Por Oswhaldo Rosa, poeta
Gritar já não basta
Chorar é insuficiente
Falar às pedras aos musgos é o que resta
Dê uma olhada para além das paredes
lá fora da caverna
das tramas de sua rede
Uma criança se confunde com a lama
na Faixa de Gaza
e está morta
ferida na alma que esvoaça
entre escombros e fumaça
O que querem que eu cante?
O que querem que eu cante com tanta desgraça?
Mais uma criança tomba
na rampa da imensa senzala
que margeia a maravilhosa cidade dantesca
a cidade garoenta de atrocidades
Foi bala perdida?
Nada.
Bala certeira na pele negra de anjo pobre
O que querem que eu cante?
Desgraça?
Um dedo simula o gatilho
outro corpo se estraçalha
e o estuprador maldito, impune gargalha
Quem sabe a dor do estupro
perde o brilho dos olhos
o riso dos lábios
fica tudo escuro
Que eu cante, o que?
Desgraça?
O som agro das queimadas
me enche de agrura as palavras
Os zunidos cretinos de estampidos
cretam meus versos
infernam os ritmos e timbres de meus passos
Não marcho. Odeio continências e sentidos.
Estou canhestro a lirismos.
Infernizo os ambidestros com seus discursos ambíguos.
Infernizo os divinizados, os salvos, os escolhidos.
Que eu cante?
Há uma explosão pronta a eclodir.
A erupção está prestes a romper o peito
feito feto alienígena e monstrengo
Arranco a máscara de flandres que me ofende e fere
Ah, o ser inteligente criado à imagem e semelhança
infesta o planeta com a pústula purulenta de sua presença
E me vêm com discurso de
Crise climática?
Transtorno de estresse pós-traumático?
Eu cantar?
Olho para a história do ser civilizado…
Suas conquistas (chacinas)
Suas vitórias (genocídios)
Suas glórias (morticínios)
Há um lugar no planeta chamado Matanzas
que é ponto turístico
Há um verbo: dizimar
e o substantivo: dízimo