Estagflação, um efeito colateral do coronavírus

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Restrições para evitar a nova epidemia ameaçam cadeia mundial de suprimentos

Moradores fazem fila em Hong Kong para comprar máscaras faciais de proteção contra o coronavírus. Foto Anthony Wallace/AFP
Moradores fazem fila em Hong Kong para comprar máscaras faciais de proteção contra o coronavírus. Foto Anthony Wallace/AFP

(Chusu He*) – Enquanto os cientistas correm para criar um antídoto que combata o coronavírus covid-19, um diagnóstico sombrio paira sobre a economia chinesa. Existe um risco concreto de que os efeitos da epidemia sobre as cadeias produtivas levem o país à estagflação – baixo crescimento e inflação em alta -, doença para a qual tampouco os economistas têm vacina. Ainda não há políticas monetárias ou fiscais eficazes para combatê-la.

A incerteza, agravada pela guerra comercial China-EUA, forçará empresas pelo mundo todo a repensar sua dependência de fornecedores chineses. Não será surpresa nenhuma ver países rivais desenvolvendo centros de fornecimento à economia global do tipo que Pequim criou, até agora com muito sucesso.




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É possível que a própria China e o resto do mundo tenham subestimado o impacto do covid-19. Imagine: o lançamento do próximo smartphone da Apple, previsto para março deste ano, pode ser adiado. Os bloqueios de cidades chinesas e as restrições às viagens atingem a cadeia mundial de suprimentos da indústria. Desde grandes fabricantes de automóveis sul-coreanos, como Hyundai e Kia, a pequenas empresas de tecnologia nos EUA, como a Agilian Technology.

Uma pesquisa da Academia Chinesa de Ciência Sociais, publicada dia 1º, constatou que 43,9% dos empresários consultados admitem prejuízo no próximo ano. Não demorará muito para problemas de liquidez levarem muitas empresas, principalmente as menores, à beira da insolvência. Apenas 9% dos ouvidos arriscam dizer que sobreviverão a um mês de operações suspensas; dois terços creem que suportarão uma paralisação de duas semanas.

Trabalhadores esperam enquanto os funcionários verificam sua temperatura antes de entrar em uma empresa em Wuxi, leste da China. Foto Xinhua/JI Chunpeng
Trabalhadores esperam enquanto os funcionários verificam sua temperatura antes de entrar em uma empresa em Wuxi, leste da China. Foto Xinhua/JI Chunpeng

Muitas fábricas não podem retomar as atividades porque não conseguem matéria-prima e sua força de trabalho está em quarentena. Os problemas são de todos os tipos: com pedidos, salários, fluxo de caixa, entregas, pagamentos de dívidas, logística e transporte. Muitos estão sujeitos a multas por violar contratos. Outras são obrigadas a suspender operações por ordem de governos locais. Das 29.814 empresas que tentaram voltar ao trabalho em Hangzhou, capital da província de Zhejiang, apenas 162 tiveram autorização até o último dia 10. Firmas menores não conseguem comprar máscaras para os funcionários.

Alguns fabricantes, como a Foxconn, principal fornecedora da Apple, retomam as atividades em fases, mas precisam de tempo para voltar à capacidade total porque apenas os funcionários locais podem retornar imediatamente. Os que viajam de outros lugares precisam se isolar de sete a 14 dias.

Mais de 80 cidades entraram em confinamento, incluindo áreas inteiras de cinco províncias – Hubei (onde fica o epicentro do covid-19, a cidade de Wuhan), Liaoning, Jiangxi, An’hui e Mongólia Interior, além das quatro principais cidades de Zhejiang, afetando mais de 275 milhões de pessoas.

Mais de 80 cidades entraram em confinamento, incluindo áreas inteiras de cinco províncias – Hubei (onde fica o epicentro do covid-19, a cidade de Wuhan), Liaoning, Jiangxi, An’hui e Mongólia Interior, além das quatro principais cidades de Zhejiang, afetando mais de 275 milhões de pessoas. Pequim e Xangai aumentaram as restrições aos deslocamentos de pessoas.

Durante o feriado do Ano Novo (iniciado em 25 de janeiro), o movimento de passageiros em transporte público interurbano atingiu apenas 60% do registrado em 2019. A Xibei, com 350 restaurantes e receita anual equivalente a US$ 817 milhões, teve uma queda de 87% em sua receita durante o período de férias em relação ao ano anterior. É enorme o contraste com o ano anterior, quando os negócios em turismo, varejo e refeições cresceram 8% durante o Ano Novo.

A taxa anual de inflação em janeiro subiu a 5,4%, a maior desde outubro de 2011. Durante a epidemia de Sars, em 2003, a inflação também se elevou, mas caiu rapidamente. Isto pode não acontecer agora porque tanto a oferta quanto a demanda estão em baixa, mas a oferta está descendo mais rapidamente. O nível de otimismo entre os empresários do país, medido pelo Índice dos Gerentes de Compras, está em 50%, menor nível dos últimos meses.

Para conter a crise, o governo adotou uma série de medidas, incluindo empréstimos com juros mais baixos, alongamento de dívidas, renúncia fiscal e uma injeção do equivalente a US$ 28 bilhões no mercado financeiro, para manter a liquidez. Elas aliviarão as tensões financeiras, mas provavelmente não os problemas subjacentes no setor produtivo.

*Professora de finanças na Universidade de Coventry, Grã-Bretanha

(Tradução: Trajano de Moraes)

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