Juízes de Direito ou Estrelas de capa de revista?

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Por Wagner Francesco, Do JusBrasil, no Jornal GGN – 

Juiz Sergio Moro e sua mulher (Foto: Lilian Quaino/G1)

Uma notícia chamou-me a atenção: Juiz da Operação Lava Jato, Sergio Moro, ganha prêmio de personalidade do ano do Jornal ‘O Globo’




Se me permitem começar com minha opinião simples e direita, eis qual é:

Horrível. Péssimo exemplo. Primeiro porque ele está cumprindo com suas obrigações como Juiz e não como personalidade famosa; e, segundo – e o principal – porque isto incentiva o Juiz a trabalhar e a dar sentença que agrade a mídia só pra receber prêmios: e assim teremos um judiciário em busca de holofotes e não do cumprimento da lei.

Passemos, pois, a explicar.

Não é função do Juiz de Direito estar na mídia, mas acontece que ele acaba indo nesta onda muitas vezes sem querer, por força realmente do fato ocorrido e de como este fato seduziu os meios de comunicação e, principalmente, de como tudo isto é vendido para o povo e gerado lucro. Tranquilo até aqui. O problema é quando se busca os holofotes, se acostuma com capas de revistas e com a trágica transformação de herói.

Por que o Dr. Moro é agraciado como personalidade do ano pelo Jornal “O Globo”? É porque realmente é um juiz competente e cumpridor de suas funções ou porque, aliado a estes atributos, toma as decisões que a mídia, em particular o interesses deste Jornal, deseja? Ninguém dá prêmio a quem pensa diferente da ideologia de quem premia. E Dr. Moro, sabemos todos nós, não é muito fã de medidas impopulares. Pra não ficar de fora dos holofotes e deixar de agradar aos donos das revistas, o excelentíssimo juiz chegou a dizer que “a formalidade processual não tem a menor relevância”. Como não? Quando alguém diz isto é porque tem medo de seguir o processo e, no cumprimento do ordenamento, tomar decisões que não geram aplausos.

Mas continuo insistindo, mesmo que me torne repetitivo e chato: Juiz assume cargo pra cumprir a lei e não pra fazer a vontade da mídia – ou do povo: que não tem vontade, mas segue o que a mídia diz. E acerca disso o Ministro Teori Zavascki já sinalizou:

“Quem tem que aferir a vontade do povo são os integrantes de poderes do Estado que são eleitos com essa missão. O dever do juiz é aplicar as leis, as regras legítimas. […] O papel do juiz é fazer juízo sobre a legitimidade dos atos em face de normas. Ele tem de levar em conta as regras estabelecidas, até porque é muito complicado imaginar que um juiz possa avaliar, em um julgamento, o que seja a opinião do povo” Fonte: Conjur

Como não encontrar menor relevância na formalidade processual? O problema é que o Dr. Moro faz o papel de Juiz “carrasco”, que condena, durão etc., mas… O problema é que o Direito Processo Penal não dá esta liberdade pra o magistrado. Pelo contrário, como afirma Ada Pelegrini Grinover,

“o processo penal não pode ser entendido, apenas, como instrumento de persecução do réu. O processo penal se faz também – e até primacialmente – para a garantia do acusado. (…) Por isso é que no Estado de direito o processo penal não pode deixar de representar tutela da liberdade pessoal; e no tocante à persecução criminal deve constituir-se na antítese do despotismo, abandonando todo e qualquer aviltamento da personalidade humana.”

Embora o clamor popular seja pelo sacrifício dos réus – e por isto a popularidade do meritíssimo anda no topo – o processo penal também protege os acusados. Só que, se para o Dr. Moro a formalidade do processo fosse relevante, algumas decisões seriam tomadas e não seriam populares e nem agradaria aos editores dos grandes meios de comunicação de nosso país.

Mas também não vou crucificar o Dr Sergio Moro sozinho e nem a revista que o premiou; isto porque para alguns o citado juiz é um perseguidor, mas quando outro juiz dá decisão diversa, aí também se torna herói, cumpridor da lei. O juiz não tem obrigação de agradar ideologias ou paixões políticas-partidárias. Ele está ali pra exercer a pacificação social e não para gerar mais atrito. E afirmo: quando se busca holofote, se escolhe lado e intensifica discórdia.

É pra cumprir a lei e não pra agradar a mídia e virar capa de revista que um juiz de Direito assume o cargo. Não é pra virar herói, não é pra ser salvador, não é pra ser artista de televisão que o Estado paga um bom salário, dá vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade ao magistrado, mas pra ele ser autônomo e ter compromisso com apenas uma coisa: com a formalidade processual. Buscai primeiro a formalidade processual e todas as outras coisas vos serão acrescentadas.

Finalizo e repito: prêmios assim enfraquecem a democracia, porque faz o servidor público olhar para si e para as câmeras e não pra o Direito e as leis.

Juiz não é herói, mas submisso à lei – agora, num Brasil onde magistrado é Deus, de repente eu acabei de blasfemar… Como se dizia na Monarquia Absolutista: Je suis la Loi, Je suis l’Etat; l’Etat c’est moi.

*Wagner Francesco, teólogo e acadêmico de Direito.

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