Por Washington Luiz de Araújo, Jornalista –
“A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá
(…)
A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a roseira pra lá”
(Roda Viva, Chico Buarque)
O Brasil, que sequer superou o trauma da ditadura militar (será que um dia superará?), hoje vive uma outra catástrofe: a ditadura midiática. Na época do regime militar, a repressão impunha prisões arbitrárias, censura, tortura e morte. Na atualidade, sofremos nas mãos de uma parcela do Judiciário que age ao arrepio do estado de direito, associado a uma imprensa que, em sua maioria, não vacila (e, em alguns casos, se esmera) em divulgar fatos mal apurados e boatos, desde que possam contribuir, de alguma forma, para atacar e tentar derrubar um governo legitimamente eleito pelo povo. É triste e trágico: no contexto da ditadura midiática, algumas redações transformaram-se nos novos porões.
Enganado está quem pensa que não há semelhança do Brasil de hoje com o de ontem. Um caso emblemático: nos chamados anos de chumbo, vibrávamos quando a censura “comia bola” e deixava passar uma música que trazia mensagem subliminar e apontava as mazelas do estado de exceção; hoje vibramos, principalmente pelas redes sociais, quando um artista, um jornalista, um jurista consegue furar o cerco da ditadura midiática e aponta a má-fé que a permeia.
Recentemente, a atriz Marieta Severo ousou confrontar o pensamento patronal do apresentador Faustão, em pleno domingo global. Ao “Brasil da desesperança” pregado pelo ex-engraçado Fausto Silva, Marieta pespegou um Brasil da inclusão social, que muito melhorou nos últimos anos. A resposta da atriz foi sucesso de público e de crítica entre aqueles participantes das redes sociais que veem a Globo como ponta de lança no projeto de golpe político.
E assim foi e assim vai: enquanto naquela época sombria nos arrepiávamos e ousávamos sair cantando pelas ruas, mesmo com o risco iminente de prisões e golpes de cassetetes, “vem, vamos embora que esperar não é saber…”, hoje vivemos de laivos de euforia quando um Janio de Feitas, um Paulo Moreira, um Nassif, um Paulo Nogueira, um Fernando Brito, um Rovai ou um Miguel do Rosário, um Bob Fernandes escrevem e falam contra esse estado de coisas que ameaça o estado de direito. Curtimos e compartilhamos com entusiasmo quando um Sakamoto, um Antonio Prata ou um Duvivier apontam o quanto a elite está nua. Vibramos e nos emocionamos quando um Jô Soares recebe a presidenta Dilma e faz uma entrevista digna, sem amaciar, mas também sem colocar dedo na cara e sem tentar intimidar a entrevistada.
“Apesar de você, amanhã há de ser…”, cantava, enquanto podia, Chico Buarque. Hoje, apesar da Globonews, o professor Igor Fuser fala o que realmente se passa com a Venezuela, fura o cerco e aponta o quanto de indignidade se diz e faz contra o país vizinho. E, apesar deles, Brasil 247, O Cafezinho, Portal Fórum, Carta Maior, Tijolaço, Conversa Afiada, Socialista Morena, Maria Frô, Blog da Cidadania e outros canais de notícia na internet remam contra a maré, como bem o fizeram, em outros tempos, os perseguidos e combativos veículos da chamada imprensa nanica, como Versus, Movimento, Pasquim, O Trabalho, Coojornal…
Esses veículos e personalidades, livres e dignos, que não se conformam e não abaixam a cabeça para a ditadura midiática, são os balões de oxigênio que nos recuperam da asfixia que tentam nos impor. Celebremos e divulguemos todas essas ações com o mesmo ânimo com que os ativistas que combatiam a ditadura militar e nos inspiravam na busca da democracia plena.