Por Marina Amaral, no Twiiter, compartilhado de Jornal GGN –
Artista brasileira recoloriu fotografias de presos do campo de concentração de Auschwitz. Projeto virará documentário
Estabelecido pelas autoridades da SS Nazista na Polônia ocupada durante a primavera de 1940, Auschwitz serviu originalmente como um campo de concentração para prisioneiros poloneses.
Ainda sem câmaras de gás existentes nos perímetros do campo, o primeiro teste com o gás conhecido como Zyklon-B foi feito em Setembro de 1941, tendo como vítima um grupo de prisioneiros soviéticos.
O uso do gás deu-se pela necessidade das autoridades Nazistas de desenvolver um método mais rápido e mais eficiente para matar. Satisfeitos com os resultados dos testes subsequentes, transformaram o necrotério na primeira câmara de gás.
Localizada no campo conhecido como Auschwitz I, foi o local de extermínio de milhares de Judeus vindos da França, Yugoslavia, Holanda, entre outros. Ficou em funcionamento até Dezembro de 1942.
A construção de Auschwitz II, ou Auschwitz-Birkenau, começou em Outubro de 1941. Quatro câmaras de gás foram construídas ao longo dos anos. Em 1943, todas as quatro estavam em funcionamento constante.
Após os dois primeiros anos de operação, Auschwitz tornou-se o maior e mais mortal campo de extermínio Nazista. Estima-se que 1,1 milhão de pessoas tenham morrido em Auschwitz-Birkenau entre 1940-1945.
Os números de Auschwitz não são exatos, mas essa é a estimativa: 1.100.000 Judeus 140.000 Poloneses 23.000 Ciganos 15.000 Soviéticos (prisioneiros de guerra) 25.000 outros (homossexuais, testemunhas de Jeová, e outros “indesejáveis”.)
À medida que a Segunda Guerra Mundial progredia, a brutalidade por trás das cercas de arame de Auschwitz aumentava.
Ao serem selecionadas para “trabalhar”, e não para serem imediatamente exterminadas nas câmaras de gás, as vítimas tinham suas cabeças raspadas e um número de registro tatuado no braço – uma tentativa de dizimar qualquer senso de individualidade.
Durante o período de Fevereiro de 1941 até Janeiro de 1945, os presos que passaram pela seleção inicial e foram incorporados à população de Auschwitz-Birkenau foram fotografados. Talvez a maioria dessas fotos represente o último registro da vida de muitas dessas pessoas.
As fotos eram tiradas por prisioneiros – muitos deles fotógrafos treinados antes da guerra começar. O mais conhecido deles, Wilhelm Brasse, foi o responsável pela maioria desses registros.
Durante a evacuação do campo em Janeiro de 1945, autoridades Nazistas ordenaram que Brasse e outro fotógrafo chamado Bronisław Jureczek queimassem todas as fotos e negativos. As evidências da máquina de assassinato que se estabeleceu em Birkenau precisavam ser destruídas.
Em uma tentativa de preservar as evidências fotográficas, Wilhelm e Bronisław decidiram molhar o interior das fornalhas antes que esse material fosse jogado lá dentro.
Os dois conseguiram salvar 38.916 fotografias.
Essas fotos estão hoje nos arquivos do Museu de Auschwitz. São 31.969 homens e 6.947 mulheres. Esses números constituem apenas uma pequena fração de um arquivo vasto.
Em 2016, eu encontrei uma dessas fotos. Não sabia a história por trás, nem o nome da pessoa retratada. Pesquisei e descobri: Czesława Kwoka. Uma menina polonesa de 14 anos.
Então, decidi tentar usar o que faço para devolver um pouco de humanidade à essa menina que nunca mais saiu da minha cabeça.
Lendo mais sobre ela, descobri, com base no relato de Wilhelm Brasse, que ela havia sido espancada pouco antes da foto ser tirada. O motivo: ela não falava alemão.
A foto colorida rodou o mundo e eu passei a ter a oportunidade de falar sobre ela para milhões de pessoas diferentes. Eu queria que todo mundo conhecesse seu nome: CZESLAWA.
Fiquei muito, muito, muito surpresa pela forma como essa foto alcançou e impactou tanta gente. Recebia (e ainda recebo) emails todos os dias de professores relatando que estavam discutindo a história dentro das salas de aula.
Quando uma menina de 14 anos, idade que a Czeslawa tinha quando foi morta com uma INJEÇÃO NO CORAÇÃO, escreveu um poema sobre a foto e me mandou, eu percebi que tinha a obrigação e a oportunidade de fazer mais.
Foi por isso que eu criei o Faces of Auschwitz.
Graças ao apoio do Museu de Auschwitz-Birkenau na Polônia, tive acesso ao acervo e autorização para restaurar mais fotos. O objetivo do projeto é honrar a memória dessas pessoas, e usar o poder da ARTE para devolver à elas um pouco da humanidade arrancada.
Não faço nada disso sozinha. Tantas pessoas quiseram ajudar desde o início… professores, historiadores, jornalistas. Começamos a reunir fotos e o maior número de documentos e informações possíveis para tentar individualizar cada rosto.
Os números são enormes. Mas cada vítima representa uma vida inteira. Sonhos, amigos, família. Nomes, não números tatuados no braço. Essa, por exemplo, é Maria Schenker. Ela era pianista.
Walter Deagen foi preso por ser homossexual. Ele trabalhava como chaveiro. Hoje, graças à união do projeto, do memorial e do projeto “One Wall”, o rosto dele está pintado na fachada de um prédio em Berlim.
Hoje, quase dois anos depois de dar início ao Faces of Auschwitz, o que era só uma ideia dentro da minha cabeça, resultou em um grupo de pessoas maravilhosas que resolveram se unir por uma única causa, e com um único propósito.
Não nós conhecíamos, mas formamos uma equipe composta por pessoas de vários países diferentes, viajamos pra Polônia e gravamos um documentário. Assim, “do nada”.
Com o objetivo de fazer com que essas pessoas não sejam esquecidas. De mostrar que cada rosto representa muito mais do que um número. E de mostrar o que qualquer pensamento construído tendo o ódio como base é capaz de fazer.
Não é sobre mim ou sobre meu trabalho, nem nunca foi. É sobre as coisas incríveis que podem acontecer quando pessoas se unem e decidem fazer a diferença. E fazer a diferença não significa mudar o mundo, mas pelo menos fazer alguém pensar.
Não faço n-a-d-a sozinha. Faces of Auschwitz só é o que é porque a união de dezenas de pessoas diferentes faz ele ser assim.
Por fim, o documentário só sai no ano que vem. Mas compartilho uma das imagens que capturamos com o drone…
Sou muito, muito, muito grata por todas as oportunidades que eu tenho através do meu trabalho, e por isso sinto ser a minha obrigação usar tudo isso como ferramenta para algo muito maior e muito mais importante do que eu.