Bar Depois do Escuro: crônicas de amores líquidos e incertos

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Por Ítalo Rocha Leitão, jornalista, amigo do Bem Blogado

Felício e Belinha




Felício amava Belinha. Belinha amava Felício. Os dois eram xifópagos. Um amor roxo, intrínseco. Seus beijos tinham o tempo da eternidade. Mas, num dia qualquer, Belinha deixou de amar Felício. Felício quis partir ao se lembrar de “Minha Namorada” (Vinícius de Moraes/Carlos Lyra): “Sem a qual a vida é nada/sem a qual se quer morrer”.

Mas, depois, ponderou e viu que o melhor seria desistir de vingar-se de si mesmo. Achou que era mais proveitoso beber até um dia esquecer Belinha. Começou sua via-crúcis alcoólica pelo Depois do Escuro. Um antigo bar recifense mais do que interessante que ficava no bairro das Graças, no número 168, na rua da Amizade, pertinho da casa onde morou o ex-governador Agamenon Magalhães.

Na época do desamor de Felício, quase fim da primeira metade da década de 1980, o bar fervilhava de gente. Felício era o primeiro a chegar e o penúltimo a sair. Certo dia, depois de tomar todas, Felício chegou à conclusão de que não iria conseguir esquecer nunca a amada que o abandonou. Foi então que teve a ideia de apelar aos céus. Pediu para desligarem o som, subiu na mesa do bar e gritou: “Deus, oh, Deus, fazei com que sejam transferidos para Belinha 27 por cento da saudade que sinto daquela ingrata!”.

Felício nunca explicou como chegou a esse percentual.

Em seguida, desceu da mesa, chorou compulsivamente, tomou mais uma dose de Bacardi com gelo e coca-cola, pagou a conta, foi embora e parou de beber definitivamente!

Se já deixou de amar Belinha, ninguém sabe, ninguém viu!!!

Toinho e Evita

Na postagem anterior, falei do amor entre Felício e Belinha. Agora, é a vez de falar do que aconteceu com o coração de outro frequentador assíduo do Depois do Escuro, o bar recifense que viveu seu auge nos anos 1980. Chamava-se Toinho Pedrosa. Era intelectual, militante de esquerda e boêmio. Toinho engatou uma amizade fraternal com uma colega de um dos cursos que frequentou na Unicap. Se tratava de uma morena bonita chamada Evita dos Anjos. Era comum frequentarem as suas respectivas casas.

O bar preferido de Evita passou a ser também o Depois do Escuro. Algumas noites, quando a farra passava do previsto, Evita levava Toinho pra dormir na casa dela. Cada qual no seu quadrado. Ela via em Toinho uma amizade mais do que infinita. E, da parte dele, também existia reciprocidade. Só que com essas farras frequentes, Toinho acabou se apaixonando e passou a ver na outrora amiga o amor da sua vida.

E isso jamais havia passado pela cabeça de Evita. Mas Toinho resolveu botar as cartas na mesa. Enviou um telegrama pra sua amada remota e escreveu uma única palavra:

TUDO!

Evita respondeu com um atraso de 36 horas e usou também uma única palavra e com igual quantidade de letras:

NADA!

Restou a Toinho Pedrosa se apegar a um pensamento filosófico de Marcel Proust, que diz ser o amor não correspondido tão monótono quanto o amor correspondido

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