Denunciado por incitação, bolsonarista agora se diz apoiador de Boulos e do PT

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Em 2022, líder de motociata Jackson Vilar incitou seguidores a matar e quebrar urnas; PT e PSOL negam vínculo partidário

Por Gabriel Máximo, compartilhado de A Pública




“Segunda-feira eu tô lá em Brasília levando o capacete para o presidente [Lula]”, diz em um vídeo no Instagram um sorridente Jackson Vilar. O equipamento de proteção é decorado com o número 13, do Partido dos Trabalhadores (PT), o Brasão da República e uma outra parte vermelha com uma estrela branca rodeada pelas frases: “O Brasil feliz de novo” e “Juntos pelo Brasil”. Sem saber o histórico de Vilar, é possível considerar apenas uma manifestação de apoio ao atual presidente petista. Entretanto, o personagem não se tornou conhecido por ser um integrante do chamado campo progressista. 

Nas redes sociais, Vilar já se posicionou a favor da ditadura militar e, em 2021, publicou uma mensagem comemorando o golpe. “Salve o dia 31 de março de 1964, o dia em que o Brasil disse não ao comunismo”, escreveu.

Vilar, que se intitula presidente do “Acelera para Cristo”, foi responsável por organizar uma motociata em apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), em 2021. À época, o evangélico reuniu motociclistas para percorrer 130 km, de São Paulo a Americana, no interior do estado, em um evento que teria custado R$ 1 milhão aos cofres públicos e com atuação de 1.900 PMs e três helicópteros. Tudo isso no contexto da pandemia da covid-19, o que levou o Ministério Público de São Paulo a investigar os organizadores do evento pela falta de segurança sanitária. 

Jackson Villar e Bolsonaro durante Motociata em 2021, Jair fala ao microfone.
Jackson Villar e Bolsonaro durante motociata em 2021

Mas o apoio a Bolsonaro não se restringiu apenas a esse ato. Como a Agência Pública revelou em 2022, Vilar esteve também envolvido em uma articulação nas redes sociais propagando desinformação contra a vitória de Lula no segundo turno da eleição presidencial.

Em conversas em grupos administrados por ele no Telegram, o empresário defendeu uma “eleição paralela” para provar uma suposta “fraude nas urnas eletrônicas” e sugeriu quebrar os equipamentos. 

Além disso, os diálogos no grupo “Nova Direita 70 milhões” revelaram também o incentivo a agressões a adversários políticos. Em uma das conversas, Vilar explica a um bolsonarista como lidar com apoiadores de Lula: “Você tem que falar assim: ‘Os cara vão te ‘passar’ [expressão para matar], os cara vão caçar todo mundo que é petista. Você vai convencer uma alma sebosa com o medo, entendeu? Ele só respeita o cacete”. 

A reportagem mostrou ainda que o evangélico fez comentários preconceituosos em relação ao povo baiano, a quem definiu como “descarados e vagabundos” por terem votado majoritariamente em Lula – o petista recebeu 67% dos votos contra 24% de Bolsonaro no estado. “Baiano é gente boa, mas ele é meio descarado. É falso. Eu conheço a natureza do baiano, o negócio dele é se requebrar”, afirmou Vilar à época.

POR QUE ISSO IMPORTA?

  • Jackson Vilar incitou violência e desinformação nas eleições e, após reportagem da Pública, foi denunciado criminalmente na Justiça e pode ser condenado ao fim do processo
  • Após às eleições, o empresário mudou seu posicionamento público, diz ter rompido com Bolsonaro e atualmente afirma que apoia Lula, PT e Boulos, pré-candidato à prefeitura de São Paulo pelo PSOL

Após a publicação da reportagem da Pública, o então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, determinou em 27 de outubro a remoção de grupos com mais de 200 mil participantes administrados pelo empresário nas redes sociais e aplicativos de mensagens. Em sua decisão, Moraes destacou que as declarações constatavam “a existência de manifestação pública sabidamente inverídica a respeito das urnas eletrônicas, com a finalidade de promover um ataque institucional de teor incendiário e incentivar o extremismo”. 

O empresário também fez ameaças de violência física e ofensas ao autor do texto, o diretor e editor da Pública Thiago Domenici, no grupo “Nova Direita 70 milhões”. Diante da possível violação à proteção constitucional da atividade jornalística, a Pública apresentou uma notícia-crime contra Vilar na Delegacia de Crimes Raciais e de Intolerância de São Paulo. 

As informações divulgadas na matéria motivaram ainda, em 30 de outubro de 2022, a instalação de um inquérito pela Polícia Federal (PF), na Delegacia de Direitos Humanos e Defesa Institucional, em São Paulo, para investigar o possível cometimento pelo empresário de crime previsto no artigo 301 do Código Eleitoral, que estabelece pena de até quatro anos de prisão e pagamento de multa para quem “usar de violência ou grave ameaça para coagir alguém a votar, ou não votar, em determinado candidato ou partido, ainda que os fins visados não sejam conseguidos”. 

O pedido de abertura de uma investigação contra Jackson Vilar partiu de Andrei Passos Rodrigues, atual diretor-geral da Polícia Federal e, à época dos fatos, coordenador da equipe de segurança do então candidato petista à Presidência da República. Em um documento ao qual a Pública teve acesso, a PF detalha a atuação de Vilar nas redes sociais e destaca que o presidente do Acelera para Cristo aparecia como administrador de pelo menos quatro grupos no Telegram em apoio à reeleição do então presidente Bolsonaro.

A corporação identificou ainda imagens no Instagram em que o empresário aparece com um taco de beisebol, chamado por ele de “exterminador de almas sebosas”, em que havia, segundo a PF, “mensagens de ameaça”. Em uma das publicações, Vilar escreveu: “É bom temer mesmo porque não vou dar mole para ninguém! Pelo contrário, vou fazer massagem de porrete em qualquer ladrão antes de ser preso, seja político ou não”. Em um relatório preliminar, a PF conclui que “grande parte dos áudios” analisados, que constam na reportagem da Pública, pertencia a Vilar, algo que ele admitiu em seu perfil no Instagram após a publicação da matéria, mas alegou que as declarações da reportagem foram retiradas de contexto.        

A PF intimou Vilar a depor sobre o caso em 2 de março de 2023. O depoimento foi marcado para o dia 26 de abril daquele ano, às 15h, na Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. Na oitiva, conduzida pelo delegado Hiroshi Yamanaka, o empresário negou que tenha apoiado a destruição de urnas eletrônicas. Em sua justificativa à PF, Vilar afirmou que estava “comentando vídeos de eleitores no primeiro turno das eleições que foram votar e não conseguiram devido a falhas técnicas nas urnas eletrônicas”. 

Segundo ele, isso poderia motivar danos aos equipamentos já que os eleitores estavam com ânimos acirrados em 2022. O evangélico também negou ter questionado o processo eleitoral ou falado em fraudes, já que “não tem qualquer prova de que tenham ocorrido”. Em relação às declarações sobre o povo baiano, Vilar afirmou que elas se deram em “tom de brincadeira” e que “nunca” apoiou violência contra opositores de seu grupo político. Ele  declarou também que foi contra o ataque às sedes dos Três Poderes em Brasília em 8 de janeiro de 2023, e que chegou a ser criticado por integrantes de um grupo do Telegram chamado “Acelera pela Paz”. 

Após a conclusão do inquérito, a promotora de Justiça Eleitoral Camila Mansour Magalhães da Silveira apresentou denúncia contra Jackson Vilar em 6 de de julho de 2023. Na manifestação, ela menciona que a conduta do empresário impede um acordo com o Ministério Público Eleitoral. “Ao que tudo indica, o denunciando [Vilar] denota uma conduta social reprovável e personalidade voltada à prática de ilícitos penais, uma vez que ostenta processo anterior pelo cometimento de crimes contra a honra e de ameaça e já foi beneficiado com a suspensão condicional do processo”, diz.

Mansour pediu o arquivamento do processo em âmbito eleitoral, já que, segundo a promotora, “não há elementos probatórios mínimos indicativos sobre qual(is) pessoa(s) tenha(m) sido coagida(s) a votar ou não votar em determinado candidato ou partido, em razão de violência ou grave ameaça usada pelo denunciando”.

No entanto, a promotora denunciou Vilar em 6 de julho de 2023 por “incitação à prática de crime”. A denúncia se baseia no artigo 286 do Código Penal, que estabelece pena de três a seis meses de prisão ou pagamento de multa. A ação penal proposta pelo  Ministério Público Eleitoral foi recebida pelo juiz eleitoral Rodrigo César Müller Valente, que determinou ainda que o processo siga na Justiça Criminal de São Paulo, onde tramita atualmente. 

Guinada à esquerda?

Depois de declarar o rompimento com Bolsonaro em 2023, Jackson Vilar tem feito publicações em apoio ao governo Lula e políticos progressistas. Em seu perfil no Instagram, ele critica apoiadores de Bolsonaro, como a que aparece debochando da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e do senador Marcos do Val (Podemos-ES) por não conseguirem subir no trio elétrico que conduzia a manifestação a favor do ex-presidente na avenida Paulista em 25 de fevereiro deste ano. 

Além disso, o empresário se define como pré-candidato a vereador por São Paulo e exibe imagens abraçado ao pré-candidato a prefeito da capital paulista Guilherme Boulos (PSOL) e à presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann. “É hora de unir forças e renovar São Paulo! Junto com Guilherme Boulos para construir um futuro melhor para nossa São Paulo”, escreveu Vilar em uma das publicações. 

Jackson Vilar (à esq.) e Guilherme Boulos (à dir.)
À esquerda, Jackson Vilar e Guilherme Boulous; à direita, Jackson Vilar e Gleisi Hoffmann

Procurado pela Pública, o diretório municipal do PT em São Paulo negou que Vilar esteja filiado ao partido. Já a assessoria de Boulos declarou que o empresário não tem nenhuma relação com a pré-campanha e que é apenas um apoiador.

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