Por Luis Nassif, Jornal GGN –
Não é apenas o extremado conservadorismo que se abateu sobre a imprensa brasileira. É a total perda de referencial sobre o papel da imprensa e mesmo sobre o negócio imprensa.
Nos países civilizados, da mídia mais à direita àquela mais à esquerda, uma característica recorrente é a denúncia das arbitrariedades do Estado. É um fator que legitima a imprensa até para que possa dar seguimento a campanhas anti-direitos-sociais.
Ser contra direitos sociais é questão ideológica, só perceptível aos leitores mais sofisticados.
Solidarizar-se com famílias, jovens, idosos, crianças, mulheres, sendo atacados por uma PM violenta, é qualidade universal de caráter, assim como a generosidade, a solidariedade, a defesa dos mais fracos. É o chamado “belo gesto”, que provoca admiração até nos adversários e fortalece a imprensa até nas suas bandeiras anti-sociais. É como Ali segurando o último soco contra Foreman, como Sobral Pinto defendendo os adversários ideológicos, como Pedro Aleixo insurgindo-se contra o arbítrio. E como Ruy Mesquita acompanhando seus jornalistas quando eram detidos pelo DOI-CODI.
Diretor de redação do Estadão e da Folha, Cláudio Abramo cunhou uma frase célebre: “O jornalismo é o exercício diário do caráter”.
Nos anos 80, Otávio Frias de Oliveira descobriu que a generosidade, o endosso às boas bandeiras – diretas, liberdades civis – era um belo negócio. Ousou e conseguiu transformar a Folha no jornal mais influente do país. A Folha não tinha apenas leitores, tinha apaixonados, por conseguir assimilar vários valores da nova geração que ascendia: inquietação, destemor, nova linguagem, modernidade, estilo descolado, provocativo, liberdade. E Frias fez tudo isso como estratégia comercial.
Entre os grupos de mídia, os estrangeiros – El Pais, BBC, Reuters – estão dando aulas de jornalismo aos nacionais, indo atrás dos fatos, impedindo a disseminação da “verdade oficial” e indignando-se com o arbítrio.
Quem está com saudades do jornalismo, confira a reportagem de El Pais: “Milhares vão às ruas contra Temer em SP e PM reprime ato com justificativa controversa”( http://migre.me/uUmFE)”.
Tendo como compromisso a fidelidade aos fatos, o jornal junta relatos de 6 jornalistas para mostrar que havia uma manifestação pacífica, com famílias participando, que a manifestação seguiu em perfeita ordem até o Largo da Batata. E lá explodiu a confusão por provocação direta da Polícia Militar.
“Imagens de uma vidraça quebrada em um estabelecimento na Largo da Batata, divulgada pela Globo News, explicaria mais tarde o que a PM procurou justificar. Mas, os seis jornalistas do EL PAÍS que seguiram a marcha dos manifestantes em distintos pontos do percurso não presenciaram nenhum ato de vandalismo, o que não deixa claro se a tal vidraça quebrada foi uma reação posterior à violência policial. Outras dezessete pessoas que estavam no protesto relataram, por rede social, também não ter visto nada que pudesse ser considerado “vandalismo”.
Às 22h45, a Secretaria de Segurança do Estado divulgou uma nota alegando que houve um princípio de tumulto na estação, que “se transformou em depredação. Vândalos quebrando catracas, colocando em risco a vida de funcionários”. A repórter Marina Novaes se encontrava no local na hora das bombas e não viu nenhuma catraca depredada. Mais tarde, a ViaQuatro, concessionária responsável pela estação Faria Lima, disse que a confusão resultou em uma lixeira, uma luminária e uma catraca quebrada. O que também não deixa claro se esses prejuízos foram provocados após as bombas terem sido atiradas”.
Enquanto isto, na Folha, que estimulou a violência da PM com um editorial exigindo ordem, colunista fala em “elite vermelha” e diz que Dilma insufla o ódio nas ruas e vai morar em Ipanema (http://migre.me/uUmJs).