Quando faltam palavras à língua
Por Enio Squeff, jornalista, escritor e artista plástico
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O meu respeito à língua portuguesa, não se dá como preito ao que lhe devo por ter sido jornalista por trinta anos. Fernando Pessoa diz certo quando proclama a sua língua o devido a sua pátria. Acabo de concluir a ilustração de “Os Lusíadas” e não sei se devo ao editor só a fidelidade ao que diz o poema para as ilustrações, mas à palavra escrita de Camões. E se me valho da consideração de Eça de Queirós de que “ninguém está ao abrigo das silabadas” para justificar as minhas, há um aspecto que a língua portuguesa ainda não me respondeu: o conceito exato para definir, à feição, tanto o Bozo, quanto os seus seguidores.
Existem os palavrões que fazem dos filhos os responsáveis pelas suas mães – o que é uma estupidez – e os impropérios normais, como patife, canalha, etc etc. Neste ponto, perdoem-me os castiços, a língua portuguesa é pobre: não diz o que os bolsonaristas são.
Genocidas e assassinos são xingamentos válidos, assim como imbecis, idiotas, malucos e quejandos. Mas dizem do misto de malícia, ignorância ou deliberado desejo de morte – tanatófilos, então – mas que não são exatos, e não porque não definam o que são, mas porque no meio do caminho há a pandemia: sempre alguém lembrará que não foi o governo que a inventou, o que é verdade. E que a inexistência, por exemplo, de vacinas para todos brasileiros, devemo-la mais à incompetência de um general (mais um), do que ao governo como um todo.
É claro que se a isso somarmos o golpe, sempre à espreita desde as casernas, tudo fica maiúsculo. E não adianta dizer aos excelentíssimos oficiais generais que não existe na história um só exemplo de país governado por exércitos que sejam ou que tenham sido exemplos de nações decentes.
Não adianta recorrer a Stálin, por exemplo. Ele venceu uma guerra ao preço estúpido de mais de vinte milhões de mortos que não se devem de modo algum só aos nazistas. Mas não foi militar.
O próprio Hitler e Mussolini não eram militares. E se a eles contrapormos Franco ou Pinochet, dois milicos, o único que se pode responder é que foram cruéis enquanto duraram. Hoje são abominados apesar dos saudosistas – esses também inqualificáveis pelo que querem e esperam.
A verdade é que os negacionistas de tudo, principalmente os brasileiros, só acumulam bobagens: quando Olavo de Carvalho nega a Lei da Relatividade, está na cara que ele não a entende, assim como ofende os verdadeiros filósofos quando se proclama que tal.
Quanto à planura da terra, ela é igual à quadratura do círculo e assusta que alguns generais, tais como o trêfego Villas Bôas (sim, o escrivão inventou um circunflexo sobre o “Boas”) para citar um, ainda ponham fé no Rasputin de Virgínia (sem ofensas ao maluco russo que pelo menos se julgava e era creditado como milagreiro).
Se vivemos numa pandemia de peste e de inteligência, pouquíssimo a retrucar. Falta-nos a palavra exata na nossa bela língua.
E aí voltamos ao início: como convencer, digamos, a um direitista construído pela grande imprensa, que ele errou feio ao apostar no capitão? Ou no Capetão , isto é, num capeta grande?
Aí, então, perdoem-me os crentes fiéis à língua não só de Camões, mas também de Saramago de Machado de Assis e de outros: é chover no molhado.
Há pouco recebi xingamentos de vários votantes no homem: leram o meu “Diálogo”* que consta dos meus escritos no facebook, e choveram ilações de que sou maluco, como posso eu criticar um homem probo, tão cioso da saúde do seu povo, quanto o sujeito que mora no Planalto?
Não respondi a nenhum deles: são tão cônscios em sua fé no B. que me proibiram de fazê-lo. E fé, de fato, não se discute.
Mas me ficou a inquirição: como classificar essa gente que troca a sua liberdade por um maluco que a todo o momento se mostra um déspota idiota? Confesso que pela primeira vez comecei a entender Hitler e a Alemanha nazista.
Assim sendo, peço aos poucos fiéis amigos que me leem que me sugiram uma palavra para definir o homem e seus seguidores.
A minha última esperança, confesso, é que o termo “bolsonarista” entre no dicionário como adjetivo. Quem sabe ele alcance o que eu e muitos querem dizer de uma pessoa malquista, imbecil, idiota e assim por diante.
*Aqui o texto a que se refere Enio Squeff:
Imagem da capa:
Camões | Enio Squeff, 2020, escultura em bronze, 30x30x24 cm (altura x largura x profundidade)