Dor e razão: não é hora de dourar a derrota, mas é de registrar que as esquerdas não foram esmagadas

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Por Carlos Eduardo Alves, jornalista, para o Bem Blogado

Foi a maior derrota do campo democrático da História do Brasil. Maior que o golpe de 64, a deposição ilegítima de Dilma, a condenação e prisão de Dilma e vários outros passos atrás que a História registra. Foi a primeira vez que a urna legitimou uma vitória fascista em nosso país.




Qualquer conversa honesta sobre resistência ao péssimo que virá exige que se aceite a dura realidade. São perigosas demais, infantis politicamente e cegas para efeitos práticos as tentativas de minimizar o resultado do segundo turno presidencial.

Vamos parar de brincar com o argumento primário, por exemplo, que faz uma conta de chegada somando abstenção, brancos e nulos e votos em Fernando Haddad para dizer que Bolsonaro não teve a maioria dos votos. Se Haddad vencesse com essas condições estaríamos deslegitimando o triunfo do campo democráticos?

Senhores, tenhamos compostura! É enganoso também alguém se gabar do resultado além do razoável do Partido dos Trabalhadores nas eleições para os Parlamentos e governos estaduais. Só surpreendeu os analistas míopes da grande mídia que apostaram num vexame eleitoral do partido de Lula. O PT sobreviveu, e bem, mas diminuiu de tamanho, embora continue sendo a agremiação política mais querida dos brasileiros.

Disputou seu pleito mais difícil, obteve 29% dos votos no primeiro turno e provou que continua ator central na discussão política. Mas foi superado pelo fascismo na disputa principal.

Ainda é muito cedo para apontar as razões para o triunfo de Bolsonaro. Nenhum cientista político ou analista sério tem já as explicações para o resultado final. O tempo vai se encarregar da questão.

A perseguição e a inabilitação eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva jamais poderão deixar de habitar como ponto inicial de qualquer explicação. Afinal, se alguns dizem que foi o antipetismo que acabou prevalecendo, como então Lula, mesmo preso, liderava com imensa folga todas as pesquisas eleitorais, inclusive surrando Bolsonaro em eventual segundo turno? Só um charlatão tem hoje as respostas que explicam o desastre.

Estamos quase todos lambendo as feridas ainda, o que é muito justo depois de uma linda campanha, principalmente no segundo turno, quando setores democráticos se juntaram ao petismo na tentativa de barrar a validação eleitoral das mais bárbaras propostas em todos os campos. Mas a História não para e nos reservou a obrigação de preparar o inevitável enfrentamento com o fascismo temporariamente triunfante.

O leal Guilherme Boulos deu a letra já no domingo à noite, no comovente ato em que Haddad e aliados reconheceram a derrota na urna. Boulos mandou um recado claro: é hora de resistência e ela será formada
por quem vestiu de fato a camisa da candidatura do campo democrático, que era Haddad.

Não cabe exclusivismo nessa luta que interessa a todos que sabem ser inevitável o avanço da reação sobre liberdades e direitos sociais, mas nem pensar em se submeter a quem simplesmente lavou as mãos na hora decisiva.

Sim, precisamos lamentavelmente falar de Ciro Gomes, que se revelou o Ciromisso Gomes. Foi muito feio o papel da família Ferreira Gomes entre 7 e 28 de outubro. Começou com o tiro na testa da frente democrática desferido por Cid Gomes, no momento em que até democratas da direita convencional começavam a engrossar a campanha de Haddad.

E foi simplesmente lastimável o desdém com que Ciro encarou a chance de ser protagonista no enfrentamento a Bolsonaro. A negativa clara de sequer gravar um vídeo de adesão deixou escancarada a aposta em projeto pessoal, desprezando os riscos que a eleição de Bolsonaro representaria às liberdades e aos direitos sociais já mínimos dos mais pobres. A História julgará esse ato menor de Ciromisso.

Mas os democratas, não só os do PT, que participaram da batalha para reverter a as dificuldades terão todo o direito de, já no futuro breve, desconfiarem dos compromissos de quem pensou num incerto 2022 antes de combater a candidatura fascista.

Não é, portanto, hora de dourar a derrota e nem de deixar o registro de que as esquerdas não foram esmagadas. Haverá evidentemente a necessidade de repensar muitas coisas, menos uma: é o momento de resistir ao fascismo em todos os campos: nas ruas, no Parlamento, no cotidiano etc.

A História nos deu um baque, mas a luta dos trabalhadores é feita de momentos difíceis mesmo. Estamos num deles e só a persistência poderá virar o jogo.

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