Desastre em MG: só o Estadão apura? E porque o “terremoto” é causa improvável

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Por Fernando Brito para o Tijolaço – 

Não é só na política que o jornalismo anda caindo pelas tabelas.

Neste desastre de Mariana, fico impressionado com o fato de que, exceto pela apuração do Estadão, ainda que abaixo do que se poderia esperar de quem tem todos os meios, os demais jornais estejam engolindo um enxame de moscas, talvez sob a influência de alguma “preguiça ideológica”, já que a empresa responsável é privada e 50% dela multinacional.

tremor

Ontem, publicou trechos do  laudo que apontava possíveis instabilidades nos taludes da barragem de rejeitos, feito em 2013. Embora não fosse uma condenação da estrutura, indicava possíveis problemas de drenagem . O mesmo estudo que, na sexta,este blog destacou.

Hoje, por caminhos diversos, aponta indícios de que as barragens acidentadas estavam sobrecarregadas, pelo super-crescimento da produção de minérios e, consequentemente, da de rejeitos. E não foi por dica deste blog, não, porque só publiquei isso ontem à noite, quando a edição do Estadão já estava fechando ou mesmo estava fechada.

É apenas jornalismo, que procura fatos que possam – ou não – ter sido responsáveis pela tragédia. No resto, em geral, nada é apurado.

Só o que se fica destacando, repetidamente, são tremores mínimos de terra, algo corriqueiro e que, em tese, podem ser absorvidos por estruturas como esta sem problemas, até porque só são registrados pelos mais delicados sismógrafos e quase nunca sequer são sentidos pelas pessoas.

Querem um exemplo? Aqui está:

“A região de Miranda, município 208 quilômetros a oeste de Campo Grande (Mato Grosso do Sul), teve dois tremores de terra em um intervalo de não mais que 33 horas, entre a quinta (5 de novembro de 2015) e sexta-feira (6 de novembro). Não houve relato de moradores da região que tivessem sentido os abalos sísmicos, nem forças de resgate e segurança registraram qualquer chamado a respeito. De acordo com o Centro de Sismologia da USP (Universidade de São Paulo), o primeiro tremor, na quinta, foi registrado às 18h23 e teve magnitude de 2.1. O segundo abalo, na sexta, foi registrado às 2h47 (horário de MS) e teve magnitude 4.0, considerado ‘ligeiro’. A Polícia Militar local e o Corpo de Bombeiros de Aquidauana, que atende em Miranda, informaram que não houve chamados sobre os abalos e que não tomaram conhecimento de pessoas relatando o fato. “

Publico lá em cima parte da lista de terremotos registrados nos dias 5 e 6 – do México para “baixo” no continente americano – para que se veja que os indicados na região do acidente são de escala muito inferior ao do que nem foi sentido no Mato Grosso do Sul.

E muito inferior, mesmo, porque a escala Richter não é uma progressão aritmética, mas geométrica. Assim, um terremoto de escala 2 (que acontece em número de mil por dia em todo o planeta) é milhar de vezes menor que um de escala 4. Claro que os efeitos podem ser aumentados pela profundidade em que ocorrem, mas neste tamanho de evento, é desprezível quanto a danos em estruturas construtivas.

Ou seja: um tremor de 2 na Escala Richter é, em princípio, como uma pessoa dar uma pancada numa parede. Ela não vai cair, a menos que já estivesse para cair por outras razões. Mas os “terremotos” continuam a ser mencionados em quase todas as matérias, embora não haja um técnico no assunto que diga que é provável que tenham influído significativamente no desabamento.

O jornalista que não procura esclarecer a informação, traduzi-la, nem que seja com a ajuda de profissionais da área, para algo compreensível para o leitor, não está informando, está mistificando, mesmo involuntariamente.

O problema é que isso acontece numa questão que, como se viu, mata pessoas. E que é algo que vale dinheiro, muito dinheiro. Mas o Brasil segue sendo o país da fechadura em porta arrombada, como se viu na atitude da Samarco de instalar sirenes de alerta, agora que a represa veio abaixo. É coisa de quê? Cinco, dez mil reais, gastando muito, um pouco mais se o acionamento for automático, iniciado pelos próprios sensores que devem (ou deveriam) estar instalados na barragem.

Não, isso não é “assunto técnico” que não possa ser discutido e aprofundado. Senão, o conhecimento passa a ser um instrumento de poder e opressão, quando é, ao contrário, de igualdade e exercício de direitos.

O esclarecimento final pertence aos especialistas. Mas, antes, compete aos jornalistas levantar fatos – e não boatos – para que a apuração não seja viciada pelo “abafa” do poder político e econômico. Com responsabilidade, mas sem preguiça.

Mental, inclusive.

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