Fome nas ruas: o roubo, a injustiça e o “mercado” comemorando índices econômicos

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Textos de dois jornalistas, René Ruschel e Carlos Eduardo Alves, a respeito da moradora de rua que foi presa por ter furtado uma pacotinho de miojo e refrigerante em São Paulo. 

Por René Ruschel, jornalista
Fome e culpa
Rosângela Sibele, 41 anos, moradora de rua há 10 anos, deixou a prisão. Ficou reclusa por ter furtado comida para dar aos filhos, até ter a prisão revogada pelo STJ. Ao deixar o presídio, contou que seu sonho “é ser gente”. “Não sei o que é isso. Não sei o que é ser mãe, filha, irmã”.
Confessou que é dependente química e quer fazer tratamento para se livrar do vício. “Quero conversar com minha mãe, abraçar meus filhos, explicar isso. Quero pedir perdão à minha família. Entendi o que eu estava fazendo com minha família. Ninguém tem a obrigação de cuidar dos meus filhos, eu tenho. Por quê fiz isso com elas? Quero pedir perdão e ir para uma clínica”, disse.
Afirmou que ficou assustada com a viatura, jogou as coisas que havia pegado e saiu correndo com medo de ser presa. “Eu estava com fome. Eu não queria pegar, não estou acostumada, não queria fazer. Eu só estava com muita fome, queria muito comer um miojo, estava doida para tomar um leite condensado e um refrigerante gelado. Não tenho dinheiro para isso”, completou.

 

Por Carlos Eduardo Alves, jornalista




Furto e fome
Quando li que uma mulher mãe de 5 filhos foi presa em São Paulo por furto de miojo e refrigerante me lembrei de cenas recorrentes que testemunho. Moro em região da cidade com muitos moradores em situação de rua.
Famílias de miseráveis, com crianças de chupeta, se esticam em trapos na saída de shopping e restaurantes.
Vejo em mercadinho pessoas furtando alimentos de pequeno tamanho e valor e enfiando-os em suas vestes precárias.
Afinal, leva-se apenas o que dá para ser escondido na roupa. Já vi, metros depois, crianças avançando como animais famintos em pacotes de bolacha (biscoitos).
Coisa de chorar de tristeza.
Estou falando da rotina na dita cidade mais rica do Brasil. São brasileiros com estômago roncando.
Alguns estudos, mesmo que esse tipo de levantamento seja de difícil aferição, apontam que cerca de 20 milhões de pessoas vivem em situação de fome no País.
E aí você lê que o “mercado” comemora algum índice econômico, que as vendas de determinado setor se recuperam etc.
O drama no Brasil é que parece que normalizamos o furto e a prisão de mães com cinco filhos com fome.
Entre as várias urgências urgentíssimas de um novo governo a primeira é garantir o direito à comida a tantos compatriotas que, estirados nas calçadas, mostram a face medieval e cruel de uma sociedade injusta em que crianças choram por não ter o que comer.

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