Entre os documentos que foram extraviados, estão estudos sobre catástrofes climáticas como a que atingiu o Rio Grande do Sul
Por Ivan Longo, compartilhado de Fórum
A Controladoria-Geral da União (CGU) do governo Lula informou, através de nota divulgada nesta sexta-feira (26), que abriu uma investigação preliminar para apurar o sumiço de milhares de documentos do Ministério do Meio Ambiente durante o governo Bolsonaro, quando a pasta era comandada por Ricardo Salles (PL-SP), hoje deputado federal.
“A Controladoria-Geral da União (CGU) abriu uma apuração preliminar para analisar a informação de que milhares de documentos do Ministério do Meio Ambiente foram retirados do ar no governo anterior. A Secretaria Nacional de Acesso à Informação (SNAI) tomou conhecimento do fato e encaminhou o caso internamente”, diz nota da CGU.
“A Secretaria Federal de Controle (SFC) instaurou o processo e vai apurar os fatos. Se houver indícios da participação de servidores, a Corregedoria-Geral da União também pode atuar no caso. A CGU trabalha de forma integrada para que a transparência seja a regra e o sigilo a exceção”, prossegue o órgão.
O sumiço dos documentos foi revelado pelo jornalista Guilherme Amado em sua coluna no site “Metrópoles”. Segundo a reportagem, inúmeros documentos das últimas décadas foram retirados do ar, entre eles estudos importantes sobre prevenção de catástrofes climáticas, como a que atingiu recentemente o Rio Grande do Sul.
Há suspeitas de que servidores do Ministério do Meio Ambiente durante a gestão de Ricardo Salles, ministro que prometeu “passar a boiada” na legislação de proteção ambiental, tenham sido os responsáveis por apagar os documentos. A própria pasta, hoje sob o comando da ministra Marina Silva, apura o caso internamente em parceria com a CGU.
“O Ministério do Meio Ambiente atua em conjunto com a CGU para apurar a informação de que documentos foram retirados do site no governo anterior”, diz comunicado oficial.
Caso Damares
Um outro sumiço também está sob investigação. O Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDCH), comandado por Silvio Almeida, deve abrir um procedimento interno para apurar o “sumiço” de uma lista de presentes recebidos pela titular da pasta durante o governo Bolsonaro, a atual senadora Damares Alves (Republicanos-DF).
No dia 9 de julho, o Tribunal de Contas da União (TCU), instado pela deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP), publicou um acórdão em que arquiva representação solicitando investigação sobre o fato da lista de presentes recebidos por Damares ter sido apagada por uma servidora, mas determina que a atual gestão do Ministério dos Direitos Humanos abra um procedimento interno para apurar o fato.
Luciene Cavalcante havia acionado o TCU em março de 2023 após o jornal O Tempo trazer à tona, a partir de dados obtidos pela Lei de Acesso à Informação (LAI), que uma lista que deveria especificar todos os presentes recebidos por Damares Alves enquanto esteve no comando do antigo Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos foi apagada por uma servidora. Além disso, os itens que a ex-ministra ganhou não estariam sob posse da União, como determina a lei.
À época da revelação, a atual gestão do ministério informou que a lista dos presentes foi apagada por uma servidora no início de 2023 e, por causa disso, ela foi exonerada. A pasta informou, ainda, que os presentes não foram encontrados quando a pasta foi ocupada pela nova administração.
“Informo que o controle de presentes recebidos era feito em planilha de Excel, e que, no início do ano de 2023, os dados dessa planilha, que constava todos os registros dos recebidos pelas ministras Damares Alves e Cristiane Britto, foram excluídos por uma colaboradora que justificou acreditar que essas informações não seriam úteis ou necessárias”, diz comunicado do Ministério dos Direitos Humanos em resposta à solicitação feita via LAI.
Em resposta à ação de Luciene Cavalcante, o TCU informou que não pode atuar no caso, mas determinou o envio de cópia do acórdão ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania “com fundamento no art. 9º, I, da Resolução-TCU 315/2020, acerca das ocorrências relacionadas à ausência de registro em sistema específico de presentes recebidos por autoridades, nos termos dos itens 8 a 10 da instrução à peça 5, tendo em vista que contrariam o disposto nos arts. 116, I, 124 e 143 e 148 da Lei 8.112/1990, no art. 3º da Resolução-CEP/PR 3/2000, c/c art. 18 do Decreto10.889/2021, bem como o princípio da moralidade, previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal”.
Em entrevista à Fórum, a deputada Luciene Cavalcante questionou “o que está por trás” do sumiço da lista de presentes de Damares, fazendo uma conexão com a investigação da Polícia Federal (PF) sobre o extravio de joias e artigos de luxo por parte do Jair Bolsonaro para serem vendidos nos Estados Unidos e pelo qual o ex-presidente foi indiciado.
“O TCU reconhece que houve um ato ilegal que foi cometido pelo ministério comandado pela Damares ao se apagar a lista de presentes que foram encaminhados ao Estado brasileiro, ao povo brasileiro, portanto. São indícios gravíssimos que precisam agora ser investigados pelo Ministério de Direitos Humanos e Cidadania, porque existe uma operação em curso para a investigação dessa quadrilha que estava no Planalto e também espalhada pela Esplanada dos Ministérios, que estava organizada para roubar joias, presentes, roubar dinheiro do nosso povo”, afirma a parlamentar.
“Por que que apagou a lista de presentes? O que está por trás disso? Todo servidor público tem o dever de zelar pelo erário público, pelo patrimônio público. Ele não pode atuar contra a população, e no caso, é relacionado a um esquema de sumiço de provas, que estão sendo investigadas, como é o caso das joias, que inclusive também foi acionado pelo nosso mandato no TCU”, prossegue.
“O acórdão do TCU é taxativo ao dizer que houve, sim, uma ilegalidade, porque essa lista sumiu, ela foi desaparecida, e que portanto o próprio Ministério de Direitos Humanos e Cidadania, hoje comandado pelo ministro de Estado, Silvio Almeida, agora precisa fazer essa auditoria, essa sindicância interna para determinar como que isso se deu, qual é a profundidade, o que significavam esses presentes, essa listagem de patrimônio público que sumiram, para que também futuramente a gente tenha ciência se há essas relações com essa outra quadrilha que já está sendo investigada na Polícia Federal”, finaliza Luciene Cavalcante.
À época em que o “sumiço” da lista de presentes veio à tona, a assessoria de imprensa de Damares Alves informou que “todos os itens recebidos foram catalogados” e que a responsabilidade pela lista que não está mais disponível seria da atual gestão do ministério.
“A senadora foi informada da perda dos dados referentes à demanda. De acordo com a compreensão, a perda do catálogo ocorreu durante a atual gestão. Todos os itens recebidos foram catalogados, incluindo artesanatos, cocares indígenas sem valor comercial, livros e Bíblias autografados em nome da senadora e outros objetos pessoais relacionados à então ministra e sua filha, como camisetas e retratos pintados. Muitos presentes foram enviados na forma de comidas, doces e cocadas, produzidos por grupos de mulheres e povos tradicionais”, diz nota