Ives Gandra Filho é declarado persona non grata à magistratura trabalhista

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Publicado no Portal Jota – 

Ministro havia dito que Justiça do Trabalho pode acabar se juízes se opuserem à reforma. Veja reações

Durante o XIX Congresso Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (XIX CONAMAT), no último sábado (4/5), o ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Ives Gandra Martins Filho foi declarado persona non grata à magistratura trabalhista.

A moção de repúdio foi uma resposta à seguinte fala do ministro Ives Gandra Filho publicada pelo jornal Folha de S.Paulo:




“Se esses magistrados continuarem se opondo à modernização das leis trabalhistas, eu temo pela Justiça do Trabalho. De hoje para amanhã, podem acabar com [a Justiça do Trabalho]”.

Além da moção de repúdio a Ives Gandra Filho, os juízes do Trabalho aprovaram também uma carta em que afirmam que “a Reforma Trabalhista trouxe visível precarização das relações de trabalho”,  “sendo que a queda do número de ações trabalhistas trouxe consigo a diminuição da arrecadação de custas e contribuições previdenciárias pela Justiça Laboral, o que adensa as teses de extinção desse ramo especializado do Poder Judiciário”.

Amatra-2

No mesmo dia, a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região (AMATRA-2) emitiu uma nota de repúdio contra Ives Gandra Filho dizendo que “relacionar o posicionamento jurídico dos magistrados com a extinção da Justiça do Trabalho atenta contra sua independência funcional e, por conseguinte, contra o Estado Democrático de Direito”.

No WhatsApp circula uma carta aberta contra as declarações de Ives Gandra Martins Filho com mais de 1.500 assinaturas de magistrados, advogados e servidores da Justiça do Trabalho. O documento é encabeçado pelos juízes Valdete Souto Severo e Jorge Luiz Souto Maior.

Leia a íntegra das manifestações:

CARTA DE BELO HORIZONTE

As Juízas e Juízes do Trabalho, reunidos em Assembleia Geral por ocasião do 19º CONAMAT (Congresso Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), na cidade de Belo Horizonte (MG):

1. Reafirmam a absoluta necessidade de respeito à independência da Magistratura, à autonomia do Poder Judiciário Trabalhista e à dignidade da autoridade judiciária, respeitada sempre, no livre exercício da função jurisdicional em sua forma plena, a prerrogativa de aplicação do Direito mediante a interpretação da norma em conjunto com as regras e princípios constitucionais e suas hierarquias, assim como em concordância harmônica com os tratados e convenções internacionais de que o Brasil seja parte.

2. Declaram que a independência técnica do Juiz é garantia de cidadania e do Estado democrático de Direito, não podendo ser utilizada para barganhar a existência, a subsistência ou a persistência da Justiça do Trabalho.

3. Afirmam a importância e necessidade de existência da Justiça do Trabalho no Brasil como órgão do Poder Judiciário essencial ao funcionamento do sistema de Justiça e para a pacificação dos conflitos, reequilibrando as desigualdades sociais existentes, a exemplo de como ocorre em outros países, inclusive da Europa, como no caso da Alemanha.

4. Observam que a Justiça do Trabalho é a mais célere do País, considerando, inclusive, as pesquisas feitas pelo CNJ nas diversas edições do relatório “Justiça em Números”.

5. Alertam que a Reforma Trabalhista trouxe visível precarização das relações de trabalho, conforme índices oficiais já divulgados, referentes ao aumento de desemprego e da informalidade, sendo que a queda do número de ações trabalhistas trouxe consigo a diminuição da arrecadação de custas e contribuições previdenciárias pela Justiça Laboral, o que adensa as teses de extinção desse ramo especializado do Poder Judiciário. A defesa dos direitos laborais com seus princípios norteadores, é a razão de ser da Justiça do Trabalho. Mais do que pauta de interesse social é, também pauta de interesse corporativo.

6. Defendem a coesão e a unidade da Magistratura Trabalhista, como meio de fortalecer suas próprias prerrogativas, procurando adotar medidas que visem a impedir o divisionismo e que propiciem maior integração dos juízes do Trabalho em torno de seus objetivos.

7. Reiteram o compromisso com o estabelecimento da paridade entre juízes ativos e aposentados, atuando coletivamente e de forma intransigente para o restabelecimento de regimes remuneratório e previdenciário dignos, estáveis e sustentáveis, com integralidade para aposentados e pensionistas, de modo que alcancem todas as gerações de juízes e juízas do Trabalho.

8. Propugnam pela inclusão de pensionistas no quadro associativo, bem como defendem política que estimule a integração e participação de aposentados na vida institucional dos Tribunais, inclusive com a possibilidade de participação nas escolas judiciais e associativas.

9. Pugnam pelo aprofundamento da democracia nos Tribunais com a ampliação do colégio eleitoral, adoção de eleições amplas e diretas para os cargos de administração dos Tribunais do Trabalho, inclusive os de corregedor e vice -corregedor, conferindo direitos de votos aos juízes de primeiro grau.

10. Defendem o respeito à diversidade de gênero, comprometendo-se com a adoção de uma política associativa de inclusão e participação equânime em fóruns e eventos.

11. Alertam para a necessidade de adoção de gestão e políticas que visem à garantia de saúde e bem estar dos Magistrados, com participação da Anamatra na elaboração de estudos e encaminhamento de propostas para sensibilizar o CNJ, CSJT, TST e TRT’s.

12. Declaram, finalmente, o compromisso de manter a união da Magistratura, em especial a Trabalhista, buscando sempre novas conquistas e tratamento igualitário entre seus membros, com o horizonte voltado para a valorização da Magistratura nacional, da Justiça do Trabalho e do Estado Democrático de Direito.

Belo Horizonte, 05 de Maio de 2018.

 

NOTA DE REPÚDIO – ATENTADO À INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL DA MAGISTRATURA TRABALHISTA

A Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região – AMATRA-2, em razão da notícia veiculada no Jornal Folha de São Paulo com o título “Justiça do Trabalho pode acabar se juízes se opuserem à reforma, diz Ives Gandra”, datado de 03/05/2018, vem a público repudiar as declarações do ministro e, sem prejuízo a seu apoio à Nota da ANAMATRA – Associação Nacional dos Juízes da Justiça do Trabalho sobre o tema, manifestar-se nos seguintes termos:
1) A independência funcional da magistratura é garantia da própria sociedade brasileira, por possibilitar que cada magistrado ou magistrada decida conforme suas convicções, independentemente de qualquer interferência externa ou pressão política.
2) Nesse contexto, a existência de verdadeiro Estado Democrático de Direito depende da independência funcional da magistratura.
3) Por essa razão, relacionar o posicionamento jurídico dos magistrados com a extinção da Justiça do Trabalho atenta contra sua independência funcional e, por conseguinte, contra o Estado Democrático de Direito.
4) A AMATRA-2 reafirma sua posição em defesa à independência constitucional dos magistrados na aplicação do ordenamento jurídico e de acordo com a Constituição Federal vigente, segundo sua convicção motivada.
5) Enquanto houver Justiça do Trabalho, haverá equilíbrio entre as forças do capital e trabalho. E esse equilíbrio é de interesse de todos, quer trabalhadores ou empresas.
Diretoria da AMATRA-2
Fortalecer e Progredir!

Carta aberta a Ives Gandra da Silva Martins Filho

A sua afirmação de que a resistência à aplicação da chamada “reforma” trabalhista será a razão para o fim da Justiça do Trabalho é muito grave para que fique sem resposta.

Ao inocular o medo do fim da Justiça do Trabalho, imputando a responsabilidade pelos ataques que esse ramo do direito vem sofrendo àqueles que lutam justamente por sua sobrevivência e resistem a um texto legal que subverte sua razão de existência, o que se faz é tentar compelir magistrados trabalhistas a julgarem em desacordo com a ordem constitucional vigente e com sua independência.

Trata-se, em verdade, de uma ameaça: a de que a Justiça do Trabalho será extinta pelo fato de os juízes e juízas do trabalho cumprirem sua obrigação de não aplicar o puro texto da Lei 13.467/2017, sem filtrá-la a partir dos parâmetros constitucionais. E feita justamente enquanto a magistratura do trabalho está reunida em nível nacional para debater e deliberar acerca da interpretação e aplicação das alterações promovidas na CLT, negando, portanto, a importância da construção coletiva e democrática do direito.

Ocorre que o resultado concreto é inverso, pois não haverá sentido para que exista uma Justiça do Trabalho se sua função for meramente a de aplicar, fora de qualquer interlocução jurídica, um “código empresarial” nitidamente inconstitucional. Não haveria razão para a existência de uma Justiça do Trabalho de viés punitivo, que amedrontasse testemunhas e impedisse o exercício regular do direito de petição.

Não aceitaremos ameaças. Se aplicássemos a Lei n. 13.467/2017, especialmente para o efeito de obstar o acesso à justiça, faríamos com que a Justiça do Trabalho perdesse sua razão de existir.

Não há sentido para uma Justiça do Trabalho inacessível a demandas legítimas de trabalhadores e trabalhadoras.

Não é tolerável que se dissemine um discurso que responsabiliza a vítima por seu próprio sofrimento. Não somos ingênuos. O movimento pela extinção da Justiça do Trabalho tem íntima relação com a intenção e a prática dos autointitulados “pais” da “reforma”.

Todas as leis são interpretadas e aplicadas a partir de um filtro constitucional. Não há novidade nisso.

As ameaças não afetarão juízes e juízas, advogadas e advogados, procuradores e procuradoras do trabalho, servidoras e servidores e todos aqueles e aquelas que militam por uma sociedade em que os direitos sociais, notadamente os trabalhistas, sejam efetivos.

05 de maio de 2018.

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