Resenha sobre o livro “Diário Espanhol: entre as guerras e a gripe – um jornal hispânico na Paulicéia (1912-1918), de Isaías Dalle Nogare Liebana
Por Martinho Conceição, via a amiga do blog, Deise Capelozza
Na ida e volta para Porto Alegre, nesse último final de semana, consegui concluir a leitura do livro do meu camarada jornalista e historiador, Isaías Dalle Nogare Liebana, com o qual pude compartilhar, quando ainda fazíamos parte da assessoria da CUT, um trabalho de pesquisa sobre o centenário da Greve Geral de 1917. Eu, para organizar a exposição, da qual fui curador, sobre este marcante evento no processo do “fazer-se” do movimento operário no Brasil e Isaias, para escrever seu primeiro livro, editado em 2017: 100 anos da greve geral – 1917-2017: Passado ou futuro?
Certeza, que esse trabalho foi o que lhe inspirou a dar continuidade nas pesquisas daquele período, em que o Brasil, naquele momento, recebia milhares de trabalhadores italianos, alemães e espanhóis (foco do livro), entre outras nacionalidades, que em sua maioria chegavam para atender a demanda por mão de obra, sobretudo do setor cafeeiro em São Paulo.
É neste contexto que Isaias, como jornalista que é, busca compreender o papel da comunicação no processo de chegada, de inserção laboral, adaptação ao “novo mundo” e resistência em busca de reconhecimento e direitos em um país, cujo mercado de trabalho está em formação, sem que se rompessem os resquícios do período escravocrata que perdurou (oficialmente) até 1888 no Brasil.
Homens, mulheres e crianças sendo submetidos a toda forma de exploração, tendo a fome e a gripe, que é européia, mas a taxaram de “espanhola”, como realidade e ameaças constantes.
Imigrantes europeus, chagavam iludidos pela promessa de terras e enriquecimento fácil, mas aqui quando aportavam, a realidade era bem diferente: seu destino (raíssimas excessões), era servir de mão de obra barata à fazendeiros àvidos por produtividade e lucros.
Através da análise de um jornal voltado, prioritariamente, para os imigrantes espanhóis (DIÁRIO ESPANHOL), de propriedade de Eiras Garcia, jornalista e editor, sujeito batuta, que nutre simpatia pela monarquia, pelo “bom senso” dos fazendeiros do café e até certo ponto pela Social Democracia Européia (em particular a alemã) Isaías Dalle, nos leva a viajar em cenários marcados por violência, exploração, preconceitos e contradições (até do próprio DIÁRIO ESPANHOL, reflexo das posições dúbias de seu proprietário mesmo nas relações com seus conterrâneos), que nos ajudam a compreender um pouco mais sobre os fundamentos da formação da classe trabalhadora brasileira e as ambiguidades do nosso ainda frágil mercado de trabalho.
E de como a comunicação neste contexto pode contribuir (ou não) na formação de uma identidade que se assente na solidariedade, sem estar isenta de manipulações. Recomendo a leitura. Ao meu amigo Isaias Dalle, obrigado pela dedicatória.