Por Joel Santos Guimarães e Paula Quental, Blog Solidare –
São Paulo – Além de ser a principal ferramenta de fomento e financiamento dos mais de 30 mil empreendimentos solidários urbanos e rurais que atuam em vários setores da economia brasileira, os bancos comunitários e suas moedas sociais, na prática, implantaram um sistema financeiro social no País. Quem afirma é o Secretário Nacional de Economia Solidária (Senaes), o economista e sociólogo Paul Singer.
“Este sistema atua onde os bancos tradicionais não entram, pois ignoram os pobres, os desempregados e os trabalhadores de modo geral”, afirma, em entrevista ao Solidare.
Segundo o professor, é imensa a importância dos bancos solidários para as populações mais pobres, as quais, organizadas em cooperativas ou associações, passam a se tornar sujeito dos seus próprios destinos.
Com o apoio desses bancos, melhoram suas rendas, a qualidade de vida e contribuem para o desenvolvimento econômico dos municípios onde estão instaladas.
AUTOGESTÃO
De acordo com Singer, “os bancos comunitários são filhos diretos da economia solidária e, embora autorizados pelo Banco Central, não estão ligados ao sistema financeiro tradicional, por opção deles”.
O titular da Senaes explica que os bancos comunitários são uma prática de autogestão da comunidade em que atuam e para a qual criam uma moeda social, que circula apenas naquela região. Isso significa que os comerciantes e os moradores trocam o real pelo papel local, que pode ser usado normalmente para pagar bens e serviços. Todas as moedas sociais são lastreadas em reais.
“Como os comerciantes são inteligentes, eles aceitam a moeda social e ainda dão desconto para os compradores. Não é grande coisa, de 2% a 5%, mas para gente pobre isso faz diferença. Resultado: vão comprar lá, que vão pagar mais barato. Até posto de gasolina dá desconto e aceita a moeda social”, conta Singer.
O uso da moeda social exige que o dinheiro seja ganho e gasto ali na região, por isso, de acordo com o professor, “o banco comunitário é uma ferramenta de desenvolvimento local nas áreas mais pobres desse País. Há filas de prefeitos querendo instalar um banco comunitário em seus municípios”.
De fato, dados da Rede Brasileira de Bancos Comunitários (RBD) revelam que, nos últimos cinco anos, o número de bancos comunitários com moedas próprias vem se expandindo em várias partes do País: em 2009, havia 51 instituições e, no ano passado, o número chegou a 104. Um crescimento superior a 100%.
De acordo com a RBD, nesse mesmo período, a renda dessa população mais pobre, em algumas regiões, aumentou em até 40%.
FOMENTANDO A ECONOMIA SOLIDÁRIA
Paul Singer conta que o banco comunitário, além de emitir a moeda e atender à população do bairro, faz empréstimos para cooperativas e iniciativas de economia solidária em moeda social com juro zero. Só é proibido de aceitar depósitos, porque não está sob fiscalização do Banco Central.
“É, portanto, a grande ferramenta de insumo e financiamento para a economia solidária, constituindo-se, na prática, em um sistema financeiro social”.
Segundo ele, hoje no Brasil, o banco comunitário tem papel correspondente ao da Caixa Econômica Federal. A CEF é a entidade que distribui os benefícios do Programa Bolsa Família.
“Essas milhões de famílias que recebem o benefício vão buscar o seu dinheiro no banco comunitário. Se elas desempenham alguma atividade e precisam de crédito, elas recebem o crédito sem juros na moeda social. Tudo isso somado significa desenvolvimento”, afirma o titular da Senaes.
Segundo Singer, os bancos comunitários têm uma linha de crédito que se chama crédito solidário, que é quando “banco comunitário empresta a famílias, seja porque a mãe ficou doente ou porque sofreu um acidente ou perdeu o emprego. São famílias que estão precisando mesmo”.
Ele lembra que, curiosamente, o comitê de crédito de um banco comunitário quase sempre é composto por mulheres. “Acho que não é acaso, pois elas entendem da economia doméstica e sabem administrar suas casas”.
No entender de Paul Singer, a economia solidária, no médio prazo, será “a porta de saída do Bolsa Família”. Ele entende que os trabalhadores e trabalhadoras do Bolsa Família que se filiarem a algum empreendimento de economia solidária deixarão de se enquadrar nas condições socioeconômicas dos beneficiários do programa.
Segundo ele, uma grande parte dos empreendimentos econômicos solidários é formada por mulheres, o que demonstra como elas são vitais para a atividade:
“A importância das mulheres para a economia solidária é muito grande porque elas são muito dedicadas, criativas e militantes, o que atribuo ao fato de que elas são oprimidas por nós, machos. Sua luta por igualdade e liberdade beneficia a todos outros oprimidos também”, conclui.
Fotos: Maracanã, moeda social usada no banco Jaçanã, no Ceará, professor Paul Singer e Capivari, moeda social da cidade de Silva Jardim, no Rio de Janeiro.