Por Paulo Eduardo Dias, compartilhado de Ponte Jornalismo –
Juiz entendeu que argumentos oferecidos pelo Ministério Público são “genéricos”; no entanto, soldado que matou o ajudante Rogério Ferreira teve o porte de arma suspenso
A Justiça de São Paulo negou o pedido de prisão preventiva do soldado da Polícia Militar Guilherme Tadeu Figueiredo Giacomelli, 22, responsável pela morte do ajudante geral Rogério Ferreira da Silva Júnior, 19. O jovem foi morto com um tiro nas costas no dia 9 de agosto, ao sair de casa com a moto de um amigo para comemorar seu aniversário que ocorria naquela mesma data. Ele foi baleado na Avenida dos Pedrosos, no Parque Bristol, zona sul da capital paulista.
Em seu despacho, o juiz Roberto Zanichelli Cintra, da 1ª Vara do Júri, sustentou que os “argumentos oferecidos pelo [Ministério Público] são genéricos e baseiam-se, tão somente, na gravidade abstrata do delito, sem apontar a imprescindibilidade da custódia cautelar como medida de proteção ao bom andamento da instrução”. O magistrado seguiu a linha traçada pela defesa do PM, realizada pela advogada Flávia Artilheiro, de que “não há contemporaneidade entre os fatos e o pedido, nem sequer o surgimento de qualquer fato novo que o justifique, o que demonstra a ausência do necessário para o risco da ordem pública”.
Para o promotor Neudival Mascarenhas Filho, o tiro disparado pelo soldado Giacomelli, pertencente à 4ª Companhia do 46° BPM/M (Batalhão de Polícia Militar Metropolitano), foi “cometido mediante recurso que dificultou a defesa do ofendido, que foi atingido pelas costas quando pilotava uma motocicleta, sem qualquer possibilidade de defesa”.
O promotor ainda pontuou que o soldado Giacomelli e seu parceiro Renan Conceição Fernandes Branco, 36, tentaram enganar seus superiores, ao informar que se tratava de uma ocorrência de trânsito. “É dos autos, ainda, que os policiais Guilherme e Renan, em seguida, modularam via Copom e solicitaram apoio alegando que se tratava de acidente trânsito, escondendo o disparo de arma de fogo. Procuraram, assim, inovar artificiosamente o estado de lugar, de coisa ou pessoa, com o intuito de induzir a erro o juiz ou o perito, para produzir efeito em processo penal”.
Sobre a tentativa de enganar seus superiores sobre o que de fato provocou os ferimentos em Rogério, a dupla de PMs responde na Justiça Militar por fraude processual. No entanto, o juiz Roberto Cintra requisitou que o processo passe para a esfera civil, uma vez que entende que tudo está interligado.
Se por um lado o juiz da 1° Vara do Juri negou o pedido de prisão, ele entendeu que Giacomelli deve ter o porte de arma suspenso, determinou o recolhimento de todas as suas armas, além de se manter distante de testemunhas e familiares da vítima, sob pena de ter a prisão preventiva decretada em caso de descumprimento de quaisquer dos itens.
À reportagem da Ponte a mãe de Rogério, a cabeleireira Roseane da Silva Ribeiro, 44, se demonstrou revoltada com a notícia de que o PM que assassinou seu filho vai seguir livre. “Meu Deus, eu não acredito. O juiz negou a prisão dele? Eu não acredito nisso. Eu acho um absurdo. Um absurdo. Que país é esse? Que país é esse que a gente vive? Uma justiça permitir que um assassino fique na rua para cometer outros erros. Eu não aceito. Eu não posso aceitar isso. Isso é um absurdo. Isso não é Justiça. Uma falta de consciência. Eu não tenho palavras”.
Segundo o médico legista Thiago Torossian Martins Fontes, o disparo efetuado pelo soldado Guilherme Giacomelli entrou pelas costas, transfixou o pulmão e saiu na altura do mamilo esquerdo. Sobre a trajetória do disparo, o médico da Polícia Técnico Científica escreveu que foi feito da “direita para esquerda, posterior para anterior, de baixo para cima”.
A dupla de PMs já esteve detida no Presídio Militar Romão Gomes, na zona norte, em virtude da fraude processual.
Quando da prisão, no início de setembro, o juiz Ronaldo João Roth, da 1ª Auditoria do Tribunal de Justiça Militar afirmou que a versão narrada pelos policiais apresentava falhas comprovadas pelos canais de comunicação da PM e que a detenção de ambos pretendia evitar interferências nas investigações.
No entanto, os soldados Guilherme Tadeu Figueiredo Giacomelli e Renan Conceição Fernandes Branco foram soltos pelo mesmo magistrado no início de outubro.
A morte
Rogério Ferreira da Silva Júnior completou 19 anos no domingo (9/8). Segundo familiares, ele havia saído de sua casa, no Parque Bristol, na zona sul da cidade de São Paulo, dirigindo uma motocicleta, para encontrar um grupo de amigos com quem pretendia comemorar a data. Na Avenida dos Pedrosos, às 17h50, foi abordado por policiais militares, da Rocam (Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas) do 46º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano, e morto com um tiro.
Um vídeo obtido pela reportagem mostra o que seria o momento da morte de Rogério. Três motocicletas aparecem nas imagens do circuito de segurança, duas com PMs e uma com Rogério. O jovem diminui a velocidade da moto até parar. No momento seguinte um dos policiais atira em Rogério, que cai.
A versão dos policiais Guilherme Tadeu Figueiredo Giacomelli e Renan Conceição Fernandes Branco é de que patrulhavam a região do Parque Bristol quando viram Rogério em sua moto e ele fugiu. Durante a perseguição, contam os PMs à Polícia Civil, Rogério teria feito “menção de colocar a mão na cintura como se estivesse armado”. O PM Giacomelli, então, decidiu atirar por entender que estava “diante de uma iminente agressão”.
Na ocasião, o secretário da Segurança Pública de São Paulo, general João Camilo Pires de Campos, mentiu ao dizer que a moto pilotada por Rogério seria “fruto de roubo”.