Por Wilson Roberto Vieira Ferreira, publicado em Jornal GGN –
Editorial de “O Globo” acusa que Bolsonaro é um “risco para o País”. Ao mesmo tempo, para a jornalista Miriam Leitão, Bolsonaro é um “empecilho para a retomada econômica”
Editorial de “O Globo” acusa que Bolsonaro é um “risco para o País”. Ao mesmo tempo, para a jornalista Miriam Leitão, Bolsonaro é um “empecilho para a retomada econômica”. A capa da revista Piauí satiriza os dons de chapeiro de Eduardo Bolsonaro que o “credenciam” a ser embaixador nos EUA. Enquanto isso, as esquerdas se assanham, achando que a “ficha tá caindo” na grande mídia que, desesperada, tentaria se descolar de uma figura tóxica. Simultaneamente é lançado o filme “Eu Sou Brasileiro”, drama de “superação” e autoajuda com muitos atores globais, protótipo do tipo de filme que Bolsonaro quer ver a Ancine fomentar… São instantâneos da atual guerra semiótica criptografada que, como de costume, as esquerdas não conseguem fazer uma leitura, a não ser aquela que a grande mídia e Bolsonaro querem que elas façam. Mas há sinais de inteligência semiótica que as esquerdas deveriam prestar atenção: a trolagem do livro “Por Que Bolsonaro Merece Respeito, Confiança e Dignidade?”, com 198 páginas em branco.
Em editorial do jornal O Globo publicado nessa quarta-feira intitulado “Descontrole de Bolsonaro afeta relações externas” (14/08/2019), o diário carioca enquadra o presidente como uma variável indesejável e perigosa para a Nação.
O texto qualifica as novas quebras de decoro do presidente como um fator de risco para o País. Fala sobre “Má educação”, “fixação escatológica”, “má educação e inconveniência” de alguém que “não se adequa à liturgia e representatividade do cargo que passou a ocupar.
E fecha texto alertando: “o presidente se torna um risco para o País”.
A jornalista Miriam Leitão (cuja única crítica que conseguia formular ao candidato Bolsonaro era de que “nada se sabe sobre seus projetos de economia”) agora é mais enfática: para ela, o capitão da reserva virou “empecilho para a retomada da economia brasileira”. Por que? Porque estabelece prioridades como cortar o cabelo e furar reuniões com chanceler francês, atacar a Alemanha e insultar argentinos.
“É com erros assim que Bolsonaro vai erodindo a confiança na economia”, dispara a veterana jornalista que acreditava que bastaria a presidenta Dilma fosse tirada do Poder pelas pedaladas fiscais para o “mercado” renascer das cinzas, tal como uma Fênix.
Bolsonaro pode ser criticado por qualquer coisa, menos pelo seu “sincericídio”: em toda sua vida política e, principalmente na campanha eleitoral, jamais escondeu o que pensa. Suas atitudes toscas e intempestivas sempre foram propositalmente disparadas para câmeras e microfones. Afinal, ele se tornou um meme vivo que, como tal, não se rege pelo princípio de sedução como na velha propaganda política.
Memes não seduzem. Memes “mitam”, “lacram”.
Enquanto era conveniente para afastar Lula e o PT (afinal, sobrou apenas ele mesmo para desempenhar esse papel), editorialistas e colunistas da grande mídia silenciaram.
Ou fizeram até mais, para protege-lo de si mesmo: ao perceberem que a última esperança branca era uma figura irremediavelmente tosca e autoritária, resolveu poupá-lo ao máximo, com a estratégia do discurso indireto – locutores, apresentadores, repórteres e colunistas passaram a falar por ele para esconder do resto do público o discurso bárbaro. Afinal, como uma espécie de meme ambulante, as lacrações de Bolsonaro eram apenas para consumo interno dos convertidos à camisa amarela que urravam por “golpe militar constitucional” nas domingueiras. Enquanto era conveniente para afastar Lula e o PT (afinal, sobrou apenas ele mesmo para desempenhar esse papel), editorialistas e colunistas da grande mídia silenciaram.
Tudo isso demonstra que vivemos um acirramento da guerra criptografada, que cada vez mais confunde o público. E principalmente as esquerdas.
O objetivo dessa estratégia semiótica é criar a aparência de que a grande mídia está jogando Bolsonaro ao mar, de que esgotou a paciência com suas escatologias (afinal, falar de “cocô dia sim, dia não” saído da boca presidencial não pega bem para as crianças na sala diante da TV) e de que, com apenas oito meses, esse governo parece com os dias contados.
E as esquerdas continuam andando a reboque da pauta da grande mídia. E, por isso, se assanham: comemoram que a mídia “está abandonando a criatura” ou exultam de que “tá caindo a ficha”, com aquele tom de campeão moral: “eu bem que falei!…”.
As capas da Piauí
Agora observe abaixo algumas capas da revista Piauí cujo tema recorrente é Bolsonaro e seu clã:
São capas das últimas edições: números 151, 152 e a última desse mês de agosto, 155.
Repare, atento leitor, o apuro artístico das capas da revista Piauí. São marcadas por intertextualidades como alusões, paródias, pastiches ou paráfrases. Todos esses recursos linguísticos são agora colocados a serviço da guerra semiótica diversionista: essencialmente, desviar a atenção do distinto público.
O filho Eduardo Bolsonaro, aspirante a embaixador cujas credencial ventilada é ter sido chapeiro nos EUA, figurado numa paráfrase do quadro “O Embaixadores” (1533) de Hans Holbein; ou Bolsonaro caracterizado com um tiozão depravado nu, dentro de um overcoat, são exemplos dessa caprichada sátira. À primeira vista, parece que a Piauí é crítica, transgressiva – uma revista corajosa e independente que não poupa o próprio presidente.
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Junto com o restante da grande mídia, a revista parece também querer se descolar da figura tóxica de Bolsonaro. Mas dentro da perspectiva da guerra criptografada é simples cortina de fumaça. Por que será que todo esse esmero e criatividade artística intertextual da Piauínão relaciona o clã Bolsonaro com sua agenda neoliberal posta em prática a toque de caixa?
Por que, ao invés de overcoat se chapas com hambúrgueres, não vemos referência a entrega dos campos de petróleo da Petrobras, a destruição do ensino público superior, a ausência de qualquer política econômica que gere empregos e inclusão, a destruição das garantias sociais e direitos trabalhistas, a venda da Eletrobrás e a entrega da Base de Alcântara aos EUA?
Ora, essa é a agenda da elite rentista brasileira. E Piauí foi criada pelo filho do banqueiro Walther Moreira Salles.
Não! Se o País está tecnicamente num quadro de recessão econômica, não se deve à política neoliberal de rifar o Estado para empurrá-lo do mínimo para o “líquido” – sobre esse conceito, clique aqui.
Para as Capas da Piauí e editoriais da grande mídia, tudo se deve à “falta de decoro”, “má educação” e “fixação escatológica” que não infunde “confiança ao mercado” de um presidente egresso do baixo clero parlamentar.