Diário da Covid-19: Se ritmo for mantido, Brasil terá mais mortos do que a China em uma semana

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Por José Eustáquio Diniz Alves, compartilhado de Projeto Colabora – 

País supera Canadá, Holanda e Suíça no ranking dos mais atingidos e bate recorde diário de casos e óbitos

Um homem usando máscara passa por um grafite do artista Marcos Costa, ou Spraycabuloso, na entrada da favela Solar de Unhão, em Salvador. Foto Antonello Veneri/AFP

A pandemia avança rapidamente no Brasil. Ontem (15/04), o país bateu o recorde de número diário de casos e mortes pela covid-19. No ranking global, o Brasil ultrapassou, de uma só vez, Canadá, Holanda e Suíça, saltando para o 11o lugar, tanto em número de casos, quanto em número de óbitos. Neste ritmo, dentro de uma semana, o país deve ultrapassar a China em número de mortes pelo novo coronavírus. Hoje, a China, primeiro epicentro do doença, registra 3.342 óbitos.




O panorama nacional

Na tarde do dia 15 de abril, o Ministério da Saúde atualizou o número de casos da covid-19 para 28.320 pessoas infectadas e o número de mortes para 1.736, com taxa de letalidade de 6,1%.

Em apenas 24 horas, foram 3.058 novos casos (12,1% de aumento) e 204 mortes (13,3% de aumento), recorde atingido pelo segundo dia consecutivo. O Brasil superou o número de novos casos da Itália em 15/04. Nota-se que nos fins de semana de 29/03, 05/04 e 12/04 os números de casos e mortes, em geral, caíram e depois subiram no meio da semana. Mas a despeito destas variações ocasionais, o número de casos estava em 5,7 mil em 31 de março e subiu para 28,3 mil em 15 de abril (um aumento de 5 vezes, ou de 11,3% ao dia). O número de mortes que estava em 201 em 31/03, subiu para 1,7 mil em 15/04 (um aumento de 8,6 vezes, ou 15,5% ao dia).

Ainda é cedo para dizer e estudos mais aprofundados são necessários para quantificar os casos subnotificados, mas, no ritmo atual, não é exagero dizer que o Brasil caminha para o segundo lugar no ranking global da pandemia, ficando atrás apenas dos EUA de Donald Trump.

A pandemia pode ter quatro vezes mais casos do que o número oficial

O Centro de Epidemiologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) começou uma pesquisa sobre o nível de imunização da população brasileira ao coronavírus, para identificar de que forma o vírus está se propagando pelo país. A pesquisa tem o apoio do Ministério da Saúde. Os resultados iniciais, para o Rio Grande do Sul, mostam que há quatro vezes mais casos de covid-19 do que o número oficial.

O coronavírus já chegou a mais de 1 mil cidades brasileiras

O primeiro caso de coronavírus no Brasil foi notificado na cidade de São Paulo no dia 25 de fevereiro. Em menos de 2 meses o vírus se espalhou por mais de 1 mil cidades. Em 15 de abril, as duas cidades mais populosas do país, evidentemente, lideravam a lista: São Paulo tinha 25% dos casos e o Rio de Janeiro tinha 10% dos casos. Mas o que impressiona mesmo são cidades da Amazônia com Manaus com 5% dos casos e Macapá (com 0,17% da população brasileira) que registrou 1% dos casos do país.

Confesso que não me encanta o ideal de vida defendido por aqueles que pensam que o estado normal dos seres humanos é aquele de sempre lutar para progredir do ponto de vista econômico, que pensam que o atropelar e o pisar os outros, o dar cotoveladas, e um andar sempre ao encalço do outro são o destino mais desejável da espécie humana

John Stuart Mill (1806-1873)
Economista

Guayaquil para o Brasil: “Eu sou você amanhã”

O Equador tem uma população de 17,6 milhões de habitantes, que representa 4,1% da população da América do Sul (de 431 milhões). Mas o Equador, no dia 15/04, possuia 13% dos casos notificados de covid-19 e 14,5% das mortes da pandemia no continente.

A cidade de Guayaquil, que se tornou o epicentro da pandemia do coronavírus no Equador, passa por uma situação dramática, pois o sistema funerário entrou em colapso, tornando-se incapaz de recolher o crescente número de corpos de pessoas que morreram em suas casas durante o toque de recolher. Os relatos e imagens dramáticas de cadáveres em estado de putrefação, dão um toque de “realismo mágico”, que nem a ilimitada imaginação de Gabriel Garcia Márquez seria capaz de descrever. O Brasil que se cuide e não queira repetir Guayaquil!

O panorama global

No dia 15 de abril, a pandemia global ultrapassou a marca história de 2 milhões de casos. O dia terminou com a notificação de 2.082.372 pessoas infectadas e 134.560 mortes. O número de mortes em 24 horas foi recorde absoluto com 7.960 mortes no mundo (com destaque para os recordes dos EUA e da França). A taxa de letalidade ficou em 6,5%.

Olhando a série histórica, o mundo registrou 88,6 mil casos de covid-19 no dia 01 de março de 2020, número que quase dobrou para 169,6 mil casos em 15 de março (foi um aumento médio diário de 4,6% na quinzena). No dia 31 de março já havia 858,4 mil casos, um aumento de 5,1 vezes (ou 10,9% ao dia na segunda quinzena de março), conforme gráfico abaixo.

O mês de abril começou com 935,2 mil casos e chegou a 2,1 milhões no dia 15/04, um aumento de 2,2 vezes (ou 6,1% ao dia na primeira quinzena de abril). Portanto, as maiores taxas de crescimento diário ocorreram na segunda quinzena de março. A primeira quinzena de abril tem um ritmo menor de crescimento do surto em relação à quinzena anterior, mas um ritmo superior à primeira quinzena de março. Os dados indicam que o ritmo vai se desacelerar ainda mais na segunda quinzena de abril.  Mesmo assim, o número de casos globais deve ultrapassar a marca de 3 milhões até o final do corrente mês.

O mundo registrou 3 mil casos de covid-19 no dia 01 de março de 2020, número que mais que dobrou para 6,5 mil casos em 15 de março (foi um aumento médio diário de 5,3% na quinzena). No dia 31 de março já havia 42,3 mil casos, um aumento de 6,5 vezes (ou 12,6% ao dia).  O mês de abril começou com 47,2 mil casos e chegou a 134 mil no dia 15/04, um aumento de 2,8 vezes (ou 7,2% ao dia). Portanto, as maiores taxas de crescimento diário do número de mortes também ocorreram na segunda quinzena de março. Assim como nos casos, o número de mortes cresce em ritmo mais lento em relação à quinzena anterior, mas um ritmo superior à primeira quinzena de março. Outra característica é que o ritmo de aumento das mortes ocorre em maior velocidade do que o ritmo de avanço dos casos. Portanto aumenta a taxa de letalidade que era de 3,4% em 01/03, passou para 3,8% em 15/03, para 5% m 01/04 e chegou a 6,5% em 15 de abril.

A pandemia e o pandemônio econômico global

O Fundo Monetário Internacional (FMI), em suas atualizações de janeiro de 2020 indicou um crescimento do PIB mundial de 3,3% em 2020 e de 3,4 em 2021. Mas no relatório de 14 de abril de 2020 – sob o efeito da covid-19 – indicou uma queda de 3% em 2020, mas de forma bastante otimista estima uma retomada de 5,8% em 2021.

Mesmo assim, o fosso entre as duas previsões é gigantesco (e pode ficar muito maior se a pandemia do novo coronavírus se prolongar). O fato é que a perda acumulada para o PIB global entre 2020 e 2021 da crise pandêmica pode ser de cerca de 9 trilhões de dólares, maior do que as economias do Japão e da Alemanha juntas.

A população mundial atinge um número “cabalístico”!

O site Worldometer mostrou, no dia 14/04/2020, que a população mundial de quase 8 bilhões de habitantes, chegou a um número, no mínimo, curioso: 7 bilhões, 777 milhões, 777 mil e 777 pessoas vivendo no Planeta Terra. O número 7.777.777.777 é uma capicua – sequência de algarismos que permanece a mesma se lida na ordem direta ou inversa.

Por que o mundo não escutou John Stuart Mill?

A grande depressão de 2020 vai ficar na história e vai lembrar ao mundo que é inútil manter a crença na possibilidade de crescimento demoeconômico infinito em um Planeta finito. Os economistas clássicos sabiam que a economia e a população não poderiam crescer indefinidamente. Mas, a despeito dos inúmeros alertas da natureza, as atividades humanas cresceram até um ponto que ultrapassaram a capacidade de regeneração do Planeta, conforme mostram os dados da pegada ecológica. Em 2016 (últimos dados da Footprint Network), o mundo já estava utilizando mais de 70% dos recursos compatíveis com a sustentabilidade da Terra.

A economia clássica já reconhecia os limites ao crescimento e dentre os autores clássicos, um economista fundamental foi John Stuart Mill (1806-1873), discípulo de Adam Smith e David Ricardo (1772-1823), que escreveu o livro “Princípios de Economia Política”, em 1848. No capítulo VI, do livro IV, que tem como título: “A condição estacionária”, ele considera que o crescimento ilimitado do Produto Interno Bruto (PIB) e da população é uma impossibilidade histórica e que o “Estado estacionário” irá predominar, mais cedo ou mais tarde no mundo.

Escrevendo em uma época em que a população mundial era de 1,4 bilhão de habitantes e o PIB global era dezenas de vezes menor do que o atual (1848, p.251), Stuart Mill fez uma pergunta que ainda continua atual: “Para que ponto último está tendendo a sociedade, com seu progresso industrial? Quando o progresso cessar, em que condição podemos esperar que ele deixará a humanidade?

Se o mundo não escutou o alerta de John Stuart Mill, pelo menos vamos lê-lo na quarentena.

Frase do dia 16/04/2020:

Estou propenso a crer que essa condição estacionária seria, no conjunto, uma enorme melhoria da nossa condição atual. Confesso que não me encanta o ideal de vida defendido por aqueles que pensam que o estado normal dos seres humanos é aquele de sempre lutar para progredir do ponto de vista econômico, que pensam que o atropelar e o pisar os outros, o dar cotoveladas, e um andar sempre ao encalço do outro (características da vida social de hoje) são o destino mais desejável da espécie humana, quando na realidade não são outra coisa senão os sintomas desagradáveis de uma das fases do progresso industrial ” (1848, p. 252).

John Stuart Mill (1806-1873)

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