Eu, Santista, Confesso

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Por Washington Luiz de Araújo, jornalista, Bem blogado

Logo no início da pandemia decidi: além da quarentena contra o coronavírus tiraria também um ano sabático no futebol. O meu Santos, de glórias mil, que me perdoasse, mas eu não ia torcer vendo jogadores e comissão técnica se expondo ao vírus, feito gladiador no Coliseu, para o meu deleite.




E fui mantendo minha palavra, sem assistir nenhum jogo. Mas, como não sou de ferro, dava uma olhadinha no resultado, logo depois da partida.

Estava escaldado com a roubalheira dos cartolas. Roubalheira com misto de incompetência (acho até que esta mistura é intencional). Refleti: eles roubam, contratam mal com valores superfaturados, endividam o clube e eu torcendo? Me sinto como aquele, como diz Plinio Marcos, que “só berra da geral sem nunca influir no resultado”. E, além de tudo, futebol sem torcida? Estou fora, pensei eu.

Mas, não combinei com a molecada do Santos e com minha paixão futebolística. O time foi surpreendendo a chamada crônica esportiva que muito torce o nariz para o Peixe. O Santos foi punido pela Fifa, por dívidas irresponsáveis contraídas na contratação de jogadores no passado recente. A punição foi para o clube não contratar ninguém em transferências internacionais.

Endividado, atrasou muitos salários, teve o impeachment de um presidente. Ah, e a Covid-19 entrou em campo com tudo: dezenas de jogadores foram infectados. Enfim, tudo apontava para o caminho da segunda divisão.

E, de novo, como em 78/79, 2002/2003, 2010/2011, o raio caiu no mesmo lugar. O raio do talento, do trabalho em equipe, do amor à camisa.

Quando o Santos ganhou de dois a zero do Internacional, que beirava a liderança do Brasileirão, com a molecada que substituiu grande parte dos titulares infectados, pensei: “opa!”.

E foi ganhando na Libertadores. Subiu nos ombros da LDU nas alturas de Quito, deixou o Grêmio de quatro na Vila… E eu, só de soslaio, dando uma olhadinha lá e acolá nos gols, nos placares.

Me apeguei à questão da quarentena extensiva ao Santos e à superstição: se o time está indo tão bem sem eu assistir, por que vou arriscar ver um jogo?

Aí chegou 13 de janeiro. Depois de ser “roubado” na Bombonera contra o Boca Juniors, partiu para o outro jogo pela semifinal na Vila. Na Argentina, disseram que o Peixe tinha só 4% de chance de ganhar.

Agora, chego ao título deste texto: “Eu, Santista, Confesso”, não resisti e assisti ao jogo. Coração aos pulos, meio me achando hipócrita, vi o jogo. E o Santos venceu de três a zero. Estamos na final.

Que venha o Palmeiras lá onde era o Maraca, mas já me considero campeão ao ver a molecada, novamente, redimindo a camisa branca, imaculada. Camisa que tantos insistem em enlamear, levando até o inominável a vesti-la, mas o amor venceu.

Fora, Bolsonaro; fora, dirigentes ladrões; fora, Globo e demais algozes. O Santos é bem maior do que todas estas pedras colocadas no seu caminho.

“Nascer, viver e pelo Santos morrer, é um orgulho que nem todos podem ter”.

 

PS: Não aplaudo torcida se aglomerando na porta da Vila Belmiro. Além de tudo sem máscaras. O hino diz “pelo Santos morrer”, mas não vamos levá-lo ao pé da letra. E também não aplaudo se jogador não respeitar os protocolos e chamar o vírus para fazer tabelinha. É gol contra.

 

Foto: Lucas Braga, que há três anos era torcedor de arquibancada, do Santos, chora logo depois de fazer seu primeiro gol pelo Peixe. Jogo  Santos por 2 a 1 sobre o Defensa y Justicia, 20/10,  na Vila Belmiro. O atacante marcou o gol de empate e deu assistência para Marcos Leonardo (outro Menino da Vila) virar. Logo atrás de Lucas Braga, está Soteldo, jogador venezuelano, de um metro e meio, gigante na ponta esquerda, que fez um golaço contra o Boca Vila. Recentemente, Soteldo se negou a sair do Santos para  jogar na China, mesmo com a diretoria forçando a barra.

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