Combate e prevenção ao HIV nas mulheres são lutas que fazem parte da Campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra as Mulheres
Por André Accarini, compartilhado de CUT
Ao contrário dos estigmas e preconceitos enraizados em nossa sociedade, o HIV, vírus da imunodeficiência adquirida, não infecta apenas a população LGBTQIA+. Homens e mulheres heterossexuais também são infectados. De acordo com os dados da Unaids, agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para o tema, em todo o planeta, em 2023, 44% das novas infecções foram entre mulheres e meninas.
No Brasil, também em 2023, de um total de 16.281 novos casos de infecção pelo vírus, 4.702 foram em mulheres. No ano anterior, 2022, os números foram maiores. O total de casos foi de 36.753, sendo 26.123 em homens e 10.623 em mulheres.
A infecção por HIV nas mulheres faz parte das pautas de luta da Campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra as Mulheres. Deve-se ao fato de que as mulheres estão mais vulneráveis à infeção por diversos fatores sociais, de gênero e culturais. Entre eles destacam-se:
– a desigualdade de gênero nos mais diversos setores da sociedade, em especial dentro do ambiente doméstico em que a estrutura patriarcal impede que elas tenham autonomia para, por exemplo, evitar a violência sexual e exigir o uso de preservativos;
– o estigma social que impede as mulheres de buscaram tratamento;
– os tabus culturais que a obrigam a deixar de lado o uso de métodos de prevenção;
– a dependência econômica que faz com a mulher seja submissa ao parceiro e o acesso ao tratamento, mais difundido entre os homens;
– os altos índices de violência sexual praticados contra a mulher: uma mulher sofre violência sexual no país a cada 46 minutos, segundo o Atlas da Violência 2024, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
O Relatório de Monitoramento Clínico do HIV, do Ministério da Saúde, aponta que as mulheres apresentam piores desfechos em todas as etapas do cuidado com a doença. Enquanto 92% dos homens estão diagnosticados, apenas 86% das mulheres possuem diagnóstico; 82% dos homens recebem tratamento antirretroviral, mas 79% das mulheres estão em tratamento; e 96% dos homens estão com a carga viral suprimida – quando o risco de transmitir o vírus é igual a zero – mas o número fica em 94% entre as mulheres.
“A desigualdade de gênero está na raiz do problema. O enfrentamento à incidência de infecções sexualmente transmissíveis [IST´s] e HIV/AIDS entre mulheres, especialmente, as mais jovens, deve ter como base uma política pública que envolva não apenas o Ministério da Saúde. É preciso enfrentar, por exemplo, no âmbito da educação, posições retrógradas que dificultam a abordagem da educação sexual nas escolas”, afirma a secretaria de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT Nacional, Jandyra Uehara.
Ela explica que a educação é ponto fundamental para combater a discriminação e desconstruir os preconceitos que acompanham o tema.
No mesmo sentido, a secretária de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora da CUT, Josivania Ribeiro Cruz Souza, afirma que é papel da CUT atuar para promover e proteger a saúde das mulheres em relação ao HIV.
“É uma questão de saúde pública e de direitos humanos, que afeta diretamente a vida das trabalhadoras e a sua capacidade de se manterem inseridas no mercado de trabalho de forma digna” diz a dirigente, elevando os principais motivos:
- Desigualdades de gênero: as mulheres enfrentam barreiras específicas no acesso à prevenção, diagnóstico e tratamento do HIV. Além disso, muitas vezes estão sujeitas a situações de violência e desigualdade que aumentam sua vulnerabilidade;
- Impactos no trabalho: a infecção por HIV pode prejudicar a saúde física e mental, além de gerar estigma e discriminação no ambiente de trabalho. Isso compromete a manutenção do emprego e o acesso a direitos trabalhistas;
- Estigma e discriminação: Mulheres vivendo com HIV enfrentam preconceitos que podem levá-las ao isolamento social, dificultando sua organização e luta por melhores condições de vida e trabalho;
- Falta de políticas específicas: muitas políticas de saúde e segurança no trabalho não contemplam adequadamente a dimensão de gênero ou as necessidades específicas das mulheres no enfrentamento ao HIV.
Promover a conscientização
A atuação sindical, diz Josivania, é essencial para informar, educar e mobilizar as trabalhadoras sobre direitos relacionados à saúde, prevenção e acesso ao tratamento, além de fortalecer o combate ao preconceito no local de trabalho.
“Ao promover ações e campanhas, a CUT pode contribuir para reduzir o impacto do HIV na vida das mulheres, fortalecer sua autonomia e garantir que o ambiente de trabalho seja um espaço de acolhimento e respeito”, ela pontua.
HIV/Aids
Dia Mundial de Combate ao HIV/Aids, o dia 1° de dezembro está no calendário de lutas dos 21 Dias de Ativismo pelo fim da Violência Contra a Mulher, campanha da Organização das Nações Unidas (ONU) da qual a CUT faz parte.
De acordo com o Relatório Global de 2023 do Unaids, programa da ONU, cerca de 39 milhões de pessoas em todo o planeta vivem com o HIV. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mulheres que sofreram violência física e sexual tem 1,5 vez mais probabilidade de contrair o HIV do que as que não sofreram esse tipo de violência.
Ainda de acordo com a OMS, entre as populações marginalizadas, como profissionais do sexo ou mulheres transexuais, uma alta prevalência de violência está ligada a taxas mais altas de infecção pelo HIV.
No Brasil, cerca de 990 mil pessoas vivem com o HIV, sendo 350 mil mulheres. O Sistema Único de Saúde (SUS) garante acesso integral e gratuito aos medicamentos para tratar os pacientes, além de fazer campanhas de enfretamento, testagem rápida e gratuita e dezenas de outras ações, que contribuíram, ao longo dos anos, para reduzir taxa de transmissão e mortalidade.
Informação que salva vidas
Ao Portal CUT, em 2022, o psicólogo Eduardo Oliveira, do Projeto Demonstrativo PrEP1519, e integrante de grupo de ativistas que atua nas redes sociais com o nome de Doutor Maravilha (@doutormaravilha no Instagram), para orientar, acolher e desconstruir preconceitos contra pessoas que vivem com o vírus, afirmou que não existe um rosto para o HIV.
“O HIV pode acontecer com qualquer pessoa, independe da classe, cor, expressão ou identidade de gênero”, diz Eduardo, que também atua em um Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) na cidade de São Paulo.
De acordo com ele, é importante que toda a sociedade tenha consciência sobre isso para que grupos sociais, como os heterossexuais, não se sintam “imunes” ao vírus. “Lá nos anos 1980, quando apareceu o HIV, havia a ideia muito forte de que existiam grupos sociais disseminadores [os gays] e a concepção de peste gay, castigo divino e a gente vem combatendo essa ideia porque ela afasta esses grupos, como os heterossexuais, de acharem que podem se infectar”, diz o psicólogo.
O conceito principal, portanto, é de que ninguém está imune e os métodos de prevenção têm de ser praticados por todos e todas.
Estigmas e preconceito
Um dos principais objetivos das campanhas realizadas durante o Dezembro Vermelho é justamente o combate ao preconceito. Quem vive com o HIV sabe a dor que sente. E, muitas vezes, o medo de ficar estigmatizado, sofrer preconceito faz com que a pessoas não façam o teste por medo ser positivo e ser visto pela família, pelos amigos e pelos colegas de trabalho como alguém a ser evitado.
Por isso acabar com o preconceito e garantir acesso ao tratamento e aos cuidados são fatores fundamentais para o enfrentamento ao vírus.
Indetectável = Intransmissível (I=I)
Quando a pessoa vivendo com HIV faz o uso correto dos medicamentos antirretrovirais, é muito provável que ela consiga o controle do HIV. Isso é medido regularmente pelo exame de carga viral, cujo resultado expressa a quantidade de vírus presente no sangue. Estima-se que, após seis meses do início do tratamento antirretroviral (TARV) adequado, o exame de carga viral tenha seu resultado “indetectável”.
O resultado indetectável quer dizer que não foi possível encontrar vírus naquela amostra de sangue. No entanto, as evidências científicas obtidas a partir de estudos que incluíram vários países, comprovaram que não há risco de transmissão do HIV por via sexual para as pessoas com adequada adesão aos antirretrovirais e com carga viral indetectável por pelo menos seis meses.
Significa, em outras palavras que a quantidade de cópias do vírus por mililitro de sangue é tão ínfima de modo que o HIV se torna intransmissível por vias sexuais.
De acordo com a Unaids, “a consciência de que o HIV não mais pode ser transmitido sexualmente pode dar a essas pessoas com carga viral indetectável um forte senso de que elas são agentes de prevenção em sua abordagem perante relacionamentos novos ou já existentes“.