Direita sofre rachaduras. Esquerda precisa recompor força. Resultado impõe fortalecer frente ampla

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A esquerda e o campo progressista precisam reforçar a unidade na luta, elaborando plataformas de mobilização convergentes, tanto no parlamento quanto na mobilização do povo

Compartilhado do Portal Vermelho




Realizadas as eleições do segundo turno em 51 cidades, 15 delas capitais, abrangendo quase 40 milhões de eleitores, pode-se afirmar que, embora tenha havido resultados que impactam a aferição geral de quem venceu ou perdeu, mantiveram-se, com oscilações, os vetores do resultado do primeiro turno.

A direita e a centro-direita consolidaram o ranking de maior número de prefeituras conquistadas. A extrema-direita, que havia obtido êxitos no primeiro turno, sofreu, agora, derrotas eleitorais e expôs fraturas em seu âmbito e no próprio bloco da direita. A esquerda deu seguimento, embora com revezes, com destaque para São Paulo, ao esforço de recompor sua força nos municípios.

Para se analisar a larga vantagem pró-centro-direita e direita, é preciso ter em conta que, em 2016 e 2020, a esquerda teve uma severa queda em número de mandatos legislativos e prefeituras com a escalada reacionária do período do golpe de 2016 ao final do governo da extrema-direita, em 2022. E a direita manteve-se na ofensiva, tendo se apropriado de parcela significativa do Orçamento Federal por meio de recursos das emendas parlamentares, o chamado “orçamento secreto”, que injetou bilhões de reais em suas bases municipais, o que fermentou seu estoque de votos e força nos municípios.

Em síntese: a direita, que já vinha de uma base elevada em 2020, teve, agora, por óbvio, melhores condições para se expandir, enquanto a esquerda persiste na desafiante travessia para recompor sua força a partir dos munícipios.

Outro ponto relevante é a existência, entre os eleitos do campo da centro-direita e da direita, de lideranças pertencentes à área de influência política do governo do presidente Lula, posto que o PP, o União Brasil, o MDB e o PSD estão à frente de ministérios. Portanto, parte das prefeituras que serão governadas por essas legendas não estão no campo da oposição.

Nas capitais, Bolsonaro foi o grande derrotado. Perdeu em Belém, Curitiba, João Pessoa, Manaus, Palmas, Goiânia, Porto Velho, Fortaleza e Belo Horizonte. Venceu apenas em Cuiabá e Aracaju.

No campo democrático e progressista, destacam-se importantes vitórias decorrentes, neste segundo turno, de movimentos de frente ampla em capitais de relevância regional: Belém, com Igor Normando (MDB), Belo Horizonte, com Fuad Normad (PSD), Fortaleza, com Evandro Leitão (PT), e João Pessoa, com Cícero Lucena (PP). No primeiro turno, já haviam sido seladas as vitórias de Eduardo Paes (PSD), no Rio de Janeiro, e de João Campos (PSB), no Recife.

A vitória de Evandro Leitão, em Fortaleza, maior cidade do Nordeste, com ampla mobilização do povo e amplitude política, contra um candidato da extrema-direita, se constitui num grande feito da esquerda e do conjunto das forças democráticas. Assim como a reeleição do prefeito Fuad em Belo Horizonte, num confronto face a face do campo democrático com a direita, que se reunificou no segundo turno. Destacam-se ainda as vitórias da Federação Brasil da Esperança, com as candidaturas do PT, em Camaçari (BA), Pelotas (RS) e Mauá (SP). E o PDT em Niterói (RJ), com amplo apoio, e Serra (ES).

São Paulo, pelo porte da cidade e sua influência no país, se constituiu na principal vitória da direita, que agregou uma dúzia de legendas, às quais se somaram mais forças no segundo turno. Nesse bloco, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) sai fortalecido como principal apoiador do prefeito Ricardo Nunes. Jair Bolsonaro, por sua vez, sai chamuscado, uma vez que foi uma figura praticamente ausente.

Um fato extremamente condenável foi a atitude do governador Tarcísio de Freitas, que, no dia da votação, sem apresentar provas, afirmou que o crime organizado indicou votos para Guilherme Boulos. Esse grave delito eleitoral tem sido amplamente reprovado, e, espera-se, deve ser devidamente punido.

A esquerda e o candidato Guilherme Boulos, embora derrotados, realizaram uma campanha competitiva, combativa e propositiva. Conseguiram ampliar apoios no segundo turno e a votação obtida, acima dos 40%, representa um acúmulo que terá relevância para as lutas que se seguem, especialmente a disputa de 2026.

Bolsonaro, com a ambição de tentar controlar com mão de ferro o campo da direita e da extrema-direita, maquinou, desde o primeiro turno, disputas e confrontos com outras lideranças da direita, notadamente em Goiânia e Curitiba. Resultado: além de impor divisões e fraturas no bloco direitista, sofreu derrotas.

O campo democrático e progressista, em especial a Federação Brasil da Esperança, corretamente não cruzou os braços onde houve disputas no âmbito da direita e atuou de forma condizente com a realidade de cada local para derrotar a extrema-direita.

Nesse aspecto, enquanto o presidente Lula prossegue como liderança respeitada no campo democrático e progressista pelo peso de sua força político-eleitoral, o espectro da direita e da extrema-direita se apresenta com rachaduras. Bolsonaro se vê confrontado por lideranças como Ronaldo Caiado, da direita dita tradicional, e por uma variante do neofascismo que emergiu nessas eleições, representada por Pablo Marçal – entre outros –, cujo fôlego ainda está por se definir.

O resultado que acaba de ser consolidado nas urnas catalisa movimentos em ambos os polos e intensificará, imediatamente, as articulações no tabuleiro da política nacional.

Da parte do governo Lula, a matriz tática que lhe deu a vitória é o fator determinante para a governabilidade. A frente ampla ganha importância ainda maior. Impõe-se reforçar a aliança com a centro-direita, neutralizar a direita e prosseguir isolando a extrema-direita para derrotá-la, sem que isso implique rebaixar o papel decisivo da esquerda e do conjunto do campo democrático e progressista, condição para a frente ampla ter sustentação e condução consequentes, com apoio e mobilização do povo.

Ainda em relação ao governo, é preciso assimilar, com eficácia e urgência, as novas demandas do povo decorrentes do revolvimento no perfil da classe trabalhadora, nas suas aspirações e subjetividades, devido a uma série de mudanças do mundo trabalho e das consequências da regressão que houve em termos de direitos, na forte expansão do trabalho informal. Contudo, o fundamental é, com base nos êxitos da reconstrução nacional até aqui alcançados, acelerar o crescimento econômico, com mais produção, mais postos de trabalho, melhores salários e mais direitos.

Tudo isto não basta: o governo precisa enfrentar, em nível superior, a batalha da comunicação, a guerra cultural da extrema-direita, que passa pela regulamentação das chamadas big techs.

Igualmente importante para o campo democrático e progressista, em especial a esquerda, os partidos, os movimentos sociais, é tirar consequências das lições da seiva da vida que jorrou dessas eleições. Entre outras questões, intensificar as capacidades e a eficácia na comunicação digital. Entendê-la como arena indispensável e irrecusável da luta de classes.

Entender as mudanças e as novas demandas e aspirações do povo. E, a partir dessa interpretação, renovar e aumentar os vínculos da esquerda com o povo e a classe trabalhadora nas lutas, nas ruas e nas redes.

Com o fortalecimento da direita, a esquerda e o campo progressista precisam reforçar a unidade na luta, elaborando plataformas de mobilização convergentes, tanto no parlamento quanto na mobilização do povo. A esquerda deve reforçar seu papel como parte mais comprometida e empenhada com o reforço da construção de movimentos de frente ampla desde os munícipios.

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