Entrevista de Lula: Globo foi antiética e ofensiva

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Por Luis Felipe Miguel, cientista político

“Eu não assisto ao Fantástico, então fui procurar na internet a entrevista que Lula deu a Sônia Bridi.




Foi um gesto de propaganda, para mostrar que Lula continua mentalmente saudável. Mas foi também uma enorme concessão: depois de cirurgias daquela monta, o presidente da República concede uma exclusiva para uma emissora de televisão!

Daí, o golpe baixo. Se fosse para contestar o entrevistado – e o jornalismo brasileiro devia mesmo “apertar” mais, em vez de se limitar a registrar declarações – que o fizesse diante dele, permitindo réplica.

E mesmo que quisesse apresentar outra versão, que o fizesse depois, não no meio da entrevista.

Não foi apenas inusual. Foi antiético e ofensivo.

Com a manobra, a Globo persegue dois objetivos. O primeiro é afirmar sua autoridade, algo que se tornou importante para o jornalismo desde que está ameaçado pelos novos circuitos de disseminação de informação, mas que, para a “Vênus platinada” (lembram?), é ainda mais importante.

As “sabatinas” com candidatos no Jornal Nacional servem de exemplo. William Bonner não age como jornalista, mas como mestre-escola, cobrando as respostas “certas” – não por acaso, aquelas que favorecem o sistema financeiro, o agronegócio, os ricos em geral.

Mas quando Bolsonaro esteve lá, em 2018 e 2022, mentiu à vontade, sem ser confrontado: sobre o pretenso “kit gay” nas escolas, sobre combate à Covid, sobre tudo.

O que me leva ao segundo objetivo da Globo: mostrar a Lula que tem poder. Que não se arrepende de sua participação na conspiração Lava Jato, que pode retomar sua parceria com algum novo Sergio Moro, que o governo não pode sair da linha ou será atropelado.

É que a Globo não gosta de Bolsonaro – truculento, de maus bofes e, pior, assanhado pro lado de seus concorrentes, na Record e SBT. Mas considera pior ainda um Lula que governe um pouquinho mais à esquerda.

Todo mundo sabe disso. Por isso, ter feito essa deferência, ter concedido a entrevista, foi um baita amadorismo.

E a repórter? Embora Sônia Bridi tenha sido minha contemporânea na universidade, eu não a conheço.

Mas, se ela não participou da tramoia, devia ter se manifestado de público – e esperado as reações da empresa. Não é uma anônima, sem nome a zelar, nem tampouco alguém sem outras opções de trabalho.

Dignidade não é tudo, ao contrário do clichê. Mas é muita coisa.”

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