Por Camilo de Oliveira Aggio, compartilhado de Jornal GGN –
Existem muitos fatores que explicam muito disso e, ao contrário de Folha, não acredito que tenha alguma relação com a mudança de tom teatralmente simulada de recuo das investidas autoritária de Bolsonaro.
Tem novo DataFolha na área e fiquei pensando se devia ou não devia comentar, vez que, naturalmente eu vou doar repetitivo e inevitavelmente cair no famigerado “eu disse”. O que posso fazer se disse mesmo?
Jair Bolsonaro bateu seu recorde de popularidade na série histórica do instituto. Saiu de 32% na última pesquisa para 37% nessa. A mudança meses índice de rejeição foi ainda mais expressivo e despencou dez pontos. De 44% a 34%.
No meio de mais de um município de cadáveres produzidos pela COVID-19 graças a um governo que patrocina a morte e com novas e evidentes revelações do envolvimento da família com corrupção, o cara bate seu recorde de popularidade.
O que explica?
Eu já estou me preparando para a cólera que me visitará. Muitos já estão engatilhado o velho e nojento argumento do “estômago” para culpar os de sempre: os pobres. Bolsonaro foi eleito expressivamente pelo apoio dos mais endinheirados, a faixa onde arrancava o maior percentual de votos. Esses não votam com o estômago, mas com a racionalidade (sic!), né? Pobre não raciocina, pobre é levado pela fisiologia.
E aí, amigos e amigas, quando entra o preconceito contra pobre misturado com o preconceito com o Nordeste, temos a síntese da mentalidade preconceituosa sudestina para atribuir culpas.
Bem, mas vamos lá. O argumento é furado, embora já esteja engatilhado.
Houve queda acentuada na rejeição de Jair Bolsonaro no Nordeste. De 52% para 35%. É também no Nordeste que temos o maior número de solicitantes do auxílio emergencial. Mas não sejamos Alexandre Garcia com suas falácias lógicas. Entre os que fizeram o pedido do auxílio emergencial, 42% acham Bolsonaro ótimo ou bom. Isso é um percentual só um pouco acima da média geral. E o mais importante, 36% dos que não fizeram solicitação do auxílio acham a mesma coisa. Percentuais muito próximos.
Mais um pouquinho: o percentual de ótimo/bom cresceu em 3 dos 4 estratos sociais analisados pela pesquisa. Só caiu em um. 6 pontos. Adivinha em qual. No estrato de renda baixa, até 2 salários mínimos.
Ou seja, quem aposta que o tal “coronavaucher” está alavancando a popularidade do cara e reduzindo sua rejeição, cede apenas a uma simplificação interpretativa, ainda que legítima, ou a um preconceito de classe tradicionalmente escroto que não para em pé diante dos dados.
Argumento mais: o aumento da popularidade e queda da rejeição se deu acentuadamente em todo país. Vejam o Sudeste: saiu de 29% para 36%. Rejeição de 47% para 39%. São número de apoio muito mais expressivo do que no Nordeste. No Sul e Norte/Centro Oeste, o cara bate em 42% de aprovação.
Sigamos para a demografia.
O cara teve queda acentuada de rejeição entre os mais jovens. Com curso superior, saiu de 53% para 47%. Entre os mais ricos de 52% para 47%. Os empresários o apoiam ainda mais: saíram de 51% para 58% de ótimo e bom. E entre estudantes, a rejeição saiu de 67% para 56%. 11 pontos de queda. Um tombo super positivo.
Bem, existem muitos fatores que explicam muito disso e, ao contrário de Folha, não acredito que tenha alguma relação com a mudança de tom teatralmente simulada de recuo das investidas autoritária de Bolsonaro.
Eu vou enumerar apenas 5:
1) A pandemia no Brasil acabou. Não factualidade, por óbvio. Estamos batendo recordes de mortes e infectados ainda. A pandemia acabou na percepção pública brasileira. Como avisei, quem apostava que pilhas de corpos detonariam Bolsonaro, apostou alto e menosprezou muito a incapacidade do Brasileiro em exercer a solidariedade e a compaixão.
Igualmente, menosprezou muito a força de Jair Bolsonaro e seu investimento no argumento de que a economia é mais importante e pode matar mais. O bolso de muitos pesou, o governo ajudou a pesar quando podia aliviar, mas conseguiu emplacar a percepção de que a culpa não é dele, mas de governadores e a vida precisa voltar ao normal. As pessoas precisam trabalhar.
2) A chateação dos antigos apoiadores, que fizeram a popularidade de Bolsonaro cair e sua rejeição aumentar, era apensariam chateação. Nada que o tempo não resolva. Briguinha de casal. Bolsonaro é a síntese perfeita da qualidade moral brasileira, principalmente nos estratos socioeconômicos superiores.
3) Bolsonaro é uma questão moral. A afinidade brasileira com Bolsonaro se dá fortemente por conta de seus valores e atitudes. Autoritário, misógino, racista, homofóbico, classista, boquirroto, autêntico, demófobo, punitivista e seletivo. Isso é uma base de sustentação que resiste a abalos sísmicos de grande escala.
4) O jornalismo brasileiro não é anti-Bolsonaro como seria com algum governante à esquerda sem um projeto de desmonte do Estado e garantias a trabalhadores. É regido pela defesa dos interesses quem tem é representa por afinidade. E para mim a constatação é simples e se explica por uma anedota: fosse uma Dilma ou Lula da vida à frente dessa necropolítica face à pandemia, os enquadramentos que estaríamos vendo seriam o de que perderam a capacidade de governar e tira-los era uma questão de saúde pública
5) Há um submundo complexo da comunicação por onde essas pessoas também se informam, conversam, discutem, compartilham experiência, relatos e entendimentos. Pode ter algum grau de influência nesse processo.
Como sempre alertei, sentem-se confortavelmente. Essa viagem vai ser longa.