Dostoiévski, minha avó Maria Dolores e eu

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Conversando com um colega jornalista sobre o autor #FiódorDostoiévski, que completaria 200 anos nesse dia 11 de novembro de 2021, veio a brincadeira sobre o desafio de pronunciar tal nome. Confesso que costumo ter receio de errar na escrita, que alguns preferem Dostoyevsky. Mas, uma certeza eu tenho: sempre é um bom momento para ler ou reler o autor.

Por Adriana do Amaral, compartilhado de Construir Resistência




Se Deus não existe, então tudo é permitido

(Fiódor Dostoiévski, em Imãos Karamazov)

Com o mesmo amigo o comentário sobre “Crime e Castigo”, título do segundo livro, um romance, escrito em 1866. Deveria ser uma regra no Brasil, dois séculos depois, não é mesmo? Só que não…

Quando li Dostoiévski o fiz de “baciada” Um livro após o outro. É claro, uma pequena parte dessa obra tão extensa, importante, universal. Ao falar da psique, dramas, relações humanas em todas as suas dimensões. Literatura essencial e atemporal, que influenciou e influencia pensadores das ciências humanas e sociais.

O Idiota (1869) talvez tenha sido o que mais me impactou, mas Irmãos Karamazov (1881) me remete à história familiar… Aos nomes do nome do meu pai, Ivan, e suas irmãs. Vou contar um pouco mais a respeito complementando este texto…

O primeiro sempre me fez refletir. Sobre a “idiotice” estar relacionada à bondade humana. Sempre me pergunto: quando a palavra idiota virou sinônimo depreciativo? Xingamento, até? O autor nos faz pensar e refletir a respeito.

O segundo explicita as dores e os amores das relações fraternas. no caso pai e filhos. Quem não está passando por isso,  hoje atire a primeira pedra.

Eu, confesso, vivencio o drama das relações familiares permeada nessa crise social atual, onde a política interferiu sobremaneira na dinâmica familiar. Sobrevivemos a essa sociedade distópica como os personagens de Dostoiévski.

Hoje em dia, afastar-se muitas vezes é proteger-se. E não estou remetendo ao #isolamentosocial devido à #pandemia da #Covid-19, mas pelo fenômeno do #bolsonarismo, que também é perigoso e pode ser letal.

Aí vem o terceiro e mais famoso das obras, Crime e Castigo (1866). A leitura nos faz adentrar na mente do personagem. Até quando pode-se justificar um crime? O remorso seria pior do que a pena? Mais uma vez o confronto com a própria mente. Ou melhor, o diálogo que o autor faz com o leitor através da ficção crítica.

Os Demônios (1872) nos lembra que o perigo sempre está à espreita. Afinal, durante toda a história da humanidade, o abuso de poder e as diferenças ideológicas costumam gerar risco de vida, não é mesmo?

Desculpem-me os especialistas, pois sou apenas uma leitora. Não tenho condições de interpretar tal capacidade criativa, reflexiva, literária. Demasiadamente humana. Mas a história pessoal do autor explica a sua obra.

Dostoiévski foi militante no combate ao autoritarismo do poder da época, condenado, mas salvo da morte cumprindo pena de trabalhos forçados na Sibéria. Também, foi jornalista resistente nos periódicos: Tempo, Época, Cidadão.

Minha avó, que nunca conheci, era fã dos russos

Ela morreu muito jovem, trintanos, consequência de um câncer. Deixou meu pai menino, ainda na pequena infância, que não pode se despedir da mãe. Também duas filhas adolescentes e um bebê, batizado de José Maria.

Muitos anos mais tarde recebi a única herança que tenho dela. Talvez a mais nobre: um caderno de recordação com escritos, mensagens e reprodução de textos de colegas do magistério, que estudaram em #Piracicaba no interior de #SãoPaulo, e se formaram em meados do ano de 1919… Um caderno feito a mão, de capa vermelha e páginas iniciais na cor pink, com efeito brilhante.

Chamou-me atenção que nas páginas, professores recém formados, homens e mulheres contam um pouco do tempo vivido, da angústia da finitude de um tempo e anseio pelo que virá e, sobretudo, da dor do despedir-se. Mais tarde, casada e morando em Corrego D’Agulha, ela registrou algumas de suas reflexões. Nas páginas finais, à lápis, o nascimento dos três filhos:

Yvette (1922), Yvonne (1926), Yvan (1929)

Minha avó escreveu sobre Amor e Ódio. Reproduzo aqui:

“Foste mau… e eu demasiadamente louca… demasiado louca… 

Foste mau, mas si tens coração, si tens alma, si tens alguma coisa de bom, coração e alma capazes de sentir, não faça a minh’alma contar o réquiem em funeral de mortais ilusões…

Loly, Corrego da Agulha, 25 de maio de 1930

Estaria ela falando do relacionamento com o meu avô? Sinceramente, acredito que sim.

Teria se inspirado em Dostoiévsky?

“O segredo da existência humana não está apenas em viver,

mas também em saber para que se vive.”

Moscou, 11 de novembro de 1821

São Petersburgo, 9 de fevereiro de 1881

Venham saber mais sobre o universo o autor, a época em que ele viveu, sobre seus livros no #CaféFilosófico, parceria entre a #FPAC – Faculdade Paulista de Comunicação e Construir Resistência.

Serviço

Café Filosófico – Bicentenário de Dostoiévski

Dia 11 de novembro

Horário: 19h30 as 21h

Convidado: Marcelo Hailler Sanchez (Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP, Mestre em Comunicação Social e Semiótica pela PUC-SP, jornalista pela Universidade São Judas-SP)

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