Publicado em O Tijolaço –
No seu artigo de hoje no Estadão, para bom entendedor, Fernando Henrique junta-se ao grupo do “é preciso estancar esta sangria” da Operação Lava Jato.
“Digo há tempos que o sistema político atual (eleitoral e partidário) está “bichado”. Sou defensor das ações da Lava Jato e sei que sem elas seria mais difícil melhorar as coisas. Mas não nos iludamos: sem alguma forma de instituição política e sem políticos que a manejem, não será suficiente botar corruptos na cadeia para purgar erros de condução da economia e da política. Que se ponha na cadeia quem for responsável, mas não se confunda tudo: nem todos os políticos basearam sua trajetória na transgressão nem todos os que financiaram a política, bem como os que receberam ajuda financeira, foram doadores ou receptores de “propinas”. Se não se distinguir o que foi doação eleitoral dentro da lei do que foi “caixa 2”, e este do que foi arranjo criminoso entre governo, partidos, funcionários e empresários, faremos o jogo de que “todos são iguais”.
Se fossem, que saída haveria? Está na hora de juntar as forças descomprometidas com o crime – e elas existem nos vários setores do espectro político – para que o bom senso volte a imperar e para que possamos recriar as instituições, entendendo que no mundo contemporâneo a transparência não é uma virtude, mas um imperativo e, por outro lado, que se não houver meios institucionais para decidir e legitimar o que queremos não sairemos da desilusão e da perplexidade.
Não é hora só para acusações, é hora também para a busca de convergências.
Mas, espere aí, Fernando Henrique…Não era esse o discurso que se fazia e que era acusado de ser cobertura para um desejo de “parar a Lava Jato”? Quando se dizia que as coisas estavam sendo conduzidas de maneira que quebraria a economia brasileira, faria paralisar o país e explodiria o emprego, não se era acusado de “cúmplice” das empreiteiras?
Agora que se derrubou o governo eleito, é “hora para a busca de convergência”?
O senhor acha que é possível “juntar as forças descomprometidas com o crime” com a cassação justamente daquela a quem não se acusa de crime algum, senão de “pedalada fiscais” que já se desmoralizaram com a perícia e com vagas alegações de que decretos orçamentários estariam em desacordo com a meta fiscal, o que, no insuspeito dizer de Elio Gaspari, “derrubaria todos os governantes, de Michel Temer a Tomé de Sousa”?
E é de supor que o senhor pretenda que dentro destas forças esteja o PSDB, cujo o presidente nacional, seu pupilo Aécio Neves, sobre o qual pesam já mais de uma dezena de acusações de delatores, que vão de Furnas às obras do centro administrativo de Minas Gerais.
Como é possível crer na honestidade em quem aponta o dedo para os outros – “Há responsáveis, mas não vem ao caso acusar. Provavelmente alguns deles, se forem intelectualmente honestos, estão se perguntando: por que não vi antes que endividar irresponsavelmente o País, mesmo que a pretexto de aumentar momentaneamente o bem-estar do povo e criar ilusões de crescimento econômico, é algo ruinoso, que as gerações futuras pagarão?” – se o seu próprio governo fez isso em escala estratosférica e elevou a dívida pública, que era de 28,4% em 1995 para a 55,9% no final de 2002?
Que cara de pau!
É por isso que Fernando Henrique é desmontado por Mehdi Hasan, jornalista inglês da Al Jazeera, numa entrevista que, infelizmente, ainda não está legendada na rede. Mas você pode ver o desastre acompanhando o vídeo (ao final do post) e lendo a tradução comentada feita por Pablo Villaça no Facebook. É uma saia-justa a um incoerente quase que do princípio ao fim.
Habituado a entrevistas com jornalistas brasileiros, que se limitam a levantar a bola para que ele corte em movimentos ensaiados, FHC teve suas posições confrontadas por um âncora da Al Jazeera (…)
No espaço de apenas dez minutos. o ex-presidente se embaraça repetidas vezes, chegando a contradizer a narrativa que seus comparsas golpistas vêm insistindo ao falar do “impeachment”.
Aliás, FHC já abre a entrevista admitindo que Dilma NÃO cometeu crime “no sentido penal”. E completou “ela cometeu um crime POLÍTICO”. O que não deixa de ser interessante, já que não há nada na Constituição que defina “crime político” ou o impeachment como pena.
Aí o entrevistador aponta que FHC pedalava 300 milhões POR ANO, inspirando a seguinte e inacreditável resposta: “No meu caso, foi diferente. Estávamos nos ajustando”.
Em seguida, o âncora aponta como Cunha, Temer e demais cúmplices são acusados de corrupção e pergunta se FHC não vê ironia no fato destes liderarem o “impeachment”. O ex-presidente começa a gaguejar, murmura algo sobre “foi o ‘povo’ que liderou” e diz que talvez Temer/Cunha sejam oportunistas. É então que o entrevistador o interrompe e diz: “Ok, então você aceita oportunismo” e muda de assunto.
TOIM.
O que vem a seguir é a melhor isca. “O senhor disse que o impeachment foi por causa do povo. 58% do povo quer que Temer saia. Você apoia o impeachment de Temer, então?”
FHC começa a gaguejar e tenta mentir sobre a pesquisa. Entrevistador o corta e o corrige. O seguinte diálogo é travado:
FHC: “Eu não conheço essa pesquisa”.
“Estou te informando agora.”
“Você precisa ter mais informações.”
“O SENHOR é que não conhecia a pesquisa!”
Mas o melhor momento: o jornalista aponta que a Lavajato revelou corrupção na Petrobrás na época do governo FHC e este enlouquece:
“No, no, no. I protest!” E diz que foi denúncia “política”.
E dá um piti que vocês não imaginam. Têm que ver pra crer.
A seguir, entrevistador fala da gravação de Jucá dizendo que precisam tirar Dilma e colocar Temer pra parar o sangramento da Lavajato. FHC primeiro tenta mudar de assunto; entrevistador insiste. O político então diz (juro): “Qual foi o resultado (da conversa)? Zero.”
“ZERO”?! O resultado foi EXATAMENTE O QUE ELES DISCUTIAM NA GRAVAÇÃO!
Para finalizar, o entrevistador menciona a investigação sobre a denúncia de que FHC usou a Brasif pra pagar mensalmente a ex-amante na França.
FHC: “É mentira.”
“Então por que está havendo investigação?”
“Porque o PMDB pressionou politicamente o MINISTÉRIO DA JUSTIÇA!”
Em outras palavras: o cérebro de FHC para de funcionar sob a pressão.
Que entrevista DESASTROSA. Em resumo: admitiu que não há razão criminal pro impeachment; que a questão é só política; …que todas as denúncias contra Dilma são reais, mas contra ele são motivadas politicamente e ainda gaguejou, deu piti e não soube responder.”