Ex-presidente nunca escondeu a mágoa com a cúpula militar e deve esquecer a “lealdade” da caserna para tentar se safar da prisão quase certa, que deve ocorrer antes das eleições de 2026
Por Plinio Teodoro, compartilhado de Fórum
O indiciamento de Jair Bolsonaro (PL) por golpe de Estado, abolição violenta do estado democrático de direito e articulação com 36 membros da Organização Criminosa que tramou uma reedição do golpe de 64 no país é o primeiro passo de um caminho que deve levar o ex-presidente e a escória que levou ao Planalto à prisão.
Após a conclusão das investigações, a Polícia Federal enviou nesta quinta-feira (21) o relatório com mais de 880 páginas para o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, e para o Procurador-Geral da República (PGR), Paulo Gonet.
Antes mesmo de ter o documento em mãos, Gonet antecipou que, dada a complexidade da investigação, só deve emitir seu parecer em 2025, após as férias forenses. Ou seja, a partir de fevereiro.
Caberão ao PGR analisar e oferecer denúncias aos membros da quadrilha criminosa, alguns deles, como Bolsonaro e Mauro Cid, já indiciados em outros dois inquéritos em poder de Gonet: da falsificação nos cartões de vacinas e no contrabando das joias da Presidência para venda nos EUA.
Gonet alegou que estava aguardando o inquérito do golpe para emitir um parecer único, já que as outras duas investigações se interrelacionam e são citados no relatório da PF entregue nesta quinta-feira.
STF
Após os pareceres de Gonet, que já sinalizou que acatará os pedidos de indiciamento ao menos do núcleo duro do golpe, o processo seguirá uma tramitação rápida no Supremo Tribunal Federal, que pretende colocar a ação na pauta ainda em 2025.
Relator do inquérito na corte, Moraes já teria tido a adesão de uma parte dos ministros de que é necessário finalizar o julgamento dos golpistas em 2025 para evitar que o caso contamine e tumultue ainda mais o processo eleitoral em 2026.
A ideia é banir Bolsonaro da vida política e colocá-lo na cadeia para evitar até mesmo que o ex-presidente registre chapa no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O presidente já anunciou que sua estratégia passa por registrar a candidatura, com um dos filhos – provavelmente Flávio Bolsonaro (PL-RJ) – como vice para se colocar como anti-Lula em 2026.
Dessa forma, o ex-presidente provocaria o caos no processo eleitoral e tentaria, de todas as formas, colocar um de seus filhos na linha sucessória em meio ao racha na direita para saber quem será alçado como pós-Bolsonaro.
Defesa
Embora não tenha tido acesso ainda ao relatório da PF, o ex-presidente já trama com seus advogados a linha de defesa que deve apresentar em um provável julgamento pelo Supremo Tribunal Federal.
A análise da defesa é insistir que não há na investigação nenhuma “autorização” de Bolsonaro para desencadear o golpe de Estado.
Liderados por Paulo Amador da Cunha Bueno, um admirador confesso da Ditadura, monarquista e ex-integrante do Conselho de Administração da fábrica de armas Taurus, os advogados de Bolsonaro vão alegar que Bolsonaro, na verdade, teria sido pressionado a dar um golpe, mas que não teria dado aval ao processo.
Além disso, para tentar se sagar Bolsonaro deve retomar uma antiga rusga com os militares.
Convidado a sair do Exército após passar 15 dias preso em 1986 “por ter sido indiscreto na abordagem de assuntos de caráter oficial, comprometendo a disciplina” – sobre o artigo na Veja que pregava um motim na Força -, Bolsonaro nunca escondeu o desejo de vingança da cúpula das Forças Armadas.
Na presidência, sempre fez questão de bradar que era ele o “comandante em chefe” dos militares e chegou a trocar o comando das Forças Armadas por não aderirem aos seus desejos.
Agora, Bolsonaro deve adotar o discurso de que era “vítima” de um golpe que estava sendo armado pelos militares.
“Não era um golpe do Bolsonaro, e sim dos militares”, disse um interlocutor à coluna de Malu Gaspar no jornal O Globo. A declaração é um sinal de que Bolsonaro vai se defender dizendo que a trama golpista estava sendo armada sem seu consentimento por quadros das Forças Armadas, desprezando a tão cultuada “lealdade” da estrutura militar.