Por Miguel do Rosário, para O Tijolaço –
Quem não conhece a história, ignora essa faceta das ditaduras.
O arbítrio não conhece limites, e neste sentido, é até “democrático”: ceifa a liberdade de pobres, classe média e ricos.
Quando os valores fundamentais da democracia são destruídos em nome do arbítrio, todos são vítimas.
Aliás, sabe-se que a classe média brasileira apenas se convenceu de que o regime militar era a barbárie quando os seus filhos, bem nascidos e bem educados, começaram a morrer nas masmorras do Estado.
Da mesma forma, grandes empresários que não conseguiram aliados no centro do poder militar tiveram seus bens confiscados.
Foi o caso, por exemplo, da TV Excelsior, uma das primeiras iniciativas privadas na área da TV e do entretenimento.
Não tinha aliados na ditadura, ao contrário da Globo. E morreu.
A nossa ditadura apareceu justamente na época do aparecimento e da consolidação da TV no Brasil, e por isso não permitiu que surgissem iniciativas locais, e que a formação da nossa indústria audiovisual se desse sob os auspícios de um regime democrático, cioso de sua pluralidade política.
Hoje vemos o resultado dessa aberração.
A nossa imprensa ainda conserva os valores brutais da ditadura.
Programas policiais vespertinos prezam a violência policial. Uma apresentadora elogiou, há pouco, o justiçamento de jovens contra um menino negro, num bairro rico do Rio de Janeiro.
Os movimentos sociais são sistematicamente criminalizados por nossas principais emissoras de TV.
Para completar o quadro, só faltava a demagogia fascista.
Tortura-se e desumaniza-se executivos de empreiteiras, tratados como “judeus ricos” do tempo do nazismo.
Joga-se a opinião pública contra eles.
É fácil fazer a cabeça da classe média sofrida e trabalhadora contra meia dúzia de ricaços.
E o mais estarrecedor é ver isso acontecer sob o véu democrático.
Confirmando a teoria de que o Brasil não é um país para amadores, nos deparamos com os preparativos de um golpe articulado por uma astúcia maligna e mentirosa, de um lado, e pela total falta de escrúpulos legalistas, de outro.
De comum com outros golpes que vivemos, a manipulação da opinião pública.
Contra esse tipo insidioso de golpe, só posso antepor a sabedoria popular.
Bezerra da Silva imortalizou, numa de suas músicas, um refrão das favelas: “eu já disse a você que malandro demais, vira bicho”.
Vira bicho, na gíria, significa virar bandido.
A nossa mídia e os setores do Estado cooptados por ela, se acham espertos demais.
Mas estão cometendo uma série de ilegalidades, que serão cobradas um dia.
Há mais de dez anos que setores do Judiciário e do Ministério Público vem aumentando suas apostas na impunidade garantida pela mídia.
Estão forçando a barra.
Fazem isso num momento em que também cresce o número de pessoas que não se deixa enganar pela mídia.
Que vê, claramente, a sucessão de arbítrios que estão sendo cometidos.
Que aguardam, ansiosamente, com esse tipo de ansiedade que constitui, em verdade, o mais poderoso tribunal de todos, porque fundamentado no longo prazo, que aguardam enfim que a verdadeira justiça, não a justiça contingente e corrupta dos homens, mas a justiça pura da história, a hora em que esses bandidos fantasiados de justiceiros pagarão por suas covardias e seus arbítrios.
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Reproduzo abaixo um texto publicado há pouco no site Brasil 247.
JUDICIÁRIO E MÍDIA PODEM TORTURAR UM CIDADÃO?
Retratado na Operação Lava Jato como “chefe do clube” das empreiteiras, o empresário Ricardo Pessoa, preso há mais de três meses sem qualquer condenação, vem sendo praticamente torturado em Curitiba; neste fim de semana, a revista Veja, da Editora Abril, explicitou seu jogo, revelando o que ele deve falar para conquistar sua liberdade: basta incriminar o PT, transformando em ilegais suas doações legais de campanha; no entanto, poucos sabem quem é este empresário que, em pouco tempo, fez da UTC uma das empresas mais admiradas do País no setor de engenharia; pelo Valor Econômico, foi eleita pela oitava vez como a melhor em gestão de pessoas; no ranking da engenharia brasileira foi apontada como a melhor em construção mecânica e elétrica; concessionário do aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP), duplicou o terminal que passou a ser considerado o melhor do País; e mais: ao contrário do que muitos imaginam, não depositou recursos na conta do doleiro Alberto Youssef; é este empresário que está sendo submetido à pressão máxima numa estratégia política que visa o impeachment da presidente Dilma Rousseff e, ainda, inviabilizar a eventual volta de Lula em 2018
22 DE FEVEREIRO DE 2015 ÀS 07:29
247 – Quem é Ricardo Pessoa, sócio da UTC Engenharia e capa da revista Veja desta semana?
A julgar pelo que se lê na imprensa tradicional, Pessoa é o “chefe do clube” das empreiteiras. A alcunha lhe foi dada por um delator: o executivo Augusto Mendonça, da Toyo Setal, que, coincidência ou não, é um concorrente da UTC que, ao acusar seu rival, conquistou a liberdade.
Provas, para que provas? “Chefe do clube” foi um apelido que serviu à tese da criação do cartel, como se uma empreiteira de porte médio pudesse chefiar empresas muito maiores, como Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez. Outro detalhe “irrelevante”: ao contrário do que muitos imaginam, a UTC nem sequer participa das obras da polêmica Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Ou seja: o “chefe do clube” não entrou na maior obra da Petrobras nos últimos anos.
Pela mídia, Ricardo Pessoa já foi condenado e está sendo submetido à mais torpe das torturas. Desumanizado, ele representa a esperança de setores da oposição para que se alcance aquele que parece ser o objetivo político da Operação Lava Jato: recolher elementos para subsidiar um eventual impeachment da presidente Dilma Rousseff e inviabilizar a volta do ex-presidente Lula, em 2018.
O jogo se tornou explícito neste fim de semana, com a capa de Veja. Na chamada, onde se lê “O que Ricardo Pessoa, da UTC, preso em Curitiba, quer contar sobre a Lava-Jato”, deveria estar escrita outra mensagem: “O que nós, da Editora Abril e da oposição, queremos ouvir em sua delação premiada”.
O que se busca nessa eventual delação é muito simples: a confissão de um empreiteiro, que diga que as doações legais foram “propina”. Assim, o que hoje a lei permite, seria transformado em crime. É uma armação tão escancarada, que mereceu uma nota de repúdio do tesoureiro da campanha presidencial de Dilma em 2014, deputado Edinho Silva (PT-SP).
“O deputado denuncia e repudia a tentativa da revista Veja de, a qualquer custo, vincular a campanha da presidenta Dilma às investigações efetuadas na Petrobras, chegando à tentativa de criminalizar doações legais. Sem qualquer fundamento coloca em suspeição as contas de campanha já auditadas e aprovadas pelo órgão máximo da Justiça Eleitoral desse país”, diz ele.
O que é a UTC
Numa reportagem deste domingo da Folha de S. Paulo, relata-se a rotina dos presos em Curitiba. Estão em celas escuras, com uma única latrina e sem privacidade, onde quatro pessoas dividem o espaço. Comem com a mão. E só recentemente conseguiram autorização para ler jornais e revistas. Antes que se esqueça, nenhum deles foi condenado. Todos, embora tenham bons antecedentes criminais, estão presos preventivamente. Perderam a presunção de inocência e o direito de responder em liberdade – que, se ainda não tiverem sido revogadas pela Lava Jato, são cláusulas pétreas da Constituição Brasileira.
Na semana passada, Ricardo Pessoa teve sua prisão preventiva prorrogada pelo juiz Sergio Moro. O motivo foi a suposta tentativa de interferência política no processo, decorrente do encontro entre o ministro da Justiça e o advogado Sergio Renault, sócio de um escritório de advocacia que atua para a UTC. Na prática, Pessoa foi punido pela interpretação da conduta que se fez de um advogado quem nem sequer lhe representa – seu advogado, no mesmo escritório, é Ramiro Tojal.
Tratado como bandido de alta periculosidade, ele conseguiu feitos notáveis para sua empresa nos últimos anos. No fim do ano passado, a UTC foi eleita, pelo Valor Econômico, como a melhor empresa na gestão de pessoas, pelo oitavo ano consecutivo, na categoria de 8 mil a 16 mil funcionários.
No Ranking da Engenharia Brasileira, foi apontada como a melhor empresa do País em “Construção Mecânica e Elétrica”. Além disso, concessionário do Aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP), Pessoa conduziu o processo de duplicação do terminal, que foi apontado pelos passageiros como o melhor do Brasil. Outra conquista recente foi a compra da Constran, que pertenceu ao lendário empreiteiro Olacyr de Moraes.
Encarcerado em Curitiba, Pessoa é hoje um homem fragilizado. Sob tortura, vê tudo o que construiu nos últimos anos sob ameaça de desmoronamento. Na semana passada, na primeira denúncia do Ministério Público contra as empreiteiras investigadas na Lava Jato, em que se pede uma indenização de R$ 4,47 bilhões, a UTC Engenharia, justamente a empresa do “chefe do clube”, ficou de fora. Talvez, num sinal para que Pessoa se renda e faça a tão ansiada delação premiada – olha só o que pode fizemos com seus amigos…
Se Pessoa irá se render ou não às pressões da força-tarefa da Lava Jato ou da revista Veja, que o ameaça antecipando uma sentença de prisão de 180 anos, só o tempo dirá. Como qualquer indivíduo, o “chefe do clube” é um ser humano, com seus medos e fraquezas, que vem sendo testado ao extremo.
Suas doações de campanha foram feitas dentro da legalidade, seu crescimento empresarial é reconhecido por publicações especializadas, e até mesmo a acusação que pesa contra ele é frágil. Pessoa, ao contrário do que muitos imaginam, não deu recursos ao doleiro Alberto Youssef. Ele recebeu dinheiro do doleiro, que pretendia, em parceria com o empreiteiro, construir empreendimentos legais. Foi assim, por exemplo, que Pessoa construiu um hotel em parceria com Youssef na Bahia.
Se isso é crime, do mesmo delito também se deve acusar a empresária Chieko Aoki, do Blue Tree, e a própria CNBB. Sim, a igreja católica fez um hotel em parceria com Youssef na cidade de Aparecida, em São Paulo.
Ao contrário do que diz a mídia, que não revela sua espúria agenda política, Ricardo Pessoa não é um homem-bomba. É um ser humano, que está prestes a explodir porque está sendo torturado e ameaçado de ver tudo o que construiu nos últimos anos ser destruído pela Judiciário e por setores da imprensa. Apenas isso.