Nos tempos de jogador de futebol, o técnico Dunga tinha um estilo de jogo forte, fazia bons lançamentos e era líder em campo. Mas sendo médio-volante, sua principal missão era destruir as jogadas adversárias, se necessário com uma botinada. Parece que Dunga sentiu saudades dos tempos de meio-de-campo e resolveu entrar de sola na consciência negra ao dizer que seria afrodescendente de tanto que apanhou e gosta de apanhar.
É verdade que os negros apanharam no passado e continuam apanhando hoje em dia. Basta analisar as estatísticas de violência para constatar como elas atingem em maior número a população negra.
Contudo, o técnico Dunga erra feio ao comparar as críticas inerentes ao trabalho de técnico da Seleção Brasileira que sofre com os flagelos sofridos pelos negros ao longo da história. Lembrou Pelé e suas frases equivocadas sobre o racismo.
Ao afirmar que negros gostam de apanhar, Dunga indica que precisa urgente de umas lições de história. Será que ele acredita que os quase 4 milhões de africanos vieram trabalhar como escravos no Brasil por vontade própria? Ou que os escravos provocavam os feitores para sentirem os chicotes rasgando suas carnes?
Por ser técnico da seleção de futebol de um país onde a maioria da população é negra, seria interessante que Dunga procurasse conhecer como a participação dos negros na formaçao do Brasil foi trágica e dolorosa. Deveria saber, inclusive, que os negros não eram passivos e promoviam revoltas ou recorriam ao suicídio para escapar da opressão.
Se negros gostassem de apanhar, como afirmou, não teríamos personagens históricos como João Cândido, líder da Revolta da Chibata, motim de marinheiros ocorrida em 1910 pelo fim dos castigos físicos nos navios. Naquela época, a maioria dos marujos era negra.
Diante da repercussão negativa do comentário, Dunga correu para dar uma resposta ao mal entendido. “Quero me desculpar com todos que possam se sentir ofendidos com a minha declaração sobre os afrodescendentes. A maneira como me expressei não reflete os meus sentimentos e opiniões”, escreveu no site da CBF.
Uma nota curta e direta, coisa de quem não quer problematizar a conversa. No jargão futebolístico, daria para dizer que ele tirou o pé na hora da dividida. Melhor assim que se alongar em um assunto que ignora e aumentar lista de asneiras, correndo o risco de igualar-se ao Rei Pelé.
Marcos Sacramento, capixaba de Vitória, é jornalista. Goleiro mediano no tempo da faculdade, só piorou desde então. Orgulha-se de não saber bater pandeiro nem palmas para programas de TV ruins.