“Sabe por que as pessoas gostam de violência? É porque faz você se sentir bem”.
Em tempos de Parlamentares movidos por uma massa ensandecida de ódio, que fazem de seus mandatos uma luta diária contra a população LGBT, seja condenando a ditadura gay (?), ou criminalizando a cristofobia (?!), é interessante assistir uma obra que retrata o passado, mas que ainda representa um ranço de homofobia cada vez mais atual.
O “Jogo da Imitação” (The Imitation Game) destaca o trabalho e vida de Alan Turing (interpretado por Cumberbatch), matemático britânico responsável pela missão de quebrar o inquebrável código nazista da 2ª Guerra Mundial. Os nazistas baseavam sua criptografia de mensagens no aparelho Enigma, que mudava suas combinações a cada dia, gerando trilhões de possibilidades de códigos, e cuja decodificação era humanamente impossível. Turing, então, parte justamente desse raciocínio para construir uma máquina que supere a outra.
Trocando em miúdos, o computador, usado por mim e por você que lê este artigo, basicamente saiu de suas mãos. Sua genialidade é parte relevante do filme, mas não é a protagonista da obra.
O processo de criação do computador é um grande pano de fundo para a real aflição da vida de Turing: ser homossexual em uma Inglaterra homofóbica que criminalizava amar outra pessoa de mesmo gênero. Extremamente reprimido, Turing é antissocial; tem dificuldades para interagir com outras pessoas, fato que lhe causou sofrimento desde sua infância.
O convívio com a opressão lhe vale uma frase dita já nas primeiras cenas do filme: “Sabe por que as pessoas gostam de violência? É porque faz você se sentir bem”. A frase é um golpe duro em quem se vale da opressão para seguir a vida. Nada é mais delicioso do que o gozo da violência sobre outra pessoa, negando sua humanidade, seu exercício regular de qualquer direito.
Há poucos anos atrás, parlamentares “pela família” subiram à tribuna enfurecidos com o que chamaram de Kit Gay, um material informativo escolar que visava combater a homofobia. O resultado foi o sepultamento da conscientização, para que se prevaleça o status quo, ou seja, a violência de sempre.
Há poucos dias atrás, Rafael Melo, um estudante de 14 anos, morreu a pauladas e pedradas em Cariacica, região metropolitana de Vitória, no Estado de irônico nome: Espírito Santo. O motivo era que Rafael era afeminado, gostava de costurar e queria ser estilista.
Turing não chegou a ser apedrejado, mas fora condenado pelo Justiça à castração química, para suprimir seus gostos estranhos. Um dos maiores gênios do Século XX suicidou-se porque, além de emocionalmente miserável, não tinha tido seu trabalho reconhecido. Tudo porque gostava de homens. É absolutamente triste ver como sua morte, como também de todas as outras vítimas de homofobia, não significam mudanças nesse Brasil tão fundado no ódio.
Brenno Tardelli é diretor de redação do Justificando.