Estudo inédito da UFRJ aponta as principais “fake news” sobre a tragédia da chuva no RS

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Levantamento avalia como os conteúdos falsos atrapalham os trabalhos de assistência às vítimas e são utilizados por personalidades que buscam lucrar com o desastre e obter engajamento político

Por RODRIGO LOPES, compartilhado de Gaucha AZ




Tiago Barbosa / Prefeitura de Cachoeirinha / Divulgação
Mentiras e boatos podem prejudicar ajudaTiago Barbosa / Prefeitura de Cachoeirinha / Divulgação

Uma pesquisa do Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) mapeou oito principais narrativas de desinformação (“fake news”) em redes sociais, durante a tragédia das chuvas no Rio Grande do Sul. 

Coordenado pelos pesquisadores Débora Salles e R. Marie Santini, o estudo aponta como os conteúdos atrapalham os trabalhos de assistência às vítimas e são utilizados por personalidades que buscam lucrar com o desastre e obter engajamento político.

Os métodos de análise utilizados são mapeamento qualitativo de influenciadores e narrativas de desinformação multiplataforma e rasagem e análise manual de anúncios sensíveis e não-sensíveis no Meta Ads (plataforma de anúncios digitais da empresa dona do Facebook e Instagram).

A professora Marie Santini destaca que, em três dias de amostragem de conteúdo, foi encontrado um volume muito alto de desinformação.

– Percebemos as narrativas dominantes em geral são produzidas por influenciadores com grande número de seguidores e capacidade de angariar engajamento, que conseguem disseminar rapidamente uma narrativa qualquer, com um clique apenas. Eles têm grande conhecimento de como explorar emoções negativas e entendem a lógica da rede – avalia a pesquisadora.

Marie destaca que, além da desinformação, foram detectados  351 golpes durante a tragédia. 

– As pessoas pensam que a desinformação é só política. Mas os golpes mostram que há também prejuízo econômico. As plataformas estão ganhando dinheiro com isso, não estão checando os anunciantes. E de como o tragédia pode ser manipulada para fins políticos e econômicos – explica.

Entre os principais resultados, o estudo concluiu que durante a tragédia, “influenciadores, sites e políticos de extrema direita têm utilizado a comoção para se autopromover e espalhar desinformação, com o intuito de atacar e descredibilizar o governo”. As narrativas, conforme o levantamento, buscam afirmar que a resposta governamental tem sido insuficiente, negar as relações entre os eventos extremos e as mudanças climáticas, inserir a tragédia nas pautas morais e em teorias de conspiração, inflar o papel de seus aliados na resposta à crise; e se beneficiar do desastre por meio da autopromoção, pedidos de doação e fraudes.

O estudo aponta oito principais narrativas de desinformação sobre a catástrofe climática identificadas nas diferentes plataformas monitoradas. São elas:


1 Lula não está comprometido com as vítimas das enchentes.

O que diz o estudo: além de acusações de que o presidente não enviou recursos, outros conteúdos destacam uma fala de Lula sobre estar torcendo para times gaúchos, ao desembarcar na Base Aérea de Santa Maria após a tragédia. A declaração foi descontextualizada para alegar negligência. Outra distorção envolveu suposta recusa da ajuda do Uruguai pelo governo federal. A Secom desmentiu que houve recusa.


2 Marina insiste em culpar Bolsonaro por tragédia.

O que diz o estudo: em entrevista a CNN Bra´il, a ministra Maria Silva disse que houve “um apagão” nas políticas ambientais durante o governo de Jair Bolsonaro. A declaração se tornou alvo de ataques e mobilizou a defesa do ex-presidente. Em meio a isso, os conteúdos também direcionam os ataques contra o atual governo, alegando suposta falta de compromisso com o direcionamento de recursos e despreocupação com a população atingida.


3 Starlink é a única internet que está ajudando nos resgates.

O que diz o estudo: plataformas buscam exaltar a atuação de Elon Musk, enquanto atacam a esquerda e o PSOL por suas ações de enfrentamento à empresa em outros contextos.

4 Show da Madonna recebeu recursos que deveriam ir pro RS.

O que diz o estudo: algumas publicações afirmam falsamente que o evento no Rio de Janeiro teria recebido investimentos públicos federais que poderiam ter sido destinados às vítimas das chuvas. Outras publicações dizem que Lula e a primeira-dama Janja teriam comparecido ao show. A afirmação foi desmentida.


5 Governo está impedindo que doações cheguem às vítimas.

O que diz o estudo: segundo alguns dos conteúdos falsos, a Polícia Rodoviária Federal estaria exigindo nota fiscal para deixar as doações passarem, enquanto o Exército não teria disponibilizado aeronaves. A Anvisa também é apontada como responsável pela retenção de medicamentos, o que a agência nega.


6 As chuvas são um castigo de Deus.

O que diz o estudo: usuários cristãos argumentam que o Rio Grande do Sul possui grande número de seguidores de religiões de matriz africana, e, por isso, Deus estaria punindo o Estado. As afirmações partem do princípio de que o ser humano não influencia o clima, afinal, outros desastres já ocorreram na região. A única solução seria clamar a Deus.


7 A tragédia foi planejada por globalistas.

O que diz o estudo: em menos escala, os conteúdos conspiracionistas alegam que culpar as ações humanas sobre o clima é um pretexto do governo e da mídia para ocultar a verdade: que o desastre foi planejado e visa submeter a população e o agronegócio ao controle de grandes grupos mundiais. Conspirações alegam que as chuvas estão sendo causadas propositalmente por antenas Haarp, um projeto americano que estuda fenômenos físicos. O governador Eduardo Leite é acusado de ser globalista e participar do plano, que seria comandado pelo fundador do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab.


8 Figuras de direita estão ajudando mais que o governo.

O que diz o estudo: publicações destacam ações e declarações de parlamentares da direita em apoio ao Sul. A exaltação da direita foi vista em algumas plataformas, como as exaltam o auxílio de empresários “que já teriam feito mais que Lula”.

O levantamento aponta as plataformas digitais como coresponsáveis pela falta de transparência, uma vez que, quando solicitadas a remover conteúdos suspeitos, o fazem sem revelar às autoridades os dados dos responsáveis pela veiculação.

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