Cangaço urbano não vai resolver os problemas crônicos de segurança do Rio
Por Edu Carvalho, compartilhado de Projeto Colabora
A cena é a seguinte: são 10h da noite e mais de 15 homens caminham pelas ruas do bairro de Copacabana, munidos de facas, madeiras, pedras e soco-inglês. Alguns entoam gritos de guerra e dizeres de força para “esquentar” o grupo. O motivador? A decisão, por conta própria e em caráter de urgência, de fazer justiça com as próprias mãos, a partir da frequência e visibilidade de roubos e furtos naquela que é a praia mais famosa do país e do mundo.
Na omissão do Estado em chamar na chincha a responsabilidade de promover, com base em inteligência, um plano de segurança não só para a região e sim para todo o Rio, o caos se refunda. Tem novidade? Não.
Sob a tensão promovida pela “onda de violência”, a desconexão com o que a realidade aponta. Os dados de violência armada em Copacabana mostram que, na série histórica geral (2016-23) de baleados/bairro do Grande Rio, Copa está em 45° lugar. E que neste ano, até o momento, figura em 125°. Numa análise rápida sobre os números de tiroteios, a parada também mostra diferença: está em 12° na série histórica e em 51° em 2023.
Tanto quem está nas instituições como a população parecem esquecer do que já viveram. Em 2018, a grita forte por uma ação capaz de coibir roubos e furtos pelo Rio de Janeiro nos fizeram ganhar, de presente, a presença ostensiva das Forças Armadas, em caráter de intervenção militar em que nada fez mudar.
O “caos” em Copacabana é mais do que conhecido por quem mora aqui – e agora vê a multiplicação dos registros pelas redes sociais – não sendo novo o aspecto de insegurança e impotência que faz, da caminhada aparentemente tranquila, a perda de um celular, um cordão, a carteira ou até mesmo, a vida.
Dos perigos tanto da presença em grande escala de agentes de segurança, como civis armados circulando como um novo cangaço, a iminência de um abatedouro que vitima negros sem qualquer relação com os episódios, como o caso de Matheus Almeida, vendedor de balas que foi atacado com socos e pontapés sem qualquer justificativa.
“Sou pai de família, trabalho honestamente. Sou trabalhador, todo mundo sabe. Olha como eu me visto, não sou mendigo, não sou crakudo. Eu saí lá de Santa Cruz, tenho uma filha, uma esposa e preciso levar alimentação para casa. Não preciso roubar nada de ninguém. Meu negócio é trabalhar”, disse em entrevista para o RJ2, da TV Globo.
É a música “Caravanas”, de Chico Buarque. Só que muito pior na vida real.