de seus colegas têm. No máximo, as pós e os cursos in Company que a Globo oferece, geralmente têm conteúdo de gestão… e de autoajuda. E a pessoa de quem você debocha tem 16 ou mais doutorados “honoris causa”, algo que você, certamente, não imagina o que é.

Até porque, no máximo, seria a paraninfa paga de uma faculdade de esquina.

O mais engraçado para você é o seguinte. Eu esquecerei você amanhã. Mas outros, não. A cada frase que você pronunciar agora haverá um sujeito disposto a procurar descompassos entre o que a língua é e o que você pensa que ela seja.

Sinto que você contribua para o empobrecimento das discussões linguísticas. Nós levamos séculos de observação e estudo para entender o que é uma epêntese e outros metaplasmos.

Sinto também que, dentre tantas coisas importantes ditas pelo sujeito de quem você debocha, você tenha escolhido isso, uma epêntese. Matar as aulas de edição e produção na faculdade parece não ter sido um bom negócio.

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