Declaração feita em reunião para discutir a dinâmica do golpe confirma informação antecipada pela Fórum de que o general participou ativamente do processo golpista e se conecta com investigação da ‘Abin paralela’
Por Ivan Longo, compartilhado de Fórum

Na reunião ministerial secreta articulada por Jair Bolsonaro em 5 de julho de 2022 para discutir a dinâmica do golpe de Estado que pretendia encampar, o então chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, admitiu que utilizaria a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para espionar a campanha do então candidato à presidência naquele ano e que viria a vencer o pleito, o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A reunião em questão foi gravada em vídeo que estava com o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, e se tornou a principal prova da Polícia Federal (PF) para deflagrar a megaoperação Tempus Veritatis, nesta quinta-feira (8), que mirou Bolsonaro, militares – incluindo o próprio Heleno -, ex-assessores e outros “cabeças” da articulação golpista, que tinha por objetivo manter o ex-presidente no poder mesmo diante de uma derrota eleitoral.
O vídeo da reunião, cujo sigilo foi retirado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta sexta-feira (9), além de Bolsonaro cobrar apoio golpista diante de sua iminente derrota eleitoral, Heleno aparece falando em “virar a mesa” e sugerindo colocar infiltrados da Abin na campanha de Lula para espionar os adversários. Ele chega a admitir a ilegalidade do “esquema”, em suas próprias palavras, ao fazer o alerta de que o plano não poderia ser vazado.
“Dois pontos para tocar aqui, presidente. Primeiro, o problema da inteligência. Eu já conversei ontem com o Victor [Felismino Carneiro], novo diretor da Abin, nós vamos montar um esquema para acompanhar o que os dois lados vão fazer”, dispara Heleno.
“O problema todo disso é se vazar qualquer coisa. Muita gente se conhece nesse meio. Se houver qualquer acusação de infiltração desse elemento da Abin em qualquer um dos lados…”, prossegue o general.
O ex-chefe do GSI chegou a ser interrompido por Bolsonaro, que temia que alguma informação sensível sobre o plano golpista fosse vazada.
“General, eu peço que o senhor não fale por favor. Peço que o senhor não prossiga mais na sua observação, não prossiga na sua observação. Se a gente começar a falar ‘não vazar’, esquece. Pode vazar. Então a gente conversa particular na nossa sala sobre esse assunto”, pontuou o ex-presidente.
Depois, Heleno ainda falou sobre “virar a mesa” antes mesmo das eleições.
“O segundo ponto é que não tem VAR nas eleições. Não vai ter segunda chamada na eleição, não vai ter revisão do VAR. Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa, é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa, é antes das eleições. Depois das eleições, será muito difícil que tenhamos alguma nova perspectiva”.
Veja os vídeos
Inacreditável! General Heleno fala em usar agentes infiltrados da Abin nas campanhas de Bolsonaro e Lula, mas bolsonaro corta fala do general e diz que depois conversariam em particular sobre o tema. pic.twitter.com/lz0Lwi41EW
— Lázaro Rosa 🇧🇷 (@lazarorosa25) February 9, 2024
CENAS DE GOLPISMO EXPLÍCITO!
— Jandira Feghali 🇧🇷🚩 (@jandira_feghali) February 9, 2024
“Não vai ter segunda chamada das eleições. O que tiver que ser feito, tem que ser antes das eleições. Se quiser virar a mesa, tem que ser anes das eleições.”
General Augusto Heleno, ministro-chefe do GSI, na reunião de 05 de julho de 2022 em que… pic.twitter.com/MI1imrXqEi
Assista à íntegra do vídeo da reunião golpista
Fórum antecipou golpismo de Heleno
Desde 13 de dezembro de 2022, um dia após a diplomação de Lula no TSE e do primeiro ataque do que genericamente era chamado de “bolsonaristas” contra a capital federal, que terminou a noite com ônibus e carros incendiados, vias fechadas e depredadas e uma tentativa de invasão da sede da Polícia Federal, a Fórum já vinha denunciando, por meio de informações disponibilizadas por um servidor da PF lotado dentro do Palácio do Planalto, que o GSI e seu então chefe, o general Augusto Heleno, tinham responsabilidade na organização dos ataques, que se intensificariam na véspera de Natal, quando um caminhão com 60 mil litros de querosene quase explodiu o aeroporto de Brasília, e por fim no trágico 8 de janeiro de 2023.
Em seus depoimentos na CPI da Câmara Distrital do DF e na CPMI do Congresso Nacional, Heleno foi questionado inúmeras vezes sobre sua participação na tramoia golpista, mas sempre negou, inclusive atacando a Fórum e o repórter autor das matérias que o denunciavam, afirmando nunca ter se envolvido nesse tema e fazendo acusações de prática de mau jornalismo. Com as investigações da PF e o inquérito remetido ao STF, a participação do general da reserva no episódio apenas se confirma.