Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite* –
Há 132 anos, na Província de São Pedro (RS), em 1º de janeiro de 1884, começou a circular um dos mais importantes jornais de cunho político-partidário no Brasil : “A Federação”. Com a missão de divulgar os ideários republicanos, este periódico se notabilizou, em sua primeira fase, por combater o regime monárquico, defender a criação de uma República Federativa no Brasil e o término da escravidão.
O jornal “A Federação” foi impresso até o dia 17 de novembro de 1937 quando se instalou a ditadura do Estado Novo (1937 -1945), sob o comando do presidente Getúlio Dornelles Vargas (1882-1954) que decretou o término do jornal. Em dezembro, daquele ano, por decreto foram extintos no Brasil os partidos políticos.
Circulando durante 53 anos, “A Federação” é fonte imprescindível em uma análise historiográfica sobre a propaganda republicana e a forma de como se estabeleceu, ao longo do tempo, o poder hegemônico do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR).
A sua origem remonta ao 1º Congresso Republicano de 1883, no qual o Partido Republicano Rio-Grandense (PRR), sob a égide da filosofia positivista, aprovou a criação de um jornal, cuja finalidade era divulgar e defender os ideais republicanos. O PRR era formado por jovens acadêmicos oriundos do curso de Direito de São Paulo ou Recife. Estes iniciaram, na Província de São Pedro (RS), intensa campanha política nas páginas de “A Federação”, cujo nome foi sugestão de Joaquim de Assis Brasil (1857-1938). Na militância partidária, por meio do jornal, destacaram-se: Joaquim Francisco de Assis Brasil (1857-1938), Júlio de Castilhos (1860-1903), Ramiro Barcellos (1851-1916), Venâncio Ayres (1841-1885), José Gomes Pinheiro Machado (1851-1915), Antônio Augusto Borges de Medeiros (1863-1961), Demétrio Ribeiro (1853-1933), entre outros nomes importantes do nosso cenário político.
Júlio de Castilhos (1860-1903) e seus companheiros republicanos eram chamados, pelo imperador D. Pedro II, de “os meninos“ do jornal “A Federação”. Esta geração teve os primeiros contatos com o Positivismo, em Porto Alegre, nas classes do Colégio Gomes que se localizava na Rua da Igreja, atual Duque de Caxias, nº 185. A jornalista Célia Ribeiro em seu livro “Fernando Gomes / Um mestre no século XIX”, na p. 56, comenta:
“As discussões filosóficas nas salas de aula do professor Fernando Gomes, alimentadas pelas revistas francesas com artigos sobre positivismo, causaram um impacto decisivo na geração de J. F. Assis Brasil, Borges de Medeiros e Júlio de Castilhos. Este ao ingressar na Faculdade de Direito de São Paulo, em 1877, já conhecia, ainda que superficialmente, os ideais positivistas, graças à semente plantada no Colégio Gomes”.
No final do século XIX, notoriamente a partir de 1870, o Brasil e o Rio Grande do Sul vivenciavam uma efervescência política. Com o fim da Guerra do Paraguai (1864-1870), duas importantes campanhas, ligadas entre si, ocuparam as páginas dos jornais: Abolição da Escravatura e a campanha em prol da República.
Os Partidos da época
Os embates ideológicos eram fomentados por meio de jornais político-partidários, que encontravam campo fértil diante da bipolarização das forças políticas na Província: liberais x conservadores e, a partir da difusão dos ideais republicanos, monarquistas x republicanos. O Partido Liberal defendia a autonomia administrativa e econômica para as províncias, enquanto o Partido Conservador preconizava pelo regime monárquico centralizador. Embora o discurso reformista, os liberais, quando estiveram no poder, no período de 1878 a 1885, mostraram-se tão conservadores quanto os seus opositores. Esta atitude reacionária possibilitou o surgimento de um novo partido de oposição na província, defendendo o ideário republicano.
Como não havia partido republicano estruturado na província, isto possibilitou aos jovens republicanos a criação, em fevereiro de 1882, do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR) sob a égide da filosofia positivista. A proposta do PRR era contemplar interesses para além daqueles da classe pecuarista – elite dominante do estado-, buscando cooptar as classes médias urbanas e o colonato. O PRR não teve sua origem, como ocorreu noutras províncias, de dissidências internas do Partido Liberal, pois este se apresentava dominante e organizado na província. No ano de 1885, o PRR elegeu Joaquim de Assis Brasil (1857-1938) – o seu primeiro candidato a deputado provincial-, e Júlio de Castilhos foi eleito presidente do partido.
O fortalecimento da vida partidária possibilitou aos políticos transformarem o jornalismo numa militância, na medida em que o jornal se constituía em uma tribuna doutrinária da opinião pública. De acordo com o jornalista Francisco Rüdiger, em seu livro “Tendências do jornalismo”, o papel dos jornais partidários era essencialmente opinativo, constituindo-se no que ele conceitua de caráter publicístico.
A longa trajetória de A Federação
A direção do jornal “A Federação” foi entregue ao paulista Venâncio Ayres (1841-1885). Embora Júlio de Castilhos (1860-1903), fosse indicado para o cargo de diretor do jornal, o mesmo assumiu a redação, em 16 de maio de 1884, após o afastamento do companheiro por motivo de saúde. A partir desse momento, ele iniciou, por meio de seus artigos, intenso combate ao sistema monárquico, cuja qualidade textual o consagrou como um dos maiores publicistas à sua época.
“A Federação”, “Orgam do Partido Republicano”, de acordo com a grafia da época, começou a circular, numa terça-feira, com quatro páginas, eventualmente seis, tendo o formato standart. As duas últimas traziam anúncios publicitários ou editais informativos. Com uma proposta doutrinária, o jornal não visava ao lucro, mas esclarecer a opinião pública sobre a necessidade de mudança em relação às estruturas vigentes que, de acordo com a ideologia republicana, não se adequavam aos novos tempos bafejados pela ideia de modernidade e progresso. Estes objetivos do jornal foram registrados no artigo “A Resolução do Congresso”, p. 01, publicado, na sua edição inaugural, em 1º de janeiro de 1884.
Quando começou a circular, o preço avulso do jornal era de 80 réis e circulava de segunda a sábado. Órgão de oposição à monarquia, “A Federação” enfrentou problemas financeiros, em seus primeiros anos, que se superaram pelo idealismo e dedicação dos que o sustentavam. Este idealismo se confirma numa carta de Venâncio Ayres, encaminhada à redação do jornal, em 1885:
“A Federação não pode morrer. É a única filha que tenho Já achei comprador para o meu pequeno pedaço de campo e para algumas vacas que possuo. Tudo isto é para A Federação. Aguentem a crise que não demorarei a enviar-lhes recursos.”
Apesar das dificuldades, na segunda metade de 1884, alcançou uma tirarem de 1800 exemplares. Em 1891, o crescimento do jornal lhe permitia ostentar, no seu cabeçalho: “A Federação é a folha de maior circulação no Rio Grande do Sul”.
O jornal, desde a sua fundação, contou com equipamento moderno de acordo com o anúncio publicado em setembro de 1884:
“TRABALHOS TYPOGRAPHICOS”
“As officinas da Federação estão montadas de maneira a poderem atender a toda a classe de trabalhos typographicos. Das casas de Deberny & C. e de Beaudoire & e C., de Paris, recebemos o que há de mais moderno em lettras, simples, de adorno e phantasia,vinhetas e mais material indispensável a impressões de toda a classe. Na prensa Utile, de Marinoni – a única que existe na província – a impressão faz-se com a maior nitidez. Um excellente motor systema allemão, aperfeiçoado pelos fabricantes,em Paris, move as machinas de impressão sendo rápido todo o serviço.”
“A Federação” se concretizou devido a um empréstimo de 9:000$000, sendo a sua quitação dividida entre alguns membros envolvidos no projeto da sua criação. Dentre os principais contribuintes, destaca-se a figura de Júlio de Castilhos. Ao afastar-se da direção do jornal, para solucionar problemas de ordem pessoal, necessitou cuidar da recomposição de seu patrimônio, comunicando suas dificuldades econômicas por meio de uma correspondência enviada, em 15 de maio de 1888, ao senador Pinheiro Machado (1851-1915).
Embora as dificuldades de ordem econômica, realizou-se uma ampla reforma em suas oficinas. Conforme nota publicada no jornal “A Federação”, de 01 de janeiro de 1887, ocorreu um fato bastante significativo: o jornal foi o primeiro a introduzir, na Província, o serviço noticioso telegráfico, contratado com a Agência Francesa Havas. Este serviço representou maior rapidez quanto à informação, tanto do centro do país quanto do exterior.
Na opinião do jornalista e pesquisador Francisco Rüdiger, “A Federação” tinha a capacidade de influenciar acontecimentos e não somente refleti-los. Cada edição era uma página de um Alcorão partidário, realizada com cuidados litúrgicos. O artigo de fundo era submetido à análise criteriosa do chefe do Partido, ou seja, do próprio líder Júlio Prates de Castilhos. Ser um assinante do jornal era a credencial de um verdadeiro republicano.
De acordo com o jornalista Sérgio Dillenburg, em “Quatro Publicações Marcantes no Jornalismo Rio-Grandense”, o programa do jornal “A Federação” foi elaborado por Antão de Faria, Assis Brasil e Julio de Castilhos, sendo publicado em seu primeiro número. Nele se registrou o objetivo do periódico:
“Discutir e sustentar a legitimidade e oportunidade do sistema de governo republicano no Brasil”.
Em relação à linguagem do periódico o programa determinava:
(…) ”será invariavelmente moderada e cortês, instruindo e persuadindo, tratando os adversários ou a quem quer que seja com delicadeza e cavalheirismo”.
Esta proposta do jornal foi muitas vezes transgredida, a exemplo do trecho, abaixo transcrito, acerca da morte do líder maragato, Gumercindo Saraiva (1852-1894), durante a Revolução Federalista ou da Degola (1893-1895):
“Pesada como os Andes, te seja a terra que o teu cadáver maldito profanou (…) Caiam sobre esta cova asquerosa todas as mágoas concentradas das mães que sacrificaste, das esposas que ofendeste, das virgens que poluístes, besta-fera do sul, carrasco do Rio Grande.”
O jornalista Júlio de Castilhos
O jornal reproduzia, em grande parte, o pensamento de seu criador, Júlio Prates de Castilhos (1860-1903), que preferia o manejo da pena ao discurso na tribuna parlamentar. Na opinião dos seus principais biógrafos, ele é considerado o “príncipe do jornalismo político”, pois inovou o jornalismo, trazendo o conceito de que a imprensa não precisa limitar-se apenas ao registro do acontecimento político, mas pode ser instrumento para modificar-lhe o curso. Sua experiência jornalística, como redator, provinha de sua atuação no periódico “A Evolução” (1879) jornal estudantil, gerado dentro do Clube 20 de setembro da Faculdade de Direito de São Paulo. Neste periódico, Júlio de Castilhos, com 19 anos, já combatia tenazmente o regime monárquico, conforme o trecho do editorial nº 3 de abril de 1879:
“Por mais que contestem os espíritos que persistem imprudentemente em não comprehender a irresistibilidade das leis históricas, por mais que se empenhem em demonstrar o contrário, por mais pertinazmente que procurem contrariar a corrente da Democracia n’este paiz, a verdade, a grande verdade é que a monarchia está agonizante no leito de morte” (…).
Julio de Castilhos marcou sua estreia como redator de “A Federação” por meio de uma série de importantes artigos, nos quais ele desconstrói o que denominou de “Sophismas Liberais”. Nestes editoriais, ele argumenta, justifica e demonstra o quanto a República é a forma ideal de governo e refuta de forma contundente todas as críticas lançadas, pelos monarquistas, em relação ao movimento republicano. Estes artigos ocuparam o editorial do jornal de fevereiro a junho de 1884. De acordo com a pesquisa dos jornalistas Antônio Hohlfeldt e Fábio Flores Rausch, foram analisados, no jornal “A Federação”, 16 artigos que se desenvolveram a partir de três princípios básicos: “Não temos homens para a República”, “Temos liberdade demais” e “O exemplo das Repúblicas Sul-Americanas”. Em relação ao primeiro sofisma, ele argumentou, em “A Federação”, de 29 de fevereiro de 1884:
“Sob a pena de atribuir-se a falta de homens no paiz à inferioridade da índole, de aptidões e das demais condições naturaes – o que fora um ridículo absurdo – é impossível deixar de filial-a directamente ao nosso regimen político. A monarchia é, pois, a causa que impede o apparecimento de homens capazes e enérgicos.”
O historiador Gabriel Borges Fortes, em “estudos históricos e outros escritos”, pág. 147, acerca do discurso de Júlio de Castilhos, registrou:
“(…) demoliu eficazmente as instituições monárquicas, com sua argumentação polêmica e segura.”
Os debates na imprensa
“A Federação” enfrentava oposição, especialmente, do jornal liberal “A Reforma” (1869-1912). Neste último, em suas páginas, ocorreram acirrados embates políticos entre o liberal e defensor do sistema parlamentarista Gaspar Silveira Martins (1835-1901) e o líder republicano e positivista Júlio de Castilhos. No ano de 1885, o Órgão do Partido Liberal “A Reforma” registrou, em suas páginas, memoráveis debates políticos entre o jornalista liberal e anticlerical Carlos Von Koseritz (1830-1890) e o líder republicano Júlio de Castilhos. O jornalista alemão Koseritz, graças à sua cultura, aliada à excelente produção jornalística, tornou -se um dos grandes nomes da nossa imprensa, defendendo os direitos do cidadão, especialmente os imigrantes alemães e a monarquia constitucional. Ele foi o responsável pela criação do importante jornal, em língua alemã, “Koseritz Deutsche Zeitung” (1881-1905). Este periódico defendia o direito de voto aos não católicos, que contava com o apoio do líder liberal Gaspar Silveira Martins (1835-1901).
Gaspar Silveira Martins governou a Província e foi exilado, na Europa, após a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889. Ao retornar para o Rio grande do Sul, ele fundou, em Bagé, em 1892, o Partido Federalista que defendia o sistema parlamentarista. Este partido reuniu os liberais maragatos (lenço vermelho), que haviam sido apeados do poder, fazendo em oposição acirrada aos Pica-Paus (lenço branco) que eram liderados pelo presidente do estado Júlio de Castilhos. O confronto bélico foi inevitável e eclodiu A Revolução Federalista ou da Degola (1893-1895) que deixou o saldo nefasto de 10.000 mortes.
O fortalecimento da vida partidária possibilitou aos políticos transformarem o jornalismo numa militância na medida em que o jornal se constituía em uma tribuna doutrinária da opinião pública. De acordo com o jornalista Francisco Rüdiger, em seu livro “Tendências do jornalismo”, o papel dos jornais partidários era essencialmente opinativo, constituindo-se no que ele conceitua de caráter publicístico.
O jornalismo partidário, ainda que distante do antigo modelo pasquineiro e panfletário, caracterizou-se pelo proselitismo ideológico ou publicista, cuja origem remonta às experiências do jornalismo inglês do século XVIII. Nele não faltou a agressividade da linguagem, nem o artigo de maior aprofundamento. Os jornais político-partidários à época discutiram princípios teóricos, apresentando propostas de governo e soluções para os problemas que assolavam a província e o resto da Nação.
Os jornais da época
A imprensa local à época era representada por jornais conservadores, a exemplo de “O Mercantil” (1874-1897), fundado por João Câncio Gomes (1836-1889) e por jornais de caráter liberal, como “A Reforma” (1869-1912), do líder liberal Gaspar Silveira Martins (1835-1901), que inaugurou, segundo Francisco Rüdiger, o jornalismo político-partidário na província gaúcha. Na mesma linha liberal, o “Jornal do Comércio” (1864-1911), fundado por Luis Cavalcanti de Albuquerque, destacou-se na época. Defendendo ideais republicanos, começaram a circular, no II Império, “A Democracia” de 1872, e “A Imprensa” (1880-1882). Este último era dirigido por de Apeles Porto Alegre (1850-1917). Em relação à propaganda republicana, o jornal “A Federação” (1884-1937) é, com certeza, o que mais atuou e destacou-se durante a luta em prol da República e após a sua consolidação.
A cisão partidária
Com o surgimento de dissidências no Partido Republicano Rio-Grandense (PRR) surgiu, em 13 de abril de 1891, o periódico “O Rio Grande”, trazendo o programa de um novo partido denominado Partido Republicano Federal (PRF). Este contou com a participação de figuras, como Demétrio Ribeiro (1853-1933), Antão de Faria (1854-1936) e Barros Cassal (1858-1903); além de reunir antigos liberais e conservadores. De acordo com o jornalista Sérgio Dillenburg, em “Quatro Publicações Marcantes no Jornalismo Rio-Grandense”, circulavam à época, em Porto Alegre, cinco periódicos, totalizando 56 jornais em todo o Rio Grande do Sul. A população gaúcha à época tinha menos de 500 mil habitantes.
A Propaganda Abolicionista
A propaganda abolicionista esteve presente na imprensa, constituindo-se numa das bandeiras políticas do Partido Republicano Rio-Grandense, por meio do seu jornal “A Federação”, visando à queda do regime monárquico. O Partido Liberal, monarquista e dominante, não se posicionava, com clareza, na questão servil, deixando o espaço aberto para ação dos republicanos. Estes assumiram uma marca de autonomia, no Rio Grande do Sul, em relação à abolição.
A obra “Abolicionismo: reformas nacionais”, de Joaquim Nabuco, foi referendada pelo jornal “A Federação”, em 17 de janeiro de 1884, denotando seu posicionamento antiescravagista. De acordo com o pesquisador e jornalista Carlos Reverbel (1912-1997), “A Federação” se destacou pelo pioneirismo de fazer uma imprensa sem literatura, tendo como meta a introdução do cientificismo positivista na propaganda jornalística. Em sua campanha abolicionista, o jornal vinculava o fim do regime escravocrata à queda da monarquia, afirmando que a manutenção do sistema escravagista era um dos fatores da péssima administração do império. Em oposição aos republicanos, muitos liberais defendiam a causa abolicionista, porém sem mudança do regime de governo.
“A Federação” defendia a abolição da escravatura de forma sumária. Este posicionamento contrariava aos que defendiam um processo gradual, mediante contratos de prestação de serviços. De acordo com o historiador Moacyr Flores, em seu livro “História do Rio Grande do Sul”, o jornal, no dia 05 de agosto de 1884, publicou um artigo de Júlio de Castilhos, no qual o mesmo discorda em relação à indenização ao senhor:
(….) “libertação sem indenização, porque não há perante o direito posse do homem sobre o homem”.
Os jornais abolicionistas na capital gaúcha
Além da incisiva campanha de “A Federação”, outros jornais na capital da Província de São Pedro aderiram em defesa da causa abolicionista: “O Mercantil” (1874-1897) criou uma caixa de emancipação, que, por meio de contribuições espontâneas, alforriava os escravizados; Entre os periódicos, que se inseriram na luta em prol da abolição, é importante, também, que se destaque: “A Reforma” (1869-1912), do Partido Liberal, que trazia artigos abolicionistas de Antônio Lara da Fontoura Palmeiro, e o “Jornal do Comércio” (1864-1911) que publicou artigos de Joaquim de Sales Torres Homem, Júlio César Leal, Aurélio Bittencourt e Damasceno Vieira. Estes colaboradores do “Jornal do Comércio” eram ligados à “Sociedade do Partenon Literário”, fundada, em 1868, por Apolinário Porto Alegre (1844- 1904) e Antônio Vale Caldre Fião (1824-1876). Sua criação antecedeu, em 30 anos, à fundação da Academia Brasileira de Letras (1898). Em 1869, iniciou uma campanha libertando menores; além de comprar uma gleba de terra que foi dividida em chácaras, sendo vendidas para comprar alforria de escravos, dando origem, mais tarde, ao Bairro Partenon.
Após essa intensa campanha, por meio da imprensa, no dia 07 de setembro de 1884, a Câmara Municipal de Porto Alegre declarou extinta a escravidão e alterou a denominação da Várzea para Campo da Redenção em alusão ao final da escravidão.
Os escravizados foram libertos sob a condição de trabalharem de graça para os seus antigos donos, num período de um a cinco anos, como forma de indenização. Alguns se tornaram forros sem ter de prestar serviços. Esta forma de indenização levou muitos afrodescendentes a viverem de esmola, pois trabalhavam de graça para garantirem sua liberdade. Na condição de escravizado, o proprietário lhe oferecia, dentro daquela realidade escravocrata, casa, comida, roupa e remédio; porém quando liberto restou-lhe a pobreza, o subemprego, o preconceito e a exclusão social devido ao despreparo para sobreviver numa sociedade competitiva e capitalista. Nossa sociedade ainda sente os efeitos de uma abolição que ocorreu sem inclusão social, porém, muitas vezes maquilado por um conceito de “Democracia Racial “.
A questão Militar
Outro fator importante que ocupou as páginas de “A Federação”, contribuindo para o desgaste do sistema monárquico, foi a “A Questão Militar”. Esta, que se iniciou, em 1884, remonta à insatisfação do Exército desde o atraso de soldos na Guerra do Paraguai (1864-1870). Intensificou-se a partir da proibição de militares de se pronunciarem de forma crítica, por meio da imprensa, em relação à política do império.
A Questão Militar foi uma sucessão de conflitos que atingiu seu ápice, entre 1884 e 1887, com a punição de Sena Madureira, comandante da Escola de Tiro, em Rio Pardo, e de Cunha Mattos. O presidente da província e comandante das Armas do Rio Grande do Sul, o alagoano Deodoro da Fonseca, recusou-se a cumprir a ordem que proibia a manifestação dos militares na imprensa. Júlio de Castilhos, de forma hábil, defendeu os militares, por meio de “A Federação”, cooptando a simpatia do Exército que se considerava desrespeitado e alijado de decisões importantes. “A Questão Militar” gerou uma crise que resultou no fortalecimento da campanha republicana.
No ano de 1885, a capital da província recebeu a visita do conde d’Eu e da princesa Isabel. Júlio de Castilhos, naquela ocasião, registrou no jornal ”A Federação” um violento manifesto ao regime monárquico, gerando repercussão nacional. Discutia-se a possibilidade da formação de um 3º Império, liderado pelo seu consorte de origem francesa. Havia o receio de que o Brasil viesse a ser governado por um estrangeiro. Não podemos nos esquecer de que o Brasil foi o único país monárquico e escravocrata num contexto de uma América republicana, constituindo-se “uma flor exótica na América”, de acordo com uma antiga definição, de autoria desconhecida, registrada na obra “Política e Cultura no Império Brasileiro” da professora Suely Robles Reis de Queiroz, da Universidade de São Paulo.
A campanha Republicana
O fim do regime monárquico e a implantação do republicano estão ligados a um conjunto de transformações que teve, a partir de 1870, um marco fundamental. Naquele ano começou a circular em 03 de dezembro, no Rio de Janeiro, o jornal “A República”, trazendo em suas páginas “O Manifesto Republicano”. Este foi uma declaração publicada por membros dissidentes do Partido Liberal (Luzias) encabeçada por Quintino Bocaíúva (1836-1912) e Joaquim Saldanha Marinho (1816- 1895) que resolveram fundar um Clube Republicano na capital do império. Devido ao seu caráter doutrinário, “A República” foi alvo dos monarquistas, sofrendo um empastelamento em 1873.
A historiadora Helga Piccolo, em suas pesquisas, confirma a participação de Júlio de Castilhos, escrevendo, em “A República”, entre junho e agosto de 1880. Esse jornal, impresso em São Paulo, tinha o mesmo título do seu homônimo carioca. Os jornais “A Evolução” (1879) e “A República” (1878-1882) eram dirigidos pelos acadêmicos de Direito do Largo de São Francisco.
O avanço do ideário republicano e a fundação de vários partidos republicanos, aliado às transformações vivenciadas por diversos setores da sociedade, nas últimas décadas do século XIX, acabaram desestruturando a monarquia. No ano da Proclamação da República (1889), havia 273 clubes republicanos e 77 jornais republicanos de acordo com o livro “História do Brasil”, de Raymundo Campos, p. 152.
A proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, é resultante, basicamente, da conjunção de três fatores: uma parcela do Exército, fazendeiros do oeste paulista e representantes das classes médias urbanas. Essas forças enfraqueceram a monarquia que se encontrava decadente. Um golpe militar, com o apoio de civis, derrubou a monarquia, em 15 de novembro de 1889, sob o comando do Marechal Manuel Deodoro da Fonseca (1827-1892).
O governo republicano no RS
No Rio Grande do Sul, o Partido Republicano Rio-Grandense (PRR) assumiu o controle da máquina administrativa, empossando o 1º presidente do estado, o visconde de Pelotas, por indicação do próprio Júlio de Castilhos. O marechal Câmara (visconde de Pelotas) – figura popular e militar-, garantiria o respeito e o apoio da elite gaúcha, ratificando a relação com o comando do Exército. O mesmo nomeou Júlio de Castilhos para o cargo de secretário do Interior e Justiça de Governo (1889-1891). Este fato permitiu a Júlio de Castilhos o controle da máquina governamental. Indicando pessoas para ocuparem cargos estratégicos no governo, ele controlava a máquina administrativa, excluindo a quem que não comungasse com suas ideias. De 1889 a 1891, organizou uma máquina político-administrativa que fortaleceu um partido monolítico, baseado na fidelidade de seus correligionários e na Guarda Cívica (1889) que passou, em 1892, a denominar-se Brigada Militar.
O Positivismo gaúcho
No primeiro pleito, indireto e republicano, Júlio de Castilhos foi o vencedor, sendo empossado em julho de 1891. Em 14 de julho do mesmo ano, data alusiva à “Queda da Bastilha”, Júlio Prates de Castilhos promulgou uma Constituição, escrita por ele, que possibilitava a reeleição sucessiva à presidência do estado. Seu governo, inspirado na doutrina positivista, tinha um caráter autoritário e centralizador, cujo princípio era melhorar conservando. Dentro deste contexto, O Rio grande do Sul se transformou numa pequena pátria positivista, na qual predominava uma única verdade, um partido e um ditador. O governo castilhista ficou conhecido como “Ditadura Científica”. A doutrina positivista combatia o idealismo e defendia a visão clara e científica da realidade, valorizando os fatos, despidos de qualquer conotação metafísica.
O pensamento positivista, que se originou do filósofo Augusto Comte (1798-1857), inspirou a Júlio de Castilhos e a maioria de seus companheiros. Pode-se afirmar que o positivismo foi adotado, como um catecismo, pelos que implantaram a República no Rio Grande do Sul. Em 1879, Júlio de Castilhos, ainda, estudante na Faculdade de Direito de São Paulo, escreveu:
“As sociedades obedecem ao influxo de leis tão exatas, precisas e invariáveis como as que regem os fenômenos transformadores do mundo físico… É que os fenômenos sociais estão sujeitos às leis naturais, como os fenômenos físicos. É que há também uma física social”.
No ano de 1887, Júlio de Castilhos e Demétrio Ribeiro publicaram, no jornal “A Federação”, o artigo “Augusto Comte, profissão de fé e expressão de convicções filosóficas” por ocasião dos 30 anos de falecimento do filósofo de Montepellier, ocorrido em 1857.
“Quando se estuda a obra de Augusto Comte com o cuidado que nos impõem os grandes assuntos, não se sabe o que mais admirar: se a grandeza do seu coração, se a vastidão de seu gênio”.
A Constituição de 1891
De acordo com o historiador Sérgio da Costa Franco, em seu ensaio “A Constituição Castilhista de 1891 e Sua Gênese”, o regime castilhista foi receptivo ao progresso material, pois demonstrou sensibilidade em relação aos problemas sociais, combatendo privilégios, inclusive os decorrentes de diplomas acadêmicos; além de assumir posturas liberais diante do movimento operário. Embora esses aspectos modernizantes, a estrutura política-institucional, que o mesmo impôs ao Estado, conflitava com a oposição, cujas manifestações políticas eram coibidas, alijando os opositores do convívio político.
A Constituição de 1891 é caso único na história do Brasil, considerando que duas insurreições tentaram derrubá-la: a Revolução Federalista (1893-1895) e a Revolução de 23. Não há registro de outra que tenha merecido maiores afagos, assim como tantas críticas. Seu artigo 7º é a própria manifestação do autoritarismo do seu autor:
“A suprema direcção governamental e administrativa do Estado compete ao presidente, que a exercerá livremente, conforme o bem público interpretado de acordo com as leis”. (Transcrito de um original de 1891 do Musecom).
A Constituição castilhista, embora centralizadora, defendia a liberdade de imprensa, conforme se registra em seu artigo 209:
“Todos podem comunicar os seus pensamentos por palavras escritas e publicá-las pela imprensa em toda a matéria, sem necessidade de censura prévia, ficando, porém, responsáveis pelos abusos que comentam no exercício deste direito, nos casos e pelo modo que a lei determinar”.
Ainda em 1891, em 03 de novembro, o marechal Deodoro da Fonseca (1827-1892) deu um golpe, fechando o Congresso Nacional. Sua atitude recebeu o apoio do presidente do estado Júlio de Castilhos, que lhe devotava simpatia, enaltecendo, no jornal “A Federação”, o proclamador da República (1889). Diante da crise, o vice-presidente da República Floriano Peixoto (1839-1895) procurou reverter o momento político, arregimentando comandantes militares. Sentindo-se pressionado, Deodoro da Fonseca é deposto. Em seguida, Floriano Peixoto, o “marechal de ferro”, passou a intervir nos estados que haviam apoiado Deodoro da Fonseca. A Guarnição do Exército, no Rio Grande do Sul, liderada pelo visconde de Pelotas, foi em maioria contra o fechamento do Congresso.
O Governicho
Diante dessa mudança no quadro político, Júlio Castilhos foi alijado do poder, e instalou-se no estado um governo provisório que ficou conhecido como “Governicho”. O próprio Júlio de Castilhos recebeu seus opositores no salão principal do Palácio do Governo, no qual o leiloeiro Ernesto Paiva os representou, comunicando que não havia mais confiança no governo e que o presidente deveria se afastar do cargo. A expressão “Governicho” foi dada por Júlio de Castilhos, referindo-se de forma pejorativa àquele momento de crise política. No período 12 de novembro de 1891 a 17 de junho de 1892, assumiu o governo um grupo dissidente, liderado por Assis Brasil, do Partido Republicano Federal, tendo o apoio dos federalistas (liberais). A oposição havia assumido o poder.
De acordo com a obra de João César Sampaio, “Coronel Sampaio e os apontamentos do Dr. Wenceslau Escobar”, ao renunciar, Júlio de Castilhos foi questionado a quem passaria o governo, tendo, então, respondido: “A quem? A ninguém? À anarquia”.
O historiador Sérgio da Costa Franco faz um registro bastante elucidativo, acerca desse período, em sua obra “A Guerra Civil de 1893”:
“O Governicho se revelou débil e inseguro, convocando eleições para depois adiá-las e promulgando provisoriamente uma constituição que se assemelhou em tudo à castilhista. Mas, por sentir-se fraco, resvalou para a violência, sobretudo no interior do estado (…)”.
Na Revista “A Defesa Nacional”, número 724, foi reproduzido um artigo do Marechal Caetano de Farias, no qual o autor resumiu a situação política desse período no Rio Grande do Sul:
“Existem três partidos. O mais numeroso e mais forte é o de Gaspar Silveira Martins, mas composto por republicanos e, sobretudo de monarquistas. O segundo é o de Júlio de Castilhos. É o menor que o primeiro, mas é coeso, disciplinado e composto exclusivamente de republicanos. O terceiro, que está no poder, é muito fraco e sobrevive das divergências dos outros dois”.
Nesta fase da política rio-grandense, em que a dissidência republicana tomou o poder, baixou-se um decreto proibindo o anonimato em qualquer artigo publicado na imprensa, gerando protestos em todo o estado. A polícia tinha o poder de prender extrajudicialmente quem desrespeitasse esta ordem. De acordo com a folha do poder constituído “O Rio Grande” de 26/03/1892:
(…) A imprensa não deve estar isenta de intervenção da polícia, que no entanto será muito simplesmente evitada desde que se cumpra a razoável exigência da lei.”
Durante o Governicho, que durou sete meses, “A Federação” atuou como órgão de oposição. Júlio de Castilhos escreveu artigos contundentes, combatendo o que denominava de anarquismo no estado, liderado por adeptos do antigo regime. O Governicho, no discurso castilhista, constituía-se em grave ameaça à instituição republicana recém-instalada. Segundo Wenceslau Escobar (1857-1938), de 17 de junho a 27 de setembro de 1892, ocorreram, no Rio Grande do Sul, 134 assassinatos por motivos políticos. Em seus artigos, em “A Federação”, Júlio de Castilhos elogiava o Exército, enfatizando que seu retorno ao poder garantiria a legalidade da instituição republicana. Seus argumentos, por meio de “A Federação”, ecoaram na capital federal, resultando na sua recondução à presidência do estado.
As eleições de 20 de novembro de 1892, acusadas de fraudulentas, conduziram Júlio de Castilhos, novamente, ao poder. Empossado, em 25 de janeiro de 1893, ele foi eleito em pleito direto com 26.377 votos, num eleitorado de 73.762 alistados, com abstenção da oposição. Eleito, Júlio de Castilhos se afasta da direção do jornal, na qual permaneceu por quase oito anos.
“A Federação” (1884-1937), em seus 53 anos de existência, esteve presente em momentos cruciais da política regional e nacional, a exemplo das Revoluções de 1893, 1923, 1924, 1930 e 1932.
“A Federação” ganha nova sede
No dia 6 de setembro de 1922, durante as Comemorações do Centenário da Independência do Brasil (1822-1922), foi inaugurado, em Porto Alegre, um novo prédio, para sediar o jornal “A Federação” (1884-1937). Naquela ocasião, Lindolfo Leopoldo Boekel Collor (1890 -1942) -avô de ex-presidente Fernando Collor de Mello-, era o diretor do jornal. O prédio sediou após o encerramento de “A Federação”, o Jornal do Estado e o Diário Oficial do Estado que passou, em 1973, a ser impresso pela Companhia Rio-Grandense de Artes (CoRAG) A partir de 10 de setembro de 1974, o prédio se tornou sede do Museu da Comunicação Hipólito José da Costa (Musecom) que foi fundado pelo jornalista Sérgio Dillenburg com o apoio incondicional da Associação Riograndense de Imprensa (ARI) e de seu presidente Alberto André (1915-2001). Neste ano de 2016, a instituição completa 42 anos de atividades junto à comunidade cultural do estado.
Neste local circularam as mais importantes personalidades do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR) sob a batuta do Presidente do Estado Antônio Augusto Borges de Medeiros (1863-1961). Sua construção ficou sob a responsabilidade do engenheiro civil Theófilo Borges de Barros da tradicional Escola de Engenharia de Porto Alegre, conforme o registro do arquiteto Fernando Corona (1895-1979) na “Enciclopédia Rio-Grandense”, organizada, em 1957, por Klaus Becker. A escultura alusiva à imprensa, ao alto do prédio, é da autoria do escultor italiano Luiz Sanguin (1877-1948). Restaurada, em 1995, pelo escultor João Carlos Ferreira, da equipe da Brigada Militar, contou com o apoio e supervisão do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE). O prédio é Patrimônio Histórico do Estado, desde 1977, quando foi tombado.
Durante a Revolução de 30, que colocou Getúlio Vargas (1882-1954) na presidência do Brasil, dirigia “A Federação” João Carlos Machado. Este permaneceu na direção do jornal até a cisão ocorrida no Partido Republicano Rio-Grandense, por ocasião, em São Paulo, do Movimento Constitucionalista de 1932. Desta cisão surgiu o Partido Republicano Liberal liderado por Flores da Cunha (1880-1959) e do qual “A Federação” passou a ser o porta-voz.
Em janeiro de 1933, pelo decreto nº 5.240, o velho órgão republicano foi adotado como Diário Oficial do Estado. Em maio de 1935, “A Federação” anunciou o surgimento do Diário Oficial do Estado. Com esta separação, o jornal voltou a ser um órgão partidário com o subtítulo órgão do Partido Republicano Liberal.
Os últimos dias de “A Federação”
“A Federação”, embora o seu caráter notoriamente político, destacou- se também pela sua forma moderna de divulgar notícias esportivas, culturais e sociais. Em outubro de 1937, foi criada uma sucursal do jornal no Rio de Janeiro, porém as crises financeiras, atritos partidários e a concorrência com outros periódicos, a exemplo do Correio do Povo, dificultavam a sustentação do jornal. O jornal contou, em sua direção, com nomes importantes: Venâncio Ayres (1841-1885), Ramiro Barcelos (1851-1916), Othelo Rosa (1889-1956), Otávio Rocha (1877-1928), Lindolfo Leopoldo Boekel Collor (1890 -1942), Moysés Vellinho (1902-1980), entre outros expoentes da nossa cultura.
“A Federação” x “Correio do Povo”
Diante dos problemas enfrentados pelo jornal “A Federação”, o “Correio do Povo”, o mais antigo jornal ainda em circulação, na capital, declarava que a “jararaca” (“A Federação”) havia perdido “o veneno”. Como resposta, “A Federação” afirmava, ao seu concorrente, que, embora este se apresentasse como apartidário, na realidade, tratava-se de uma “folha maragata disfarçada”. Esta resposta de teor irônico, ao Correio do Povo, era devido ao fato de que o pai de Caldas Júnior (1868-1913), maragato convicto, havia sido fuzilado, em 1894, em Desterro (SC), durante a Revolução Federalista (1893-1895). O próprio Caldas Júnior havia sido revisor e noticiarista, no período 1885 a 1888, do jornal maragato “A Reforma” (1869-1912), que era tenaz opositor de “A Federação”. Caldas Júnior também dirigiu “A Reforma” (1869-1912) até o ano de 1891. Esta trajetória, do fundador do Correio do Povo, justifica a ironia do seu concorrente “A Federação”.
Com a criação do Estado Novo (1937-1945), Getúlio Vargas (1882-1954) decretou o fechamento de “A Federação” devido a conflitos políticos com os correligionários de tantas lutas partidárias, como Borges de Medeiros (1863-1961) e Flores da Cunha (1880-1959). A dissidência, ocorrida no âmago do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR), que resultou na criação do Partido Republicano Liberal, discordava da política centralizadora, na forma de ditadura, que o presidente Vargas impusera ao País. Assim encerrou–se a trajetória de um periódico que, em suas páginas, registrou a história dos republicanos e do positivismo gaúcho. Escrita por homens que dominaram, durante muitos anos, o cenário político do Rio Grande do Sul, “A Federação” (1884-1937) se constitui num importante marco histórico da nossa política regional e nacional.
Pesquisador e Coordenador do setor de imprensa do Musecom*
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