Por José Eustáquio Diniz Alves, compartilhado de Projeto Colabora –
FMI diz que “esta é uma crise como nenhuma outra e existe uma incerteza substancial sobre seu impacto na vida e nos meios de subsistência das pessoas”
A pandemia da covid-19 atingiu 2 milhões de casos e continua avançando em ritmos diferenciados pelo mundo. Em uns países a velocidade do surto diminui, em alguns permanece estável e em outros ela aumenta. Mas uma coisa é certa, o impacto recessivo será amplo, geral e irrestrito, pois o FMI estima uma queda de 3% no PIB mundial e de 5,3% no PIB brasileiro em 2020.
O panorama nacional
O Ministério da Saúde, na tarde de 14/04, atualizou o número de casos da covid-19 para 25.262 pessoas infectadas e o número de mortes para 1.532, com uma taxa de letalidade de 6,1%. Como era esperado, depois das subnotificações no feriado prolongado, os registros voltaram a subir na terça-feira no Brasil.
Os gráficos abaixo mostram que a maior variação absoluta do número diário de casos (2.210) ocorreu no dia 08 de abril (uma quarta-feira) com uma variação relativa de 16,1%. Portanto, superior à variação de 1.832 casos ocorrida ontem (com variação percentual de 7,8%). Já no caso das mortes a variação absoluta de ontem (204 óbitos) é um recorde diário, o que fez voltar a variação percentual para 15,4% ao dia. Estes números sugerem que a pandemia está “subindo a curva” no país e deve apresentar números absolutos mais elevados durante o restante do mês de abril.
O panorama global
No dia 14 de abril, a pandemia global atingiu uma marca história e chegou ao patamar de 2 milhões de casos. O dia encerrou com a notificação de 1.997.906 de pessoas infectadas e 126.600 mortes registradas no mundo, com uma taxa de letalidade de 6,2%.
Dois exemplos de países que chegaram ao pico da pandemia e agora começam a “descer a curva”, são Itália e Espanha, conforme os gráficos abaixo. Na Itália o pico absoluto do aumento do número diário de novos doentes foi de 6.557 casos no dia 21/03 e o pico absoluto do número de mortes foi de 919 óbitos no dia 27/03 (gráfico da esquerda). Após estas variações absolutas máximas, há uma clara tendência de queda e no dia 14 de abril os novos casos na Itália ficaram abaixo de 3 mil (2.972). O número diário de mortes caiu até 431 em 12/04, mas tiveram um aumento para 602 óbitos no dia 14/04 (embora bem abaixo do pico que foi de 919 mortes). A tendência de desaceleração fica ainda mais clara no gráfico da direita, pois as variações relativas que estavam acima de 20% ao dia, na primeira quinzena de março, agora encontram-se abaixo de 3% ao dia.
Na Espanha, o pico absoluto do aumento do número diário de novos doentes foi de 8.271 casos no dia 26/03 e o pico absoluto do número de mortes foi de 961 óbitos no dia 02/04 (gráfico da esquerda no painel de baixo). Após estas variações absolutas máximas, há também uma clara tendência de queda e no dia 14 de abril os novos casos na Espanha ficaram em 2.442. O número diário de mortes caiu para 499 óbitos em 14/04. A tendência de desaceleração também fica clara no gráfico da direita, pois as variações relativas que estavam acima de 40% ao dia, agora encontram-se em torno de 3% ao dia.
A pandemia na Índia
O primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, considerado fundamentalista hindu e de direita, não brinca em serviço e tenta evitar uma explosão da covid-19 no país de 1,35 bilhão de habitantes. Com a mão firme do governo, a Índia irá prorrogar o isolamento social até 3 de maio para impedir a propagação do novo coronavírus. O confinamento estrito de três semanas, em vigor desde 25 de março, deveria acabar ontem (terça-feira, 14/04).
Mesmo assim, a pandemia avança no país que já deu tantas contribuições à ciência (como a invenção do zero e do sistema decimal). O número de casos atingiu 11,5 mil e o número de mortes 393 em 14 de abril. Embora com bem menos notificações do que o Brasil, entre os dias 01 a 14 de abril o número de casos cresceu a 16% ao dia e o número de mortes cresceu a 19% ao dia. A Índia vive um momento preocupante.
A pandemia e o pandemônio econômico nacional
A pandemia de covid-19 chegou em má hora no país, pois pegou a economia brasileira enfraquecida, com esclerose múltipla e várias “doenças” de risco, como baixa produtividade, baixa competitividade internacional, baixo dinamismo na produção de bens e serviços, baixa geração de emprego decente, baixa geração de renda, baixo investimento e com “pressão alta” no déficit fiscal, na dívida pública e nos indicadores de pobreza e desigualdades sociais.
A covid-19 atacou o pulmão da economia, que é a máquina de produção de mercadorias em massa e provocou um ataque nos órgãos que bombeiam doses elevadas de consumo nas veias da sociedade. Um minúsculo vírus de 1 bilionésimo de milímetro parou as fábricas, boa parte do comércio, colocou os funcionários públicos em casa, deixou os trabalhadores informais na rua da amargura, deu um nó górdio no turismo, esvaziou as praias e ainda acabou com o futebol (não só nas tardes de domingo), adiou as Olimpíadas e cancelou os shows de música e os bailes funks.
O resultado é a maior recessão da história brasileira desde 1900. Relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI), divulgado dia 14/04, estima que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro vai cair 5,3%, ante uma previsão de alta de 2,2% feita em meados de janeiro de 2020. Evidentemente, este número pode ser maior ou menor em função da capacidade nacional de controlar a epidemia e de promover uma recuperação rápida.
O gráfico abaixo mostra as variações anuais do PIB per capita brasileiro e a média móvel de 10 anos (decênios). Nota-se que a recessão de 2020 deve provocar a maior queda da renda per capita brasileira, impressionantes 6,1% (5,3% do PIB mais 0,8% do crescimento anual da população), número negativo mais elevado do que na recessão de 1918, provocada pela Gripe Espanhola e a crise do início dos anos de 1930, ocorridas na grande depressão global após o crash da Bolsa de Nova Iorque de 1929. O empobrecimento médio da população brasileira em 2020 (de 6,1%) será mais profundo do que ocorreu nos governos Figueiredo, Sarney e Collor.
O fato é que, nos últimos anos, o Brasil já estava em uma situação frágil e já caminhava para a segunda década perdida. Agora não resta dúvida, o período 2011-20 será a década de menor crescimento do PIB e de maior queda da Renda per capita da história republicana do país. Trata-se de um desempenho anêmico e decepcionante. Desde a crise de 2014, a economia brasileira – que tem seguido uma trajetória submergente – está sem fôlego e respirando por meio de “respiradores” artificiais administrados por uma governança nacional caótica e sem rumo. É neste cenário de complicações macroeconômicas que a covid-19 ameaça os sinais vitais da economia brasileira.
A pandemia e o pandemônio econômico global
O mesmo relatório do FMI, divulgado em 14/04, também trouxe uma estimativa assustadora em relação ao desempenho do PIB mundial que deve cair 3% em 2020, a maior queda anual da história do capitalismo. Um tombo anual maior do que aconteceu na grande depressão da década de 1930, sendo que nem na Segunda Guerra Mundial houve queda tão grande.
Mas a recessão não será uniforme e as diferenças regionais e nacionais são grandes. As economias avançadas (economias de alta renda) devem cair 6,1% em 2020 (com 5,9% nos EUA, 9,1% na Itália, 8% na Espanha, 8% no Japão, 7% na Alemanha, etc.). Nas economias emergentes a variação deve ser de 1% (Com a China crescendo 1,2% e a Índia crescendo 1,9%), a Rússia com menos 5,5% e a ASEAN-5 com menos 0,6%. A América Latina e Caribe (ALC) deve variar negativamente em 5,2, com o Brasil apresentando PIB negativo de 5,3% e México 6,6%. A África Subsaariana variação de menos 1,6%.
Os gráficos abaixo mostram a variação do PIB do mundo, dos países emergentes, da ALC e do Brasil entre 1980 e 2020. Nota-se que o mundo teve dois anos de queda no PIB, que foi no ano 2009 (-0,1%) e agora em 2020 (-3%). Mas o crescimento médio nos 40 anos em questão foi positivo e de 3,4% ao ano. Já os países emergentes não tinham apresentado queda até o ano de 2020 quando está previsto -1%, mas apresentam crescimento médio anual de 4,5% ao ano, no período de 40 anos.
Já a América Latina e o Caribe apresentaram recessão em 1982, 1983, 2009, 2016 e agora em 2020. Considerando o período de 40 anos, a ALC apresentou crescimento médio anual de 2,4% ao ano. O Brasil apresentou recessões nos anos de 1981, 1983, 1990, 1992, 2015, 2016 e agora em 2020. Nas 4 décadas em questão, o Brasil apresentou crescimento médio anual de 2,1% ao ano, bem abaixo do mundo, dos países emergentes e até menor do que a média da ALC.
As estimativas do FMI servem para balizar as discussões econômicas internacionais e servem para se ter um primeiro panorama dos efeitos da pandemia de covidd-19 no desempenho do PIB global.
O relatório do FMI diz: “Esta é uma crise como nenhuma outra e existe uma incerteza substancial sobre seu impacto na vida e nos meios de subsistência das pessoas. Depende muito da epidemiologia do vírus, da eficácia das medidas de contenção e do desenvolvimento de terapêuticas e vacinas, todas difíceis de prever. Além disso, muitos países enfrentam agora várias crises – uma crise de saúde, uma crise financeira e um colapso nos preços das commodities, que interagem de maneiras complexas. Os formuladores de políticas estão fornecendo apoio sem precedentes a famílias, empresas e mercados financeiros e, embora isso seja crucial para uma forte recuperação, há uma incerteza considerável sobre como será o cenário econômico quando emergirmos desse bloqueio”.
Portanto, a única coisa certa é que há muita incerteza pela frente. Temos de nos preparar e estar preparados para enfrentar tempos difíceis.