Por Celso Sabadin, jornalista, cineasta, crítico, do Planeta Tela
Dois grandes filmes estreando esta semana retratam com extrema sensibilidade as mazelas das relações interpessoais do Brasil de hoje: o pernambucano “Fim de Festa” e o paulista “Meio Irmão”.
“Fim de Festa” é o segundo longa ficcional dirigido por Hilton Lacerda (o primeiro é “Tatuagem”), conhecido pelos roteiros que criou para o cineasta Cláudio Assis dirigir.
A trama começa na manhã de uma quarta-feira de cinzas, momento em que o investigador policial Breno (Irandhir Santos, simplesmente sensacional) interrompe o seu descanso no interior (que ele chama de “Não-Carnaval”) para voltar a Recife. Motivo: uma turista francesa foi assassinada durante as festas carnavalescas, e Breno é chamado para conduzir o caso.
Ao voltar mais cedo, ele não esperava encontrar em seu apartamento o filho Breninho que, com seus amigos/ namorados/ namoradas ali passavam o feriadão.
Apesar do que possa parecer, “Fim de Festa” não é um filme policial sobre uma investigação. A morte da turista é um pretexto, um gatilho (Hitchcock chamaria de um “McGuffin”) para que Hilton Lacerda exponha com acidez e muita lucidez algumas das variadas facetas desprezíveis que parte da população brasileira passou a assumir nos últimos anos.
O conservadorismo extremo, a hipocrisia, o retrocesso, o ódio e a violência, entre outros, permeiam desde um grupo que “quer seu país de volta” numa cena na praia, até o lado brasileiro da família da vítima, que não hesita em expor abertamente o suposto desprezo que nutrem pelas suas próprias raízes e pelo país do Carnaval, de onde fugiram.
Percebe-se assim que o fim da festa a que o título se refere é muito mais amplo que apenas o fim de mais um carnaval.
Paralelamente, os personagens jovens destilam a imobilidade e a estagnação da nova geração que vive em tempos travados. Um certo niilismo de quem não sabe se foge pra Argentina ou se continua a fazer exatamente o que tem feito ultimamente: nada.
Uma desesperança que conversa diretamente com o outro lançamento importante desta semana, “Meio Irmão”, cuja crítica pode ser vista no link: http://www.planetatela.com.br/…/meio-irmao-a-desesperanca-…/
Importante, urgente e contemporâneo, “Fim de Festa” é o vencedor dos prêmios de melhor filme e melhor roteiro pelo júri oficial, na última edição do Festival do Rio. Completam o elenco Suzy Lopes, Gustavo Patriota, Amanda Beça, Safira Moreira, Leandro Vila e Ariclenes Barroso, com participações especiais de Hermila Guedes e Jean Thomas Bernardini, diretor da distribuidora Imovision e do cinema Reserva Especial, que não decepciona em seu pequeno porém importante papel.