Lava Jato afrontou STF adiantando inquérito contra Lula

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Por Patrícia Faermann, Jornal GGN – 

Quando um jornal é porta-voz de erro dos investigadores e comete ainda outros erros que podem gerar desinformação

A força-tarefa da Operação Lava Jato descumpriu a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Teori Zavascki, confirmando que deu sequência às investigações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e vazando informações ao jornal O Estado de S. Paulo de um inquérito com o resultado de uma possível denúncia ao ex-presidente. A conclusão foi adiantada em reportagem desta segunda-feira (25) do jornalista Marcelo Auler, reproduzida aqui. O GGN confirmou os desvios dos investigadores.
A matéria do Estadão foi divulgada no último sábado (23). Intitulada “Denúncia do sítio em Atibaia (SP) será primeira acusação contra Lula na Lava Jato“, integrantes da Polícia Federal vazaram um inquérito aparentemente concluído contra Lula sobre a compra e a reforma do sítio Santa Bárbara. Os jornalistas receberam, inclusive, cópias dos autos que foram anexados à publicação. Entre os documentos, laudos periciais, notas fiscais e um suposto contrato de compra do sítio por Lula e dona Marisa, indicado como “contrato de gaveta”.
A reportagem é toda construída em tempos verbais futuros, adiantando os próximos passos da equipe de Moro: o inquérito “será a primeira acusação formal entregue à Justiça”, “a peça apontará a família do ex-prefeito de Campinas (SP) e amigo de Lula Jacó Bittar (PT) como ‘laranjas’ na ocultação da propriedade”, “o compadre e defensor jurídico do ex-presidente Roberto Teixeira também será citado como parte da operação de formalização do negócio”, “a Lava Jato também vinculará os desvios de recursos na Petrobras à reforma executada no sítio e a manutenção de bens referentes a Lula”, “OAS, Odebrecht e o pecuarista José Carlos Bumlai serão vinculados aos serviços executados, como compensação por obras loteadas pelo cartel” – são os principais pontos do suposto inquérito adiantado pelo jornal.
Em artigo reproduzido pelo GGN, Marcelo Auler alertou para o fato de que a força-tarefa concentrada no Paraná, sob o comando do juiz Sergio Moro, voltou a vazar informações da investigação, “mostrando que ainda detém documentos, ou cópias deles, que deveriam estar no e sob o controle do STF”. Auler publicou, ainda, que o vazamento dos documentos por parte do jornal paulista “pode ser encarado como uma afronta ao Supremo Tribunal Federa”. “Afinal, o ministro Zavascki, relator da Operação Lava Jato naquela corte, avocou o caso para sua apreciação e posterior deliberação do plenário. Teoricamente, nada poderia ser feito sem sua autorização”, completou.
O GGN buscou, junto ao STF, o posicionamento da Corte e do ministro Teori Zavascki sobre a atuação de investigadores da equipe de Curitiba. A constatação foi que, tanto a reportagem do Estadão, como partes da análise de Marcelo Auler, cometeram erros de informações sobre os autos que envolvem as investigações contra o ex-presidente Lula. Mas, o erro maior – que neste caso não se trata de mera análise ou publicação de imprensa, mas de ferir atos processuais – partiu da equipe da Lava Jato.
Auler errou em um pequeno detalhe. O sigilo das informações decretado por Teori Zavascki, relator do processo da Lava Jato no Supremo, foi restritamente às interceptações telefônicas e não todos os autos da investigação. Assim, o possível inquérito não está incluído em sigilo. Por outro lado se trata de vazamento na medida em que os autos sequer foram enviados à Justiça – seja a Vara Federal de Curitiba, seja o Supremo.
Isso porque a primeira decisão do Supremo Tribunal Federal neste caso veio com um despacho do ministro Teori Zavascki, na noite do dia 22 de março deste ano. Foi uma medida cautelar solicitada pelo Advogado-Geral da União, José Eduardo Cardozo, contra a quebra de sigilo das interceptações telefônicas envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros políticos, com foro privilegiado, como a própria presidente Dilma Rousseff.
No pedido dirigido a Zavascki, que é relator dos processos da Lava Jato no Supremo, o ministro tomou duas decisões: primeiro, voltou a impor o sigilo aos grampos envolvendo o ex-presidente Lula e políticos detentores de foro e, segundo, decidiu que todos os autos de investigação a Lula fossem remetidos ao STF, para que a última instância decida a quem cabe julgar o ex-presidente e, possivelmente, qual instância também julgaria outros nomes e políticos envolvidos na investigação.
Posteriormente, no dia 31 de março, o caso foi debatido pelo Plenário do Supremo, com a presença de todos os ministros. De forma unânime, os membros do STF concordaram com Teori Zavascki pelo sigilo dos áudios e a grande maioria da Turma reafirmou a segunda decisão, também, de que todas as investigações em curso na Justiça Federal do Paraná envolvendo o ex-presidente Lula fossem enviadas ao Supremo, para que a instância decida a quem compete julgar.
Dessa forma, o jornal que foi o porta-voz da equipe da Lava Jato de Curitiba, também mostrou desconhecimento de processos legais ao deduzir que “os inquéritos estão suspensos depois que ele [Lula] foi nomeado ministro da Casa Civil pela presidente Dilma Rousseff, no dia 17, e o tema foi levado ao Supremo”. Como bem explicou Marcelo Auler, a suspensão das investigações contra Lula ocorreram quando o juiz Sérgio Moro liberou o áudio das interceptações telefônicas, e não quando o ex-presidente foi nomeado ministro.
O jornal também faz confusão de termos processuais: inquérito e denúncia.
Os documentos disponibilizados ao Estado de S. Paulo fazem parte dos mecanismos de investigação da Polícia Federal. Trata-se de um laudo pericial, além de outros documentos anexos a um inquérito. Essa é a primeira fase de uma investigação. Pelo caminho natural de um processo, esses documentos são remetidos ao Ministério Público Federal – seja aqui os procuradores da força-tarefa de Moro, para os casos de primeira instância, ou a Procuradoria-Geral da República, para os políticos com foro privilegiado. De porte desses autos, os procuradores decidem se enviam ou não uma denúncia à Justiça responsável – que neste caso, também não está definida.
Mas, em diversos momentos a reportagem adianta-se que a força-tarefa já teria “provas para levar o petista a banco dos réus por envolvimento no esquema de corrupção e lavagem de dinheiro na Petrobras”. Nesse sentido, o jornal pulou três outras etapas do processo: inquérito, denúncia e, somente se aceita pela Justiça, a ação com réu.
Por último, o erro da equipe da Lava Jato – mais especificamente, ao que tudo indica pelo teor dos documentos, o vazamento partiu de integrantes da Polícia Federal – foi de, realmente, afrontar decisão do STF. O vazamento, em si, não pode ser considerado, uma vez que os autores do vazamento estão protegidos pelo anonimato garantido pelo jornal.
Entretanto, o erro foi de, com o vazamento, comprovar que a força-tarefa da Lava Jato de Curitiba deu sequência às investigações, tendo possivelmente finalizado um inquérito a ser apresentado ao MPF. Erraram, ainda, ao anteciparem que “já teriam provas suficientes”, sem respeitar o devido processo legal na decisão que compete ao Supremo de averiguar quem julgará o caso e, consecutivamente, quais procuradores (MPF ou PGR) ficariam responsáveis pelo prosseguimento, ou não, do inquérito, transformando-a, ou não, em uma denúncia.
Em resposta ao GGN, a equipe do ministro Teori Zavascki encaminhou a decisão sobre a liminar, despachada em 22 de março, que foi utilizada acima para narrar o histórico dos despachos do STF. Sobre a solicitação de um posicionamento do ministro diante das ações da equipe da força-tarefa, o coordenador de imprensa do gabinete, Luiz Felipe Neves, respondeu:
“Em observância ao inciso III do artigo 36 da Lei Orgânica da Magistratura, o Ministro Teori Zavascki fica impossibilitado de responder a sua pergunta.
Lei Complementar 35/1979 (Loman)
Art. 36 – É vedado ao magistrado:
      (…)
        III – manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério“.
Apesar da justificativa para o não fornecimento de um posicionamento, a publicação do gabinete do ministro traz respostas para o que a Legislação decreta como modo de conduta por todos os juízes no Brasil. Reiterando, “é vedado ao magistrado” manifestar, por qualquer meio de comunicação, “opinião” ou “juízo” sobre processos e despachos em andamento.

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