Lava Jato: A história de pirataria que envolve o pai da juíza Gabriela Hardt

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Jornalista Leandro Demori denunciou o obscuro negócio de Jorge Hardt Filho, pai da magistrada amiga de Sergio Moro, que foi ignorado pela tendenciosa operação de Curitiba

Créditos: Divulgação Petrobras – Planta da Petrosix

Por Iara Vidal, compartilhado da Revista Fórum




Uma trama digna de um seriado policial que envolve o engenheiro químico Jorge Hardt Filho, pai da juíza federal Gabriela Hardt, descambou para investigações sobre pirataria industrial, uso indevido de documentos secretos e armações contra a Petrobras. Mas o caso foi solenemente ignorado pela Operação Lava Jato.

A denúncia foi feita pelo jornalista Leandro Demori em sua newsletter semanal A Grande Guerra, publicada nesta quarta-feira (5).  Depois da reportagem publicada  o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, determinou que seu próprio gabinete lidere uma investigação para apurar possíveis roubos de informações confidenciais da petroleira.

No texto, Demori relata que em fins de abril de 2007 a Petrobras emitiu uma autorização incomum para o engenheiro químico Jorge Hardt Filho entrar com o computador pessoal dentro das dependências da  Gerência de Engenharia da Petrobras SIX, Unidade de Industrialização de Xisto da petroleira, em São Mateus do Sul (PR).

Hardt conhecia bastante a fábrica, pois foi um dos primeiros a chegar na planta industrial da SIX no começo dos anos 1970. Depois de se aposentar da estatal, em 2007, ele passou a atuar como consultor de empresas privadas do setor.

Pouco mais de um ano depois, Hardt foi contratado pela Engevix, empreiteira que ficou famosa por ser uma das investigadas durante a operação Lava Jato – seus diretores e o presidente foram presos sob ordens do então juiz Sergio Moro. 

Em setembro de 2009, o nome engenheiro foi autorizado a ter acesso a “documentos classificados como corporativos, reservados e confidenciais”. Havia um propósito: a Petrobras queria vender a tecnologia Petrosix mundo afora. https://2d294a8d17fb788b32fa55bbfe191bdf.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-40/html/container.html?n=0

Em junho de 2008, a estatal assinou um contrato com a Engevix para tentar negociar o Petrosix em outros países. Foi graças a esse contrato que Hardt e os demais tiveram acesso aos documentos internos da empresa que contavam todos os segredos da tecnologia.

O contrato de 18,2 milhões de dólares determinava que a Engevix levaria o Petrosix para ser negociado no Marrocos, nos Estados Unidos e na Jordânia. 

Dois anos depois, ao fim do contrato, os projetos do Marrocos e dos EUA foram abandonados. Mas na Jordânia a prospecção andou e a Petrobras foi autorizada a estudar a exploração de reservas de xisto na área de Wadi Maghara, a segunda melhor do país.

Passada de pernas monumental

No entanto, a estatal brasileira precisava de um parceiro para dividir os custos e os riscos da operação. Então, em fevereiro de 2011 a petroleira firmou acordo com o Forbes & Manhattan, um banco canadense com participações ou operações em mineradoras pelo mundo. “O que parecia um salto em direção ao globo se mostraria, em pouco tempo, uma passada de pernas monumental”, escreveu Demori.

Em setembro de 2012, o gerente geral da SIX, Jose Alexandrino Machado, revelou que a empresa Irati Energia, controlada pelo grupo Forbes & Manhattan, estava divulgando no mercado global ser detentora de uma tecnologia que, nas palavras dele, era uma “Petrosix melhorada”.

Espionagem industrial

Machado mostrou imagens comprovando que a Irati exibia em seus prospectos informações privadas retiradas de dentro da Petrobras SIX. Disse ainda que a empresa teria requerido, poucas semanas antes, licença para pesquisa e mineração de áreas próximas à planta da SIX no Paraná, região que estava mapeada apenas em estudos geológicos confidenciais realizados pela própria Petrobras SIX. 

As conversas com a Forbes & Manhattan, relata Demori, foram interrompidas naquele mesmo dia. “Aprofundando a investigação, os funcionários da Petrobras descobriram mais um movimento dos canadenses: por meio de outra de suas controladas, a Forbes estava tentando explorar xisto na Jordânia, justamente o país onde Petrobras e Forbes mantinham parceria para exploração conjunta”, mostra a matéria. 

“Mais tarde, viria à tona que o próprio governo jordaniano questionara os canadenses, em uma reunião ocorrida no começo daquele ano de 2012, para que a empresa esclarecesse a razão de o grupo estar buscando explorar a mesma área por duas vias diferentes. A Forbes mostrava uma mão e escondia a outra”, revelou o jornalista.

As suspeitas de pirataria logo recaíram sobre Hardt e os ex-colegas de Petrobras. A suspeição foi intensificada quando a petroleira fez uma busca por novos requerimentos de patente no Brasil e no exterior. Os três apareciam como requerentes de patentes de um processo muito semelhante ao Petrosix, chamado Prix. Nas descrições comerciais do Prix, ele era apresentado como um processo “com mais de 30 anos de comprovada operação”. ” 

“O Prix, na verdade, jamais foi testado na prática. É, até hoje, um projeto em papel. Os ‘mais de 30 anos de comprovada operação’ se referem, obviamente, ao Petrosix. O Prix era, de fato, um ‘Petrosix melhorado'”, escreveu Demori.

Informações privilegiadas

A Grande Guerra revelou ainda que, em novembro de 2012, a Petrobras criou um grupo para investigar o caso. Em um relatório sobre o caso, a empresa foi taxativa: “as evidências apontadas permitiram identificar que as empresas IRATI ENERGIA, FORBES ENERGY e GOSH, todas vinculadas ao grupo FORBES & MANHATTAN, utilizaram-se de informações privilegiadas”. 

O documento apontou também que os contratados da Engevix João Carlos Gobbo, Jorge Hardt Filho e João Carlos Winck foram as pessoas que tiveram acesso às informações usadas ilegalmente pela Forbes & Manhattan.

Apesar da conclusão de que houve espionagem, o pai de Gabriela Hardt, a juíza substituta de Moro em diversas ocasiões durante a operação, passou incólume pelas investigações da Lava Jato. A Engevix, para a qual Jorge Hardt trabalhou, teve seus negócios revirados pelos investigadores da operação da Justiça Federal paranaense. 

Foi Gabriela Hardt, por exemplo, que determinou a prisão de José Dirceu por acusação de ter recebido propinas da própria Engevix que empregou o pai. O caso da Petrosix, no entanto, passou em branco pelos olhos sempre atentos de Curitiba.

Ainda há tempo de evitar o pior

O relatório da Petrobras sobre o caso da Petrosix fez duas recomendações importantes. Notificar extrajudicialmente as empresas por uso de propriedade intelectual para impedir que continuem usando os materiais; e desaconselhar “futuros contratos com a empresa FORBES & MANHATTAN e qualquer empresa a ela vinculada direta ou indiretamente”.

Mas, dois meses antes de deixar a Presidência da República, Jair Bolsonaro ignorou a recomendação da estatal e vendeu a Petrobras Six justamente para a Forbes & Manhattan que tentou passar a perna na petroleira durante anos. 

“A Forbes pagou cerca de R$ 200 milhões pela fábrica, o equivalente a apenas um ano de lucro da SIX – e levou junto a tão cobiçada tecnologia Petrosix. De um jeito ou de outro, venceu”, concluiu Demori

O governo Lula tem agora 15 meses para passar o controle total aos canadenses da recém privatizada Petrosix. Uma investigação no Tribunal de Contas de União, que corre sob sigilo, pode esclarecer ainda mais os pontos obscuros desse negócio. Ainda dá tempo de evitar o pior.

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