Governo Biden deve revelar papel dos EUA no impeachment de Dilma, diz Mark Weisbrot

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Por Clarissa Carvalhaes, na CartaCapital, compartilhado de Jornal GGN – 

Para Mark Weisbrot, se eleito, candidato democrata também pode abrir informações sobre a participação dos norte-americanos na Lava Jato

Co-diretor do Centro de Pesquisa Econômica e Política em Washington, um dos thinks thanks mais influentes dos Estados Unidos, Mark Weisbrot se dedicou nos últimos anos a entender também a política e a economia da América Latina.

Na entrevista a seguir, Weisbrot discorre sobre as chances de reeleição de Trump, os reflexos do movimento “Vidas Negras Importam” no resultado das urnas e o que o governo Bolsonaro pode esperar se o candidato do Partido Democrata, Joe Biden, vencer a disputa.




CartaCapital: Entre Donald Trump e Joe Biden, quem tem o plano mais convincente para recuperar a economia dos EUA?

Mark Weisbrot: Os democratas claramente têm um plano melhor. É muito difícil prever o que Trump faria, pois ele vai além até mesmo do mais oportunista dos presidentes anteriores ao não ter nenhum objetivo político discernível ou crenças além de seu próprio autoengrandecimento. Então, temos de considerar as ideias do Partido Republicano. E, no momento, o partido prevalece sobre a disposição anterior de Trump de violar o conservadorismo fiscal neoliberal convencional, muitas vezes inconsistente. O governo Trump promoveu déficits fiscais de 4,9% do PIB anualmente, quando o desemprego estava no menor nível em 50 anos, algo que nenhum presidente “normal” faria.

CC: E como os republicanos se comportam neste caso?

MW: Os republicanos rejeitaram um pacote de ajuda de 3 trilhões de dólares aprovado em maio pela Câmara, controlada pelos democratas. O resultado imediato foi retirar um benefício de seguro-desemprego federal de 600 dólares semanais, que constituía a maior parte da renda de dezenas de milhões de desempregados. Os democratas, por outro lado, apoiaram o projeto de lei de alívio de 3 trilhões, que inclui uma extensão do seguro-desemprego e cerca de 900 bilhões para governos estaduais e locais. Isso indica, no momento, uma grande diferença entre as duas partes. De certa forma, esse é um momento muito importante para a política macroeconômica dos Estados Unidos, mas os democratas no poder têm uma chance muito melhor de fazer o que é necessário para a recuperação econômica. Qualquer recuperação, claro, dependerá do caminho da pandemia Covid-19. Também está claro que o governo Trump administrou mal o problema, desde o início. Seria outro motivo para esperar uma chance melhor de recuperação econômica com os democratas.

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CC: Biden seria o melhor nome para derrotar Trump?

MW: Como velho conhecido dos norte-americanos, tanto por servir seis mandatos consecutivos como senador quanto por ser vice-presidente na chapa com Barack Obama, a imagem de Joe Biden é difícil de desconstruir. Não por acaso, Trump e seus estrategistas de campanha decidiram que o alvo a ser atacado é Kamala Harris, que atualmente sofre ataques racistas e sexistas, estratégia que funcionou no passado. Trump repete os ataques sexistas que usou contra Hillary Clinton, combinados com uma dose de racismo que faz parte de seu modus operandi, contra Kamala Harris. Não está claro, porém, se a estratégia terá muito impacto. Em uma pesquisa Gallup do ano passado, 94% dos entrevistados disseram que votariam em uma mulher para presidente, mas isso não quer dizer que os republicanos não tentarão usar o sexismo e o racismo contra Kamala Harris, ou que tais tentativas sejam irrelevantes.

CC: Trump tem lançado dúvidas sobre o voto via Correios. Quais os riscos desse discurso para a democracia dos EUA?

MW: A tentativa de Trump de sabotar a capacidade dos Correios de realizar uma votação postal em tempo hábil é muito mais uma forma de tentativa de golpe. Ele declarou abertamente intenções de impedir a votação por esse método. Cerca de 62% dos apoiadores de Biden planejam votar pelo correio, mas apenas 24% dos apoiadores de Trump o fazem. Assim, os esforços de seu chefe dos Correios, General DeJoy, importante doador de Trump e dos republicanos, para reduzir a capacidade de entregar dezenas de milhões de cédulas poderiam facilmente fazer a eleição pender para Trump, caso consigam. Este é um perigo real. Os democratas resistem no Congresso e, depois que alguns parlamentares ameaçaram DeJoy com uma investigação criminal, ele prometeu não reduzir ainda mais a capacidade dos Correios. Mas as alterações anteriores, que incluem a redução do equipamento de classificação de correspondência, não foram revertidas. Portanto, os democratas terão que fazer muito mais para garantir o voto dos eleitores. As chances de Trump permanecer no cargo caso perca nas urnas, por meio de uma intervenção, são muito pequenas, pois os militares em sua maioria não gostam dele ou não o respeitam.

CC: Como os protestos do movimento “Vidas Negras Importam” vão influenciar as eleições?

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MW: Segundo uma pesquisa do jornal New York Times, o “Vidas Negras Importam” pode ter sido o maior movimento de protesto na história dos EUA, com entre 15 milhões e 25 milhões de participantes. Não está claro, porém, o impacto dos protestos nas eleições. É provável que seja significativo, pois a população em geral apoiou as manifestações e a cobertura e discussão aumentou a conscientização sobre o racismo sistêmico e institucional. O Partido Republicano sempre buscou usar apelos racistas mal disfarçados para conquistar os votos da classe trabalhadora branca, que muitas vezes foram decisivos nas eleições nacionais dos Estados Unidos. A resposta hostil de Trump e do partido diante dos protestos recentes destacou parte do racismo da legenda e tende a mobilizar a base democrata, incluindo alguns dos próprios milhões de manifestantes.

CC: Como a eleição de Biden influenciaria as relações EUA-Brasil?

MW: Trump faz tudo o que pode para apoiar Bolsonaro, inclusive com a designação do Brasil como “Grande Aliado Não-OTAN” e com a defesa da admissão do Brasil na Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Além disso, incorporou seu governo a uma aliança que buscou uma mudança de regime na América Latina, mais recentemente, na derrubada do governo democraticamente eleito da Bolívia por um golpe militar. Todas essas políticas de colaboração antidemocrática com governos da região, Brasil incluído, devem cessar imediatamente. É importante ressaltar que o Departamento de Justiça dos Estados Unidos desempenhou um papel importante nas investigações da Lavo Jato e na perseguição política e no golpe contra Dilma Rousseff, Lula e o Partido dos Trabalhadores. Integrantes do Congresso dos EUA exigiram que o Departamento de Justiça “explique o escopo de seu envolvimento no caso poluído e politizado contra o ex-presidente do Brasil Lula da Silva, e a ampla investigação de corrupção da Lava Jato”. O governo Biden deve responder imediatamente a essas perguntas e divulgar todas as informações sobre o envolvimento do governo dos Estados Unidos na investigação, no golpe parlamentar e em quaisquer outras intervenções políticas contra o PT. Claro que por todas essas razões uma reeleição de Trump seria terrível para o Brasil, como para os Estados Unidos e o mundo.

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