Por Ricardo Kotscho em seu Blog –
Não sei qual é o tempo de vida de uma pomba.
Mas essa da foto aí acima foi imortalizada, há exatos 40 anos, pelo fotógrafo Jorge Araújo, enquanto o Congresso Nacional votava a lei da Anistia.
Na noite de 21 de agosto de 1979, às 21h23, na praça da Sé, durante um comício em defesa da Anistia Ampla, Geral e Irrestrita, munido de uma câmera Nikon F-2, com objetiva 24 milímetros e filme Kodak 400, que seria revelado quatro vezes, o fotógrafo da Folha foi o único a ver e capturar, pousada sobre uma faixa da campanha, a pomba branca olhando para a multidão.
Foi no fotograma 23, ele lembra bem, “que eu construí o meu primeiro discurso em silêncio”.
A edição já estava fechada quando ele apareceu com a foto na redação.
Odon Pereira, então o secretário de redação, parou tudo para mudar a primeira página e abrir espaço para a “pomba da anistia”.
Três dias depois, nascia Filipe, o filho mais velho de Jorge Araújo, hoje também fotojornalista.
O que fica da vida de um jornalista são as histórias que temos para contar com textos ou imagens.
Jorge Araújo tem muitas pra lembrar, mas essa marcou para sempre sua vitoriosa e premiada carreira, porque foi o retrato de um divisor de águas entre a ditadura e a redemocratização do país.
Ao lado de outro veterano daquela época, o fotógrafo e editor Helio Campos Mello, revivemos aquele momento nesta quarta-feira, durante nosso almoço mensal na feijoada do Sujinho.
Jamais poderíamos imaginar, naquele dia, há 40 anos, que o Brasil viveria de novo uma guerra entre a civilização e a barbárie.
Hoje trabalhamos outra vez juntos fazendo reportagens para a Folha mas, em lugar da pomba branca, bandos de urubus sobrevoam a pátria amada, ameaçando nossa jovem democracia.
Uma das poucas vantagens de ficar velho nesta profissão é ter a memória das tragédias passadas para que elas não se repitam nunca mais.
Vida que segue.