Por Vitor Nuzzi, , publicado na Rede Brasil Atual –
Presidenta diz que Cunha sempre atuou para desestabilizar governo e promoveu chantagem para não ser investigado. Reafirma que golpistas farão “letra morta” da CLT e que lutará em defesa do mandato
Dilma: com eles (golpistas) a CLT será letra morta – projeto que querem impor ao Brasil não foi o vitorioso nas urnas
São Paulo – Em discurso de meia hora (das 14h08 às 14h38) no Vale do Anhangabaú, em São Paulo, a presidenta Dilma Rousseff disse no início da tarde de hoje (1º) que resistirá “até o fim” e que a oposição impediu o país de combater a crise e o desemprego. Confirmou o reajuste no Bolsa Família, de 9% em média, e na tabela do Imposto de Renda (5% a partir do ano que vem) – “sem comprometer o cenário fiscal”, acrescentou. Ouvindo gritos de “fica, querida”, Dilma reafirmou estar sendo vítima de golpe. “Se não tem base para o impeachment, o que é que está havendo?”, questionou.
“Como não tenho conta no exterior, nunca recebi dinheiro do povo brasileiro, nunca recebi propina e nunca fui acusada de corrupção, eles tiveram de inventar um crime”, afirmou a presidenta, comparando medidas implementadas no seu governo e no de Fernando Henrique Cardoso, ao afirmar ter feito 100 decretos de suplementação, enquanto o tucano fez 101. “Para ele, não era golpe nas contas públicas. Para mim, é golpe. Dois pesos e duas medidas. Eles não têm do que me acusar. É constrangedor.”
Ela fez referência direta ao presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), segundo Dilma o grande aliado da oposição. “Esse senhor, Eduardo Cunha, foi o principal agente para desestabilizar o meu governo”, afirmou. “Não aprovaram nenhuma das reformas que nós propúnhamos. Apostaram sempre contra o povo brasileiro. São responsáveis pelo fato de a economia brasileira estar passando por uma grave crise.” Segundo a presidenta, Cunha passou a ameaçar com o impeachment após o PT se recusar a dar votos para livrá-lo de um processo de cassação.
Ao lado dos presidentes da CUT, Vagner Freitas, e da CTB, Adilson Araújo, além do secretário-geral da Intersindical, Edson Carneiro, o Índio, Dilma afirmou que o golpe é contra a democracia e contra direitos. “Eles propõem o fim da política de valorização do salário mínimo, que garantiu aumento real de 76% acima da inflação. Querem acabar com o reajuste dos aposentados. Querem transformar a CLT em letra morta e privatizar tudo o que for possível. A primeira vítima dessa lista é o pré-sal. Eles querem acabar com a obrigatoriedade do gasto com saúde e educação”, acusou. “Os programas sociais são olhados como responsáveis pelo desequilíbrio no país. É mentira”, reagiu, criticando a estrutura tributária.
Exclusão
Dilma afirmou que a notícia “mais triste, porque a mais perversa”, é de acabar com parte do Bolsa Família, que seria restrita aos 5% mais pobres, ou 10 milhões de pessoas. “Sabem quantas pessoas recebem hoje o Bolsa Família? 47 milhões”, disse a presidenta, acrescentando que os excluídos serão “entregues às forças do mercado”.
A presidenta também anunciou a criação de um Conselho Nacional do Trabalho e a ampliação da licença-paternidade, de cinco para 20 dias, aos funcionários públicos. E confirmou, como já havia sido noticiado, a prorrogação do programa Mais Médicos por três anos. Na terça, falará sobre o Plano Safra da Agricultura Familiar.
“O golpe é contra a democracia, contra conquistas sociais. É dado também contra investimentos estratégicos no país, como o pré-sal. O mais grave é que impediram o Brasil de combater a crise econômica e o crescimento do desemprego. Eles vão aprofundar a crise. Quero dizer uma coisa para vocês: vou resistir, eu vou resistir e lutar até o fim”, afirmou ao final do discurso. “Não é a minha pessoa. O meu mandato é o que foi dado por 54 milhões de pessoas, que acreditavam num projeto. O projeto que querem impor não foi vitorioso nas urnas. Vão às urnas, se coloque sob o crivo do povo brasileiro.”
Esperado para o ato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não foi ao Anhangabaú. Segundo sua assessoria, Lula estava com problemas na voz e ficou em casa. Entre os representantes do governo presentes, estavam os ministros Miguel Rossetto (Trabalho e Previdência Social) e Aloizio Mercadante (Educação). O secretário municipal de Direitos Humanos e Cidadania, Eduardo Suplicy, também subiu ao palco.
Cunha foi um dos principais alvos do ato das centrais (CUT, CTB, Intersindical), sendo chamado de “ladrão” pelo público. Outro criticado, o governador paulista, Geraldo Alckmin, teve um boneco seu exibido no Anhangabaú, com a palavra “merendão”, referência ao escândalo do desvio em recursos para merendas escolares no estado.
“Discurso único”
Depois do pronunciamento de Dilma, a manifestação prosseguiu com apresentações musicais. Por volta das 17h, começou o show da banda Detonautas, que ajudou a puxar os coros “não vai ter golpe” e “fora, Cunha”. O vocalista, Tico Santa Cruz, usava camisa da União Nacional dos Estudantes (UNE).
“É fundamental que a gente lute também pela democratização das mídias”, afirmou, criticando o que chamou de “discurso único” no setor. “Entregar a Presidência para Temer e Cunha e dizer que está lutando contra a corrupção é no mínimo ser ingênuo”, acrescentou o cantor. O grupo, que terminou a apresentação pouco depois das 18h, fez citação sobre o impeachment durante a execução de Tempo Perdido, sucesso da Legião Urbana: “Nosso suor sagrado/ É bem mais belo que esse golpe errado”. Os Detonautas também tocaram Blues da Piedade, de Cazuza.
Chico César começou a cantar às 18h40, abrindo com Folia de Príncipe, Cálix Bento (Milton Nascimento e Tavinho Moura, uma letra adaptada da Folia de Reis do norte de Minas Gerais) e Mama África, para emendar comPra não Dizer que não Falei das Flores, de Geraldo Vandré. Ainda estavam previstos dois shows.
Foto da capa de Paulo Pinto / Agência PT