Presidente da Fundação Toyota sobre diversidade cognitiva: “Ainda não cumprimos a tarefa mais primária: dividir os espaços de tomada de decisão entre homens e mulheres”
Por Viviane Mansi | Artigo, ODS 5 , compartilhado de Projeto Colabora
(Arte: Claudio Duarte)
Não. Não estou em guerra contra o dicionário, mas buscando saídas para alcançar a necessária inovação que buscamos para construir a chamada década da implementação da Agenda 2030. Uma década que começou tragicamente com a pandemia da Covid-19, e agora nos traz as sombras de uma guerra novamente, quando acreditávamos que o racional humano já tivesse superado algumas formas de barbáries.
Estou falando de diversidade cognitiva.
Etimologicamente o termo se refere à busca por uma cognição ampla, com várias linhas de pensamento que possam compor um todo. Significa a conexão entre diversas abordagens de um tema para ter um resultado sistêmico, que permita não se restringir a apenas um lado deste tema. As grandes conquistas e a tão buscada inovação estão amparadas profundamente nesta ambivalência de ideias, que pode traduzir a visão do todo de acordo com o contexto, cultura, ou o papel que ocupamos na sociedade.
Embora a diversidade cognitiva trate de maneira ampla esta necessária conexão, não se restringindo aos seus aspectos demográficos, étnicos, etários, ou de raça e gênero, mas incorporando a eles também trações de personalidade, ainda não cumprimos a tarefa mais primária na busca desta cognição diversa: dividir os espaços de tomada de decisão entre homens e mulheres.
Isso vale para todas as esferas de poder. Do administrativo ao corporativo, passando, sempre, pelas tarefas domésticas às oportunidades profissionais. Na verdade, é imperativo que se diga, que mesmo sendo maioria na participação populacional em si, no mundo e no Brasil, as mulheres só ocupam posição de destaque nos ônus do desenvolvimento desenfreado do planeta e não no bônus.
Nestes ônus, estão por exemplo as mudanças climáticas, que atingem a todos, porém, por motivos sociais e econômicos, prejudicam mais as mulheres, segundo dados da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). Representamos 80% de todos os refugiados por problemas climáticos. Também na falta de acesso a água e esgoto estudos também da ONU indicam que as mulheres são mais afetadas que homens, já que são elas que buscam a lata d’água quando ela não sai na torneira de casa, só para citar um exemplo mínimo.
Quando falamos do lado bom da ampliação da diversidade nos postos de poder, ainda vemos que os avanços são sutis. Nas 500 maiores empresas do mundo, apenas 41 têm uma mulher no cargo de CEO. No Brasil, levantamento da BR Rating, agência de rating de governança corporativa, aponta que apenas 3,5% das corporações têm mulheres no posto. Além disso, segundo o IBGE, a renda das mulheres é em média 22% menor do que a dos homens, diferença chega a 38% em cargos gerenciais.
No atual ritmo de expansão da equidade de gênero, as mulheres ainda levariam mais 250 anos no mundo para equilibrar a balança, segundo o Fórum Econômico Mundial, mesmo que todas as pesquisas e estudos indiquem vantagens competitivas entre empresas que promovam essa diversidade em relação as que estão ainda dormindo no ponto.
Reconhecer a necessidade da diversidade cognitiva para garantir um futuro próspero para as empresas, as pessoas e o planeta, é o único caminho para termos diferentes formas de pensar, diferentes pontos de vista e diferentes conjuntos de habilidades em um grupo. Só com essa diferença de abordagens no grupo é que podemos ampliar o entendimento do novo e promovê-lo, ao invés de evitá-lo ou prorrogá-lo.
Dentro dessa almejada diversidade, buscar formas de diminuir de imediato essa desvantagem para o gênero feminino é um primeiro passo, tão básico, que se torna surpreendente que ainda não tenha sido feito e que todo mês de março, por ocasião do Dia Internacional da Mulher, voltemos a tratar disso.
No universo da ciência, por exemplo, apesar de representarem 43,7% do setor de pesquisa, segundo a Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI), entre 2014 e 2017, as mulheres assinaram 72% dos artigos científicos no Brasil, mostrando sua extrema relevância no meio. Porém, atualmente, apenas 13% dos postos de trabalho em tecnologia são ocupados por mulheres no Brasil (GOOGLE, 2019) e esse número declina em ocupações que envolvem robótica, processos de automação e IoT (Internet das Coisas).
O que estamos perdendo? Ou, se quisermos aprofundar a conversa desde já, por que estamos por quê estamos perdendo?
Fechar os olhos para essa realidade é perder oportunidades.
É não inovar. É se fechar para o futuro. Um futuro feminino precisa ser acelerado.