Examinando os critérios do ‘dia do orgulho hétero’

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Por  JEAN MENEZES DE AGUIAR no site Observatório geral, para o Jornal GGN

A palhaçada do ‘dia do orgulho hétero’

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Dois princípios orientaram a Constituição da República de 1988, considerada por estudiosos como Ada Pellegrini Grinover uma das melhores do mundo. O primeiro foi o da ‘não discriminação’. Por este conceito acabava, no sistema jurídico brasileiro, definitivamente, qualquer discriminação ou preconceito. Minorias finalmente tiveram a proteção do Estado. Já a sociedade foi constitucionalmente intimada a que dali para frente não se aceitariam mais ódios sociais rácicos, étnicos, sexuais etc.

O segundo grande princípio foi a da ‘compensação’. Toda vez que alguém ou algum grupo se vir desprotegido ou inferiorizado haverá sistemas compensatórios. Assim, a Defensoria Pública é um sistema compensatório a pessoas menos favorecidas. A Lei de Defesa do Consumidor, o hospital público, a escola pública, a preferência nas filas a gestantes, idosos e deficientes são todos sistemas compensatórios. Aí estão modelos de ‘compensação’ a quem, por uma situação permanente ou transitória, precise ser equiparado em sua eficiência às pessoas plenamente capazes, social ou economicamente.




Ambos os critérios – compensação e não discriminação- são perfeitamente justos, racionais, éticos e jurídicos. Não guardam qualquer discriminação. Compensar uma grávida com barrigão de 8 meses que se cansa mais facilmente dando-se a ela um assento especial e reservado no transporte público não é ‘privilegiá-la’. É algo justo, racional e lógico.

Mas houve um problema em toda essa cadeia. Primeiramente psicológico, e depois ampliado para um padrão sociológico, na mente conservadora. Como algumas minorias, como homossexuais, que já eram mal vistas, por estes mesmos conservadores, ‘festejaram’ em praça pública, isto ‘incomodou’.

Só um asno pensante acharia que uma Constituição ou um sistema jurídico regularmente democrático quereria criar privilégios para minorias ou mesmo para maiorias. Quando se ‘permite’ que gays festejem, pulem, se fantasiem, se iluminem e façam festas em avenidas sem serem espancados, xingados, humilhados e apedrejados a eles dá-se-lhes o mero direito oriundo da cidadania, dado a qualquer um, de festejar, sorrir, brincar e viver. Tudo muito normal, sem serem presos por um Estado retrógrado, atrasado e imbecil, como são todos os Estados ditatoriais e autoritários. E o Brasil já foi assim.

O problema psicossocial que atormentou conservadores, autoritários, fundamentalistas religiosos, retrógrados e outros mentalmente anoréxicos de conhecimento social sadiamente contemporâneo e de liberdade pensante foi a ‘festa’. Se os gays usufruíssem sua compensação e sua liberdade constitucional sem fazer ‘barulho’, esses atormentados mentais do conservadorismo não se incomodariam.

Saiu esta semana uma das notícias mais esdrúxulas e risíveis que uma democracia poderia parir. Até um aluno de Direito estranharia. O presidente da Câmara dos deputados, Eduardo Consentino da Cunha, quer ocupar a pauta da Câmara – e o dinheiro público- para votar o ‘dia do orgulho hétero’. É isto mesmo.

Poderia lançar o dia do orgulho de quem respira, quem bebe água, quem se alimenta, quem trabalha, quem vive. A heterossexualidade é biológica, animal, reprodutiva e … óbvia. Não é passível de orgulho ou ‘desorgulho’.

A ‘lógica’ da proposta parlamentar – ou o ódio vingativo embutido- desse esdrúxulo dia de orgulho heterossexual é a de que os héteros precisem de compensação ou defesa; estejam ‘ameaçados’ por alguma força social oculta.

Que héteros sacanas – e suntuosas héteras – resolvam fazer uma passeata na Avenida Paulista sobre este tal orgulho é algo que qualquer um daria um sorriso de canto de boca, denotando até interesse e atenção. Se o Femen viesse, com seus seios à mostra, melhor ainda.

Mas que um Poder da República se ocupe disso é uma esdruxularia com dinheiro público que pode ser duas coisas. Uma, falta de conhecimento com modelos jurídicos e sociais avançados que aceitam harmoniosamente a vida plural e reinventada por qualquer pessoa, do jeito que bem quiser. Um produto da contemporaneidade, um respeito à sua ‘autonomia de vontade’. Outra, o rancor de um fundamentalismo religioso atrasado de quem ‘usa’ o termo ‘família’ para esconder preconceito contra pessoas que se querem, se pegam ou se amam de uma forma diferente do casal homem & mulher.

De novo, a base é o fundamentalismo religioso moralesco, autoritário e obtuso, agora querendo se vingar de gays. Tristes mentes atrasadas e incultas.

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