Por Eduardo Maretti, publicado na RBA –
Para Carlos Gabas, ex-ministro de Lula e Dilma, pressão popular contra reforma deve ser muito intensa para barrar a PEC 287. “Precisa pressionar os deputados na base deles, senão corremos o risco de aprovarem, dia 13”, afirma
São Paulo – Por conta das dificuldades de conseguir reunir 308 votos para aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, a “reforma” da Previdência, o governo Michel Temer tem sido cauteloso. A mídia tradicional destacou nas últimas horas a sinalização do presidente da República dizendo que o texto só irá à votação se os 308 votos, ou três quintos dos deputados, estiverem garantidos.
É um quórum alto e difícil de atingir, principalmente para aprovar uma PEC que retira direitos da população que no ano que vem vai votar em deputados e senadores. Mas para Carlos Eduardo Gabas, ministro da Previdência dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, apesar da cautela, o governo pode conseguir o objetivo. “A conta que ele precisa entregar para quem patrocinou o golpe é a privatização da Previdência. Por isso vai jogar todas as fichas. Meu alerta às entidades sindicais, centrais, movimentos populares, é que não desmobilizem, porque eles têm possibilidade de aprovar na semana que vem.”
O governo faz um esforço final para aprovar a PEC em primeiro turno no dia 13, quarta-feira. “Se continuarem comprando deputados, podem conseguir número suficiente para aprovar na semana que vem”, diz Gabas. “(O governo) já gastou com a imprensa (em publicidade) 100 milhões de reais para fazer esse monte de propaganda mentirosa”, diz o ex-ministro.
O objetivo da ofensiva no Congresso é convencer os partidos da base a fechar questão até a próxima semana, inclusive o PMDB. A posição do PSDB é esperada com grande ansiedade pelos aliados de Temer.
Para Gabas, governo e aliados têm a seu lado a propaganda, mas o discurso é contraditório e incoerente. “Eles perderam o debate sobre o déficit. Perderam para nós e para a CPI do Senado. O relatório final mostra que não tem esse déficit”, diz o ex-ministro, em entrevista à RBA.
Como avalia as propagandas do governo para convencer a população da necessidade da reforma?
Na verdade, o governo perdeu o debate sobre o déficit. Começou dizendo que havia um déficit insustentável, que a Previdência estava quebrada, que precisa fazer a reforma. Eles dizem que está quebrada, mas começam perdoando débitos de grandes devedores. O governo perdoou mais de 200 bilhões de reais de dívida. Quem está quebrado não perdoa dívida. É uma grande contradição.
A ideia é que a Previdência seja do mercado…
Claro, é verdade. Mas eles perderam o debate sobre o déficit, para nós e para a CPI do Senado. O relatório final mostra que não tem esse déficit. O objetivo de aprovar a reforma é isso que você fala. Não tem nenhuma relação com equilíbrio de contas, com sustentabilidade. Não busca equilíbrio nenhum, até porque não ataca nenhum dos problemas estruturais do financiamento, só retira direitos. O objetivo é transferir a previdência pública para o capital financeiro, para o sistema privado, que vai ter muito lucro em cima disso. E sabemos que o capital financeiro não protege nada, não tem relação com proteção social, solidariedade. É ganho, lucro.
É uma contradição com nosso sistema, que não tem fins lucrativos, que tem ampla proteção, é solidário. O governo quer desmontar essa lógica e para isso ataca de todos os lados. Atacou primeiro com a história do déficit, perdeu a batalha, e ataca agora dizendo que é para retirar privilégios. Mas a ideia é retirar direitos de trabalhador pobre. A PEC não ataca um privilégio dos altos escalões, do Judiciário, do Executivo, do Legislativo. Basta ver a declaração do secretário de Educação do Alckmin, (José Renato) Nalini. Aquele vídeo é um esculacho. Ele justifica dizendo que os auxílios que o Judiciário recebe são um disfarce para os salários, porque um juiz não pode viver com 33 mil reais. É um acinte.
Temer diz que só irá à votação quando a vitória for garantida. Considerando que ano que vem tem eleição, que o PSDB está dividido e deputados da base, inclusive Rodrigo Maia, têm dito que é muito difícil aprovar, qual sua expectativa?
Se continuarem comprando deputados como estão, podem conseguir número suficiente para aprovar na semana que vem. Ele está gastando dinheiro. Já gastou com a imprensa 100 milhões de reais para fazer esse monte de propaganda mentirosa. A conta que ele precisa entregar para quem patrocinou o golpe é a privatização da Previdência. Por isso vai jogar todas as fichas. Meu alerta às entidades sindicais, centrais, movimentos populares é que a gente não desmobilize, porque eles têm possibilidade de aprovar na semana que vem.
Supondo que se aprove, existe a ideia de que pautas como esta, a reforma trabalhista ou o congelamento de gastos por 20 anos são reversíveis, caso um governo progressista se eleja. Qual sua opinião?
PEC é muito difícil, é quórum qualificado, não podemos apostar nisso. Não é simples reverter uma PEC. Não vamos conseguir mudar o perfil do Congresso Nacional. No ano que vem haverá algumas modificações, vai ter alguma renovação, mas o perfil do Congresso vai continuar conservador, vai ser difícil reverter. O importante agora é não deixar aprovar, pressionar os parlamentares. Eles não conseguem vencer no debate. Conseguem vencer comprando deputado. Na verdade não existe reforma, existe um desmonte da Previdência Social. Não tem nenhum item com o qual a gente dialoga nessa proposta. É errada na forma e no conteúdo. Não ataca problemas de financiamento, só ataca direitos, especialmente dos mais pobres.
O que é mais grave na proposta?
Tudo é grave. Ele aponta agora os canhões e os holofotes para o servidor público. É a tal agenda do Estado mínimo, faz parte dessa agenda. Mas Estado mínimo para quem? É mínimo para o pobre, porque quem precisa do serviço público é pobre. O Estado, para eles, para o Judiciário, continua sendo máximo. Para o povo é mínimo. A agenda que eles querem impor agora é jogar na conta do servidor público. Mas a culpa pela falência do Estado, pela crise econômica, é da irresponsabilidade deles, que agravaram a crise por conta de uma crise política, para tirar a presidenta eleita. Essa crise econômica foi potencializada pelo Eduardo Cunha, pelo PMDB, ao tirar a Dilma.
Segundo analistas, a agenda de Temer é a do PSDB…
Claro, uma agenda para agravar a crise econômica que jogou o Brasil numa recessão jamais vista, com 14 milhões de desempregados, o que significa redução da base de contribuição.
A propaganda do governo teria força para reverter a impopularidade da reforma?
A propaganda engana o povo. Mas as pessoas estão reagindo, vários segmentos e entidades fortes. A OAB, a CNBB, se manifestaram contra. As igrejas cristãs estão reagindo. Vi bispo dizendo que vai distribuir santinho dos parlamentares que votarem na reforma. Isso não é qualquer coisa. É uma reação popular, mas precisa ser mais intensa, precisa pressionar os deputados na base deles, senão corremos o risco de aprovarem. Se conseguirem o quórum para aprovar, vão colocar em votação no dia 13.
O governo ensaiou um recuo na reforma, e Temer chegou a dizer que ela “não é muito ampla”. O que pode acontecer no Congresso?
Não tem recuo nenhum, eles estão só tentando dourar a pílula. Mas o remédio é desnecessário e equivocado. Você está dando estricnina para um cara que está com gripe. A proposta continua cruel. Nós não dialogamos com essa proposta, ela tem que ser retirada. Nós queremos diálogo, queremos debate.